Exatamente um ano após a data em que estava originalmente prevista para acontecer, a cerimônia de abertura das Olimpíadas de Tóquio foi realizada nesta sexta-feira (23), com o tradicional desfile dos países participantes, 203 ao todo, no Estádio Nacional do Japão. O intervalo de quase cinco anos ou cerca de dois mil dias em relação ao encerramento dos Jogos Rio-2016 representa a maior distância de tempo entre duas edições olímpicas desde a Segunda Guerra Mundial (1939-45), que impediu a realização das Olimpíadas de 1940 e 1944. Desta vez, no entanto, o inimigo foi a pandemia de Covid-19, que vem assolando o mundo desde o ano passado.
Dos 302 atletas brasileiros que participam da 32ª edição do maior evento esportivo do planeta, dois deles nasceram em Campinas e outros cinco atuam na cidade.
A dupla de campineiros nos Jogos de Tóquio é formada pelo ginasta Arthur Nory, medalhista de bronze nos Jogos Rio-2016, e pelo velocista Eduardo de Deus, que disputará a prova dos 110 metros com barreira. Já a lista de atuantes na cidade conta com o central Lucão, do Vôlei Renata, a atleta de badminton Fabiana da Silva, do Clube Fonte São Paulo, além de Marcio Teles, Fernando Ferreira e Tiffani Marinho, da equipe de atletismo da Orcampi. Além disso, a goleira de futebol Aline Reis, o lateral-direito Gabriel Menino e o levantador de vôlei Bruninho, filho dos ex-atletas Bernardinho e Vera Mossa, deram seus primeiros passos no esporte em Campinas.
Os pioneiros
O início da relação da cidade de Campinas com os Jogos Olímpicos remete ao fim dos anos 40, quando o então técnico da equipe de atletismo do Brasil, Aluízio de Queiroz Teles (1913-2009), embarcou rumo a Londres para a disputa dos Jogos Olímpicos de 1948, aos 35 anos. Embora tenha nascido em Jundiaí, Aluízio veio com poucos dias de vida para Campinas, onde cresceu e começou a carreira esportiva.
O atletismo também é a modalidade que praticavam os dois primeiros atletas de Campinas da história dos Jogos Olímpicos, Argemiro Roque e João Pires Sobrinho, ambos do Clube Regatas.
Mesmo natural de Itatiba, Argemiro Roque (1923-1998) é considerado o primeiro esportista de Campinas a competir em uma Olimpíada, pois sempre viveu na cidade. Com 29 anos, Argemiro participou das provas individuais de 400 e 800 metros nos Jogos Olímpicos de Helsinki, na Finlândia, em 1952. Quatro anos depois, chegaria a vez de João Pires Sobrinho, este, sim, campineiro nato, nascido em 1934. Ele tinha apenas 21 anos quando representou a cidade nas Olimpíadas de Melbourne, na Austrália, em 1956, nas provas de 100m, 200m e 4 x 100m.
Argemiro Roque e João Pires Sobrinho são contemporâneos de um dos maiores nomes da história do esporte brasileiro, Adhemar Ferreira da Silva (1927-2001), primeiro bicampeão olímpico do país, que conquistou as medalhas de ouro no salto triplo em 1952, quebrando o recorde mundial, e 1956. Ele também foi tricampeão pan-americano (1951, 1955 e 1959), estabelecendo novas marcas históricas.
No início dos anos 60, Argemiro Roque aposentou-se das pistas de atletismo e passou a se dedicar à função de treinador, descobrindo jovens talentos como a de sua futura esposa, Odette Valentino. Hoje com 86 anos, ela guarda uma trajetória vitoriosa nas modalidades de arremesso de peso e lançamento de disco e dardo, chegando perto de participar das Olimpíadas de 1964, em Tóquio. A pentatleta Elizabeth Cândido Nunes, que quase disputou os Jogos Olímpicos de 1972, em Munique, também foi uma das das principais discípulas do primeiro competidor olímpico de Campinas.
No entanto, a maior pupila de Argemiro Roque atende ao nome de Conceição Geremias, uma das maiores atletas brasileiras especialistas em heptatlo, competição de atletismo que reúne as provas de 100 metros com barreiras, salto em altura, arremesso de peso, 200 metros rasos, salto em distância, lançamento de dardo e 800 metros rasos.
Nascida na Fazenda Santa Elisa, Conceição Geremias tornou-se a primeira mulher campineira a disputar uma edição de Jogos Olímpicos, em 1980, em Moscou, aos 24 anos. Ao todo, foram três participações ao longo daquela década. Em 1983, Conceição conquistou medalha de ouro nos Jogos Pan-Americanos de Caracas, na Venezuela, feito até então inédito para o heptatlo feminino brasileiro. De quebra, estabeleceu o recorde sul-americano de 6.017 pontos, que perdurou durante 25 anos. “Essa medalha é a maior conquista da minha carreira. No Pan, consegui o índice que propiciou a minha ida para as Olimpíadas de Los Angeles”, conta Conceição, que também representou Campinas nos Jogos Olímpicos de Seul, em 1988.
“Falar de Olimpíada é uma emoção que a gente quase não consegue encontrar palavras e uma grandeza que não dá para explicar direito. Nós, atletas, sempre colocamos metas para atingir e, no meu caso, queria participar de uma Olimpíada, mesmo que fosse como reserva. Desse objetivo que tracei, recebi em triplo”, ressalta Conceição Geremias, que completa 65 anos de vida nesta sexta-feira (23), data da abertura dos Jogos Olímpicos de Tóquio.
Refletindo sobre a carreira, Conceição Geremias comenta sobre a importância de Argemiro Roque como mentor de sua trajetória vitoriosa como atleta. “Quando era o técnico da seleção de Campinas, Argemiro foi o meu primeiro treinador e quem me mostrou o rumo. Sempre digo que ele me ensinou os passos do atletismo, pois eu era como uma criança que não sabia andar. Cheguei para treinar somente com o meu talento e foi ele quem lapidou. Como nasci na roça, não tinha nenhuma informação, então ele contava histórias e me explicava como funcionavam as Olimpíadas”, conta Conceição, que recebeu os ensinamentos de Argemiro Roque durante seis anos, no início da década de 70. As atividades aconteciam na Praça de Esportes do bairro São Bernardo, local que viria a receber o nome de Argemiro, em 2003.
Com três Olimpíadas no currículo, Conceição Geremias deixa uma mensagem de incentivo para os atletas brasileiros que estão na disputa dos Jogos de Tóquio. “Em primeiro lugar, desejo toda a sorte do mundo para os brasileiros que estão lá no Japão para competir, em especial para os atletas de Campinas. Para quem está iniciando agora, não desista nunca dos seus sonhos porque quando eu comecei competindo em Jogos Escolares, nunca imaginei que participaria de três Olimpíadas como consegui. É não desistir nunca porque a gente sempre vai encontrar barreiras pelo caminho”, motiva.
ACECAMP
Atualmente, Conceição Geremias é presidente da ACECAMP (Associação Cultural Esportiva Campeã), em Campinas. Fundada em 2010, sem fins lucrativos, a organização trabalha com projetos de Lei de Incentivo ao Esporte.
“O objetivo principal é buscar recursos e viabilizar projetos para crianças que não tem condição financeira de pagar clube ou escolinha. Propiciamos a prática esportiva, independentemente da modalidade. Não trabalhamos com alto rendimento, somente com iniciação, ou seja, detecção de talentos, assim como fazia Argemiro Roque”, compara Conceição.
Em 2016, Conceição Geremias comandou um projeto de atletismo e futebol no estádio Cerecamp, no bairro Botafogo, mas a interdição do local transferiu as atividades para a Vila Brandina.
“Estava indo bem, mas tivemos que parar por conta da pandemia”, conta Conceição. No próximo dia 2, a ACECAMP começará a desenvolver atividades esportivas em parceria com a Prefeitura de Jaborandi (SP).