O Censo de 2022 do IBGE registrou uma população de 203 milhões de pessoas no Brasil. Todos esses brasileiros e brasileiras podem contar gratuitamente com um calendário anual de vacinação contra dezenas de doenças, assim como diariamente se alimentam com produtos que apenas chegam ao mercado depois de um rigoroso processo de controle sanitário. Essas e outras conquistas foram possíveis graças à criação e estruturação do Sistema Único de Saúde (SUS), principal política pública na história do país.
O SUS foi instituído pela Constituição Federal de 5 de outubro de 1988 e regulamentado pela Lei 8080, de 19 de setembro de 1990, sendo regido por três princípios básicos: universalização, equidade e integralidade.
A universalização pressupõe que os serviços do SUS podem ser acessados por qualquer pessoa, de qualquer condição social, gênero ou etnia. A equidade indica que o propósito do SUS é a redução de desigualdades, pois todas as pessoas, apesar de terem os mesmos direitos de cidadania, têm necessidades distintas. E a integralidade contempla o cuidado integral da pessoa, abrangendo a prevenção de doenças, promoção da saúde, tratamento e reabilitação, além de prever a complementaridade com outras políticas públicas, em uma perspectiva Inter setorial.
A institucionalização e a implementação do SUS representaram uma revolução na atenção à saúde no Brasil. Em toda a trajetória anterior do país, a saúde não era considerada um direito de todos e todas. Saúde era um privilégio de quem podia ter acesso a serviços particulares ou uma condição tratada sob a ótica da caridade, através da ação das Santas Casas de Misericórdia.
Imediatamente antes da criação do SUS, o acesso a serviços gratuitos de saúde era possível apenas para o trabalhador que tinha carteira assinada, o que estava longe de ser a situação de todos os brasileiros e brasileiras.
Mas esse grande patrimônio que é o SUS não nasceu de uma hora para outra. Ele é resultado de um processo histórico que demandou uma ação coletiva, em um movimento que contou com a participação de médicos, gestores, estudantes, parlamentares e profissionais de diversas áreas. De modo específico, o SUS resulta do chamado movimento da reforma sanitária, que evoluiu de forma concomitante à luta pela democratização do país durante o regime militar instalado pelo golpe de 31 de março de 1964.
Com o protagonismo de vários atores sociais, o movimento da reforma sanitária foi desenhando o formato do SUS, consolidado em 1986 na oitava Conferência Nacional de Saúde, a primeira após o fim da ditadura, e finalmente oficializado com a chamada Constituição Cidadã de 1988.
Os antecedentes do movimento da reforma sanitária e todos os passos que levaram à criação do SUS estão documentados no livro “A Epopeia do SUS – Uma conquista civilizatória”, assinado pelos médicos Carmino Antonio de Souza e José Ênio Servilha Duarte, pela advogada Lenir Santos e pelo jornalista José Pedro Soares Martins.
O livro foi publicado pela Editora da Unicamp, a universidade pública que teve um papel central no movimento que derivou na constituição do SUS. São vários profissionais e dirigentes da Unicamp com lugar de destaque nesse movimento, como o médico sanitarista Sérgio Arouca, o ex-reitor José Aristodemo Pinotti e o advogado Guido Carvalho, pioneiro do Direito Sanitário no Brasil.
A obra escrita a oito mãos representa, portanto, um tributo a esses e vários outros brasileiros e brasileiras, que ajudaram a viabilizar esse orgulho nacional que é o SUS. Um orgulho sem dúvida, mas em construção, porque o SUS não está pronto.
O Sistema Único de Saúde sofre constantemente com problemas de financiamento e é vítima de ataques sistemáticos por interesses corporativos. Muito falta, de fato, a ser garantido, mas o SUS como existe e vem sendo aprimorado tem sido fundamental para a saúde no país.
Não fosse o SUS, a pandemia de Covid-19 seria uma tragédia ainda maior. O livro “A Epopeia do SUS – Uma conquista civilizatória” terá lançamento especial no dia 27 de agosto, às 15 horas, no saguão da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp. Mais uma homenagem à instituição que foi crucial para o florescimento do SUS.
Carmino Antonio de Souza é professor titular da Unicamp. Foi secretário de saúde do estado de São Paulo na década de 1990 (1993-1994) e da cidade de Campinas entre 2013 e 2020. Secretário-executivo da secretaria extraordinária de ciência, pesquisa e desenvolvimento em saúde do governo do estado de São Paulo em 2022 e atual Presidente do Conselho de Curadores da Fundação Butantan. Diretor científico da Associação Brasileira de Hematologia, Hemoterapia e Terapia Celular (ABHH).
José Pedro Soares Martins é jornalista, escritor e consultor de comunicação. Com premiações nacionais e internacionais, é um dos profissionais especializados em meio ambiente mais prestigiados do País. E-mail: josepmartins21@gmail.com











