A política fiscal expansionista e preocupada com as mudanças climáticas tornou-se uma tendência na gestão pública, conforme indicam novos relatórios de indicadores econômicos globais do Fundo Monetário Internacional (FMI).
Publicados em abril deste ano, com títulos de “Perspectivas Econômicas Mundiais – Constantes, mas Lentas: Resiliência em meio à Divergência” e “Medidor Fiscal: Política Fiscal no Grande Ano Eleitoral”, em tradução livre, os relatórios fazem uma previsão das prioridades dos gastos públicos até 2030, considerando, como variáveis, a renda interna e o nível de desenvolvimento dos países.
De acordo com os documentos, os investimentos públicos para os próximos anos vão abarcar, em grande medida, a agenda dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável – conjunto de metas globais propostas pela Organização das Nações Unidas (ONU) em cúpula realizada em 2015.
Na ocasião, a organização propôs um plano de ação global para eliminar a pobreza extrema e promover sociedades pacíficas e inclusivas até 2030. Composta por 17 Objetivos, a Agenda é discutida nos principais encontros mundiais de lideranças do setor público e privado, e faz parte da pauta imediata das políticas públicas e modelos de governança globais.

ODS em destaque
A tendência orçamentária captada pelo FMI vem no momento em que países têm se desdobrado para remediar os danos de catástrofes ambientais e sociais em seus territórios, na maioria das vezes com um planejamento orçamentário defasado e sistemas de gestão pouco preparados.
Exemplo recente acontece no Brasil, em que a gestão pública brasileira enfrenta um desafio sem precedentes no contingenciamento da catástrofe do Rio Grande do Sul, com um futuro de programas sociais de assistência ao estado e reparos à vista – realidade que não estava prevista em qualquer projeção dos orçamentos federal, estadual ou municipal há menos de um ano.

Desigualdades
A prospecção do FMI também pode corroborar a tese de que grupo de nações que não possuem alto grau de desenvolvimento econômico e social sofram mais o impacto de eventos climáticos extremos que nações desenvolvidas, apesar da contribuição muito menor nas emissões de gases do efeito estufa. Isso porque, segundo os dados, os países que mais investirão em ODS são os emergentes ou em desenvolvimento.

Vulnerabilidade social da população, atuação instável dos governos e territórios de urbanização caótica e com maior presença da natureza contribuem para que esse grupo de nações enfrente desafios constantes na contenção de desastres climáticos, tendo que priorizar esforços orçamentários na redução de seus impactos.
Em contrapartida, nos países desenvolvidos, apesar da também inclinação ao investimento em ODS, os relatórios apontam uma alternância nos gastos, que se destinarão à previdência social e à saúde pública, além do pagamento de juros de dívidas públicas.
Com uma população em processo de envelhecimento, os países de Primeiro Mundo terão que sustentar os gastos de seu estado de bem-estar social, que, se deu certo no século passado e contribuiu para altos índices de qualidade de vida, hoje mantém as contas públicas “inchadas”.

A inevitabilidade dos gastos em políticas climáticas
Os relatórios confirmam que os investimentos públicos para adequação às alterações do clima cobrem os orçamentos de todas as nações, já que as mudanças se mostraram de alcance global e indiferentes à região. Porém, uma particularidade indica que, para economias desenvolvidas, os gastos em políticas climáticas serão na mitigação e na adaptação. Enquanto nas economias subdesenvolvidas, aquelas com os menores índices de renda e IDH no mundo, o gasto será direcionado unicamente à adaptação.
O significado exato de mitigação e adaptação em políticas públicas não está claro nos relatórios. Mas uma breve análise pode revelar que, tendo maior poder político e financeiro e sediando as altas cúpulas administrativas dos setores industriais que mais poluem no mundo, é natural que as principais ações para reduzir as emissões partam do grupo dos países desenvolvidos.
Além disso, a inovação das matrizes energéticas, essencial no processo de transição à sustentabilidade, já ganhou forma de uma nova corrida econômica, na medida em que lideranças perspicazes assertam a conservação do meio ambiente como único caminho para a manutenção do modo de produção industrial a longo prazo.

Novos ares
As políticas econômicas globais efetuadas nos últimos 50 anos agora entram em processo de despopularização. A produção econômica baseada na fonte energética dos combustíveis fósseis e a maximização da oferta em escala global, com alta divisão na cadeia produtiva – Sul Global exportador de commodities, Norte Global exportador de tecnologia – já não se provam um pilar de estabilidade social e nem uma filosofia de mercado promissora.
As crises chegaram com os pés na porta, e algumas potências emergentes, que estavam fadadas a serem relevantes apenas em sua parte do globo devido ao árduo passado colonial e tardia independência, souberam driblar os obstáculos ao desenvolvimento e hoje são atores indispensáveis na sustentação do comércio internacional, como Índia e Coreia do Sul – além de terem ganho voz no jogo geopolítico.
Essa alteração de rota só foi possível por meio do importante trabalho educacional, científico e tecnológico ali implementados.
Em cada uma dessas nações, mentes inovadoras foram responsáveis por difíceis decisões políticas – por vezes até impopulares ou contraintuitivas – mas que propulsionaram o nado contra a maré do subdesenvolvimento.
Para não perdermos o bonde, é necessário que a próxima geração de brasileiros enfrente os grandes desafios da contemporaneidade com consciência crítica, e que tome decisões visando garantir a autonomia do País e a soberania produtiva em nossas terras.

Desafios
A partir do novo cenário de crises globais, alguns desafios que se apresentam são:
♦ O futuro do papel do Estado e sua capacidade de conter crises sócio-econômicas em um mundo com instituições cada vez mais debilitadas, e em um contexto de intensa privatização do setor de serviços (que historicamente é responsável por garantir direitos em períodos de instabilidade);
♦ A crise climática iminente e a desigualdade no enfrentamento das suas consequências, desproporcionais entre os países;
♦ O desordenamento demográfico, causado pela alta no número de habitantes em partes vulneráveis do mundo e por questões geopolíticas que provocam migrações em massa, guerras civis e demandas maiores por recursos essenciais à vida.
Em ano eleitoral, é importante verificarmos pacientemente os valores e caráter de cada candidato, e se o que defendem condiz com o momento por qual o mundo passa. É pouco provável que discursos vazios voltados a alimentar bolhas e polarizar o debate político por engajamento contribuam para mudanças eficazes. Vamos nos atentar para votar em pessoas sérias, não em caçadores de holofotes sem preparo.











