No Brasil, no Dia dos Professores, celebrado nesta sexta-feira (15), geralmente há mais a ser reivindicado do que comemorado. Mas, neste segundo ano de pandemia, a sociedade parece ter se lembrado da importância que os educadores têm para a formação de todos nós. Pesquisa do Datafolha encomendada pela Fundação Lemann mostra que a maior participação das famílias no universo escolar fez aumentar a valorização dos professores (veja abaixo).
Em plena pandemia, os profissionais da Educação tiveram de se reinventar rapidamente para não deixarem seus alunos desassistidos. O Hora conversou com dois deles, que são apaixonados pela missão de educar.
Cláudia Dorta, de 52 anos, é professora da Educação Infantil da rede municipal de Campinas há 29 anos. Ela conta que foi escolhida pela profissão. “Nunca sonhei em ser professora, embora eu sempre estivesse com crianças a minha vida toda. Onde eu estava as crianças estavam junto. Eu fiz nove anos de balé e virei professora de balé clássico, mas ainda assim eu não prestei atenção nesse sinal da vida lá atrás”, conta.
Depois, Cláudia se casou, se tornou mãe e entrou no Magistério. Até que recebeu um convite para dar aula em uma escolinha. “Desde então, nunca mais parei. Me apaixonei pelas crianças, me apaixonei pelo que eu faço”, conta, dizendo que depois se formou em Pedagogia.
“Eu falo que eu não trabalho. Eu saio todo dia de casa para me divertir, para brincar na areia, para brincar de tinta, para brincar de massinha. Para ensinar as crianças a escrever o nome sem eles perceberem que eles estão aprendendo. Para ensinar as crianças a conhecerem as letras, tudo brincando. Eu não uso régua, eu não uso lousa, eu não uso giz. Eu brinco com eles e isso é muito bom”, diz.
A professora afirma que é uma troca com as crianças e que aprende muito com elas. “É uma troca muito grande entre a gente porque eles são muito sinceros. Por exemplo, uma vez eu estava numa escola lá no Jardim Florence e pintei o cabelo. Gastei uma grana para fazer luzes. Cheguei no outro dia a menina olhou para mim e disse que tinha ficado engraçado, colorido. Eles falam o que pensam”, se diverte. “Eu aprendo com isso e tento levar para minha vida, de maneira mais sutil. Eu aprendo muito com eles, que o simples é legal, que é legal dividir”, afirma.
Nem tudo são flores, e os professores têm um papel social. No meio das brincadeiras, em assuntos triviais, mesmo sem entender os alunos acabam fazendo revelações. “Um dia numa roda conversando um assunto que não tinha nada a ver, vira uma criança e fala ‘tia Cláudia hoje meu pai bateu na minha mãe’. E agora, o que que eu faço com essa informação? Tem que ter um jogo de cintura com eles, com a família”, revela.
Mesmo com episódios como esses e outras dificuldades inerentes à profissão, Cláudia nem pensa em parar. “Eu falo que ensinar, que trabalhar com criança não é trabalho. É realmente uma diversão para mim. Eu não quero aposentar agora, não quero parar, não vou parar porque eu gosto de todo dia estar lá brincando com eles”, diz.
“Eu sinto muito porque a Educação está largada. Os governantes não estão preocupados. Eles não querem que a que a gente forme cidadãos críticos, mas a gente vai continuar fazendo nosso trabalho. A gente não vai desistir disso nunca. Eu não desisto, não desisto nunca daquilo que eu acho que é certo. Eu tenho certeza de que vale a pena cada segundo, que ser professora é uma missão”, finaliza.
Escolha na adolescência
Ao contrário de Cláudia, Marcos Gonçalves Franco, de 53 anos, sempre quis ser professor. Ele, que mora em Campinas, mas dá aulas de Geografia nas redes estadual e municipal de Sumaré, escolheu a profissão na adolescência.
“Decidi ser professor por me identificar com a profissão desde a adolescência e após ler vários livros de Filosofia. Gosto muito de ser professor porque tenho a possibilidade de contribuir para fazer uma sociedade diferente, compartilhar conhecimento e por causa da rotina diferenciada com a convivência com muitas pessoas”, diz.
Entre as maiores dificuldades da profissão ele diz que estão os alunos com pouca alfabetização e a falta de um plano de carreira adequado.
A pandemia impôs novos desafios a uma situação que já não era fácil.
“Foi um desafio aprender de maneira rápida a trabalhar com a tecnologia, fazer a busca ativa dos alunos e adaptar o trabalho da escola para ser feito em casa. Fiquei feliz com o retorno das aulas presenciais e verificamos que o aprendizado dos alunos ficou defasado por causa do ensino remoto”, revela.
Ele conta que a profissão ainda divide opiniões. “Tem uma parcela da sociedade brasileira que respeita o trabalho dos professores e contribui para que a Educação Pública avance e melhore em todo o território brasileiro, mas tem outra parcela da sociedade brasileira que não contribui para a melhora da Educação Pública e vive criticando o trabalho dos professores”, desabafa.
Contudo, ele tem esperança de avanços. “Para o futuro a gente defende a Educação Pública de qualidade para todos, projetos de alfabetização adequados para as crianças e projeto de reforço escolar para os adolescentes com dificuldade de leitura e escrita, com a contratação de professores especializados em alfabetização. Que a sociedade brasileira trabalhe para tornar a Educação uma prioridade nacional”, revela.
Educação, estudantes e famílias
Não é segredo que a educação não presencial trouxe desafios para os alunos e para as famílias brasileiras. Os pais e responsáveis tiveram de cuidar da educação dos filhos ao mesmo tempo em que trabalhavam, e perceberam que o papel do professor é fundamental.
Pesquisa do Datafolha encomendada pela Fundação Lemann mostra que a maior participação das famílias no universo escolar fez aumentar a valorização dos professores.
Segundo a Fundação, o estudo ‘Educação não presencial na perspectiva dos estudantes e suas famílias’ apontou que 51% dos responsáveis consideram que estão participando mais da educação dos estudantes, no período da pandemia. Este índice sobe para 58% na região Sul e 57% no Centro-Oeste.
Também aumenta para 58% entre os responsáveis com maior escolaridade, contra 47% entre os que têm nível fundamental. E 72% concordam com a afirmação de que estão com mais responsabilidade pela educação dos estudantes durante a pandemia, do que antes dela.
O levantamento aponta que 71% dos responsáveis pelos estudantes estão valorizando mais o trabalho desenvolvido pelos professores e 94% consideram muito importante que os docentes estejam disponíveis para correção de atividades e esclarecimento de dúvidas durante as aulas não presenciais.
Outro efeito importante da pandemia para a educação é que a maioria (64%) também considera que as aulas não presenciais foram eficientes no aprendizado aos estudantes, enquanto 36% afirmam que não foram eficientes.