Houve um dia
Que eu até sentia medo
Que você chegasse cedo
Pro meu corpo machucar.
Mas eu virei o tabuleiro
Este jogo, companheiro,
Eu não vou mais aceitar.
Nem pense em me matar
(Letra do samba Corpo Meu)
Mulheres de todo Brasil se uniram no Levante Feminista Contra o Feminicídio e lançaram, em março, a campanha nacional Nem Pense em Me Matar – Quem Mata uma Mulher Mata a Humanidade!. O samba Corpo Meu, composto por Cris Pereira e interpretado pela sambista Fabiana Cozza, dá voz ao movimento.
O número de feminicídios cresceu no Brasil durante a pandemia. No primeiro semestre do ano passado foi registrado aumento de 1,9% de casos. Foram mortas 648 brasileiras em seis meses, a maioria negras e vivendo em desigualdade social.
Nessa fase da campanha, as participantes farão ações pontuais, organizadas pelas mulheres que vivem e conhecem a realidade específica do feminicídio em cada região do País. Para isso, foram criados materiais de comunicação com a imagem de girassóis amarelos, símbolo do Levante, que figura como sinal de esperança e celebração da vida.
A articulação para criar o Levante Feminista Contra o Feminicídio foi iniciada por Vilma Reis, socióloga, referência dos movimentos negros no país, integrante da Coalizão Negra Por Direitos. Com ela, também participam Marcia Tiburi, filósofa, escritora e artista, e Tania Palma, pesquisadora e assistente social.
Marcia Tiburi conta que a ideia de se juntar a outras mulheres contra este crime de ódio surgiu exatamente pela urgência em combater o desamparo e a negligência. “O patriarcado é um juramento de morte contra as mulheres pelos mais diversos motivos, sempre torpes”, afirma.
A filósofa espera criar, com suas companheiras, condições para superar a velha cultura feminicida. “Trata-se de uma guerra sangrenta que precisa parar. O que desejamos com a nossa campanha é estancar esse banho de sangue que vem sendo promovido pelo machismo e pela espetacularização da violência que dele faz parte”, completa.
Mais de 200 feministas apoiam o Levante: mulheres negras, indígenas, quilombolas, ribeirinhas, das águas, das florestas e de outros segmentos das organizações populares e da sociedade civil.
A campanha vai se estender por dois anos, com monitoramento de casos, pressão e sensibilização da sociedade para, dessa forma, brecar a violência contra as mulheres.
No dia do lançamento da campanha foi realizada a leitura do manifesto que norteia o movimento. Intitulado Chega de Feminicídio, um vídeo foi gravado por militantes das cinco regiões do País. O documento destaca que a prática do feminicídio nunca esteve tão ostensiva e extremista como agora.
Luta antiga
A campanha Nem pense em me matar traça o perfil dos matadores de hoje: “São homens que não admitem a autonomia, a igualdade e a liberdade das mulheres. São machistas, violentos. Usam a violência física, psicológica, moral, sexual e patrimonial contra mulheres e seus filhos até o extremo, que é o ato do feminicídio”.
Isso me lembra que a luta é antiga. Em 1982, a Globo exibiu uma série que se apropriava de um slogan de feministas do início daquela década: Quem ama não mata. Com a frase, elas protestavam contra crimes em que mulheres eram vítimas de seus próprios companheiros.
A minissérie foi inspirada em crimes que deram o que falar, entre eles o assassinato da socialite Ângela Diniz, morta a tiros por seu companheiro Doca Street.
Hoje, as mulheres estão ainda mais unidas. Preste atenção na letra da canção que abre meu texto: “Este jogo, companheiro, eu não vou mais aceitar”. Com a hashtag #NemPenseEmMeMatar, a frente busca atingir um público amplo e disseminar a ideia de que a violência contra a mulher é um problema que afeta não só as famílias, mas a sociedade como um todo.
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Janete Trevisani é jornalista – [email protected]