O ex-jogador Richarlyson falou abertamente sobre sua sexualidade pela primeira vez. Afirmou que é bissexual, tendo relacionamentos com homens e mulheres. Para ele, esse é o fato menos importante. O problema, segundo o ex-jogador de futebol e atual comentarista da TV Globo, é que a homofobia vai continuar.
A declaração foi dada no episódio de estreia do podcast “Nos Armários dos Vestiários”, série jornalística que narra a homofobia e o machismo no futebol brasileiro. Richarlyson provavelmente é o primeiro ex-jogador de futebol a revelar publicamente que não é heterossexual.
Richarlyson foi alvo de episódio emblemático em Campinas. Desde que se aventou a possibilidade de sua contratação pelo Guarani, passou a ser vítima de comentários homofóbicos e de ameaças na internet. Momentos antes de sua apresentação, em 8 de maio de 2017, homens em uma motocicleta jogaram bombas no clube, em protesto à contratação. Ninguém se machucou. A diretoria do clube à época deu suporte a Richarlyson, que fez 22 jogos pelo Guarani antes de partir para o Cianorte.
“A vida inteira me perguntaram se sou gay. Eu já me relacionei com homem e já me relacionei com mulher também. Só que aí eu falo hoje aqui e daqui a pouco estará estampada a notícia: ‘Richarlyson é bissexual’. E o meme já vem pronto. Dirão: ‘Nossa, mas jura? Eu nem imaginava’. Cara, eu sou normal, eu tenho vontades e desejos. Já namorei homem, já namorei mulher, mas e aí? Vai fazer o quê? Nada. E aí vai chover reportagem, e o mais importante, que é pauta, não vai mudar, que é a questão da homofobia. Infelizmente, o mundo não está preparado para ter essa discussão e lidar com naturalidade com isso”, declarou Richarlyson no episódio de estreia do podcast comandado por William de Lucca e Joanna de Assis.
“Pelo tanto de pessoas que falam que é importante meu posicionamento, hoje eu resolvi falar: sou bissexual. Se era isso que faltava, ok. Pronto. Agora eu quero ver se realmente vai melhorar, porque é esse o meu questionamento”, apontou.
Ele ainda reclamou das cobranças e dos rótulos.
“Você me entende porque eu acho que é desnecessário às vezes você se rotular? Tem uma questão mais importante, tem gente morrendo, o Brasil é o país que mais mata homossexuais. E a gente está aqui falando de futebol, ok, mas o futebol é um negocinho pequeno. Ah, mas sua fala pode ajudar. Não, não vai ajudar. Quem é Richarlyson, pelo amor de Deus?! Sou um mero cidadão comum, que teve uma história bacana no futebol, mas eu não vou poder mover montanhas para que acabem esses crimes, para que acabe a homofobia no futebol”, disse.
Natural de Natal, no Rio Grande do Norte, Richarlyson é filho do ex-atacante Lela, que foi campeão brasileiro pelo Coritiba em 1985 e marcou época no futebol paranaense.
Richarlyson iniciou a carreira no São Luiz, do Maranhão, e também passou pelo Ituano ainda nas categorias de base. Depois, vestiu a camisa de vários clubes do futebol brasileiro, como Santo André, Fortaleza, São Paulo, Atlético Mineiro, Vitória, Chapecoense, Novorizontino, Cianorte, Noroeste, Campinense e América do Rio de Janeiro, além do Guarani. Fora do Brasil, acumulou passagem pelo Red Bull Salzburg, da Áustria, e o FC Goa, da Índia.
Richarlyson foi um jogador multicampeão. No São Paulo conquistou o Mundial de Clubes de 2005, além do Campeonato Brasileiro de 2006, 2007 e 2008. No Atlético Mineiro, faturou o Campeonato Mineiro em 2012 e 2013, além da Libertadores da América de 2013. Pelo clube de Minas Gerais, exatamente em 2013, jogou toda a temporada ao lado do atacante Alecsandro, seu irmão.
Richarlyson também vestiu a camisa da Seleção Brasileira sob comando do técnico Dunga, mas não chegou a disputar a Copa do Mundo.
Volante de origem, se destacou por ser um jogador que atuava com destaque em várias posições. Quando jogava no São Paulo, foi semifinalista da Libertadores atuando como zagueiro, além de ter jogado como lateral-esquerdo e volante em diversos momentos. No Atlético Mineiro, conquistou a competição continental como lateral-esquerdo.
No São Paulo, Richarlyson foi um dos nove jogadores que estiveram na conquista do tricampeonato brasileiro consecutivo – feito inédito na história do futebol nacional. Estiveram ao lado dele, nas três conquistas, Rogério Ceni, André Dias, Alex Silva, Miranda, Júnior, Aloísio Chulapa, Bosco e Reasco. O técnico no tricampeonato foi Muricy Ramalho.
Em 2018, o São Paulo inaugurou uma calçada da fama no estádio do Morumbi para homenagear os 99 jogadores mais importantes da história do clube. Mesmo tricampeão brasileiro, Richarlyson sequer foi convidado para a homenagem, na época organizada pelo ex-presidente Leco.
Três anos depois, em 2021, o atleta finalmente foi homenageado na calçada da fama de atletas históricos do clube. A homenagem foi organizada por Júlio Casares, atual presidente do São Paulo, ao lado do ex-atacante Müller, um dos maiores jogadores da história do Tricolor. (Colaborou Eduardo Martins)