A morte aos cerca de 100 anos de “Maringá Famoso”, como era popularmente conhecido Onofre da Silva Marques, ilustre consertador de portas de aço de Campinas, deixou uma lacuna no cotidiano e no coração de moradores, comerciantes e transeuntes do centro da cidade. Ele estava hospitalizado e faleceu na última terça-feira (20), vítima de problemas cardíacos.
O apelido “Maringá Famoso” aparecia no cartão que Onofre distribuía para os clientes e também na placa acoplada ao esquadro de sua antiga bicicleta Philips, com a qual trafegava pelas ruas. Mas engana-se quem pensa que ele nasceu em Maringá. A alcunha remetia ao período em que viajara para o Sul e tivera uma breve passagem por essa cidade do interior paranaense. Quando voltou, o apelido pegou entre os colegas.
“Maringá Famoso” era natural de Jacutinga, interior de Minas Gerais, mas morou quase toda a infância em Espírito Santo do Pinhal, no estado de São Paulo. Aos 14 anos, ele veio para Campinas e se estabeleceu na cidade. “Naquela época, havia duas serralherias que consertavam as portas aqui em Campinas: La Selva e Stancato. Eu ficava sentado na porta só observando”, contava Maringá.
“Quando vim para Campinas, havia bonde para todos os lados e só duas empresas de ônibus, Caprioli e Bonavita. Conheci muitas famílias importantes, conheci Moisés Lucarelli e trabalhei no antigo Teatro Municipal, onde tinha uma porta de aço que eu engraxava e consertava. Muita gente boa já deu serviço pra mim, como a Mica e o Paulinho, da Casa do Gelo, na Ponte Preta, além do Antônio Duarte Júnior, da Rua Bernardino de Campos, cliente antigo que já me ajudou muito”, listava Maringá.
Em Campinas, Onofre conheceu a esposa Olívia de Freitas, com quem teve três filhos. “Quando encontrei minha esposa aqui, eu tinha 16 anos. Ela vivia com a mãe, a Dona Maria de Freitas, mas arrumei um quartinho na Vila Industrial e moramos lá até ela falecer, aos 64 anos”, revela Maringá, que residia no bairro Jardim São Fernando, em Campinas.
“Minha mãe morreu quando eu tinha uns 12 ou 13 anos e então meu pai arrumou outra mulher, mas ela era muito violenta comigo. Abandonei a escola, larguei minha família e vim pra Campinas”, lembra Onofre, que foi servente de pedreiro, engraxate e vendedor de banana e amendoim até passar a trabalhar com conserto de portas de aço.
De acordo com o jornalista Zeza Amaral, colunista do Hora Campinas, Maringá era o dono absoluto de todas as portas de aço do centro da cidade. “Todos os meses ele aparecia na Relojoaria Palácio, onde eu era aprendiz de relojoeiro, para engraxar as canaletas. A pesada porta deslizava nem tanto pela graxa, mas pela sensibilidade do Maringá em equilibrar a tensão das molas de aço, daí o nome portas de aço. Usava sempre chapéu de couro, preto de graxa, e braçadeira de couro para proteger o punho”, descreve.
Em seus últimos tempos de vida, os braços já não eram os mesmos e as pernas pesavam para pedalar, além do risco iminente de sofrer acidentes, mas Maringá ainda resistia na profissão. A oficina dele ficava na Rua Uruguaiana, número 110, ao lado da Borracharia Interlagos.
“Com a pandemia, ele tinha dado uma parada no trabalho e estava ficando mais dentro de casa, sem poder sair e fazer as coisas do dia a dia, mas continuava com as ferramentas guardadas ao lado da borracharia. De vez em quando, ele ainda aparecia, mas estava meio esquecido”, relatou Gabriel Assumpção, que trabalha na borracharia.