Os preparativos para a COP-30 em Belém estão a mil e, como era de se esperar, muita gente já está pensando em lucrar com o grande evento, que pode ser decisivo para o futuro da humanidade. Informações dão conta de que o aluguel de um apartamento pelas duas semanas de duração da COP da Amazônia está chegando a 2 milhões de reais.
Além da preocupação com a infraestrutura para a Conferência que vai receber milhares de pessoas, do mundo inteiro, é cada vez mais forte a inquietação entre os setores ambientalistas a posição de parte do governo brasileiro a respeito de um tema espinhoso, a exploração de petróleo na foz do Amazonas.
É incrível como alguns desses segmentos têm defendido que a exploração de petróleo integra a estratégia oficial de transição energética do Brasil. Petróleo na transição energética soa como a raposa no galinheiro, imagem tão desgastada mas tão atual em alguns círculos do poder no país.
A sensação de desconforto aumentou com as recentes declarações do presidente Lula, que sempre bancou com alguma firmeza, contra a turma da pesada, as posições pró-ambientais da ministra Marina Silva. Em recente entrevista a rádios de Minas Gerais, disse Lula:
“Queremos o petróleo, porque ele ainda vai existir por muito tempo. Temos que utilizar o petróleo para fazer a nossa transição energética, que vai precisar de muito dinheiro. A gente tem perto de nós a Guiana e o Suriname pesquisando o petróleo muito próximo a nossa margem equatorial”.
O que está em jogo é a projetada exploração de petróleo no bloco FZA-M-59, localizado na Foz do Amazonas. Trata-se de uma área localizada na chamada Margem Equatorial – região que abrange as bacias sedimentares de Foz do Amazonas, Pará-Maranhão, Barreirinhas, Ceará e Potiguar.
As reações à declaração de Lula são contundentes. Por exemplo, de representantes de povos indígenas localizados na região.
“O bloco FZA-M-59 fica a 150km das terras indígenas no Oiapoque, territórios que estão bem na linha de frente e que já vêm sofrendo com os impactos sociais e ambientais que esse empreendimento traz para a região”, afirmou Luene Karipuna, coordenadora-executiva da Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Amapá e Norte do Pará (Apoianp).
As comunidades quilombolas da região também estão muito preocupadas. “A CONAQ encontra-se preocupada com a iminente exploração de petróleo na Foz do Amazonas. A estatal estuda a região há pelo menos dois anos, mas até o momento não consultou os quilombolas e demais povos que vivem próximo ao local e temem que suas comunidades sejam prejudicadas. Exigimos que os órgãos e autoridades competentes realizem a consulta pública prevista na Lei nº 9.784/1999 (Lei de Processos Administrativos), pois a biodiversidade e as vidas humanas que ali vivem podem sofrer impactos irreversíveis”, afirmou em nota a Coordenação Nacional de Articulação de Comunidades Negras Rurais Quilombolas (CONAQ).
Entre as organizações ambientalistas, a crítica é igualmente dura. “Não deveria haver emissão de qualquer licença ambiental no grito. O Ibama já emitiu mais de 2 mil licenças de perfuração offshore. Está negando uma e ela virou bandeira para um ‘liberou geral’ na Margem Equatorial. A região do bloco 59 é ambientalmente muito sensível e com correntes fortíssimas. Os técnicos do Ibama têm apontado há anos os problemas associados a essas condições. Se o governo fizesse avaliações ambientais das áreas sedimentares, previstas desde 2012, a bacia da Foz do Amazonas já teria sido qualificada como inapta para a produção de petróleo”, alerta Suely Araújo, coordenadora de Políticas Públicas do Observatório do Clima, uma rede de organizações que atuam no Brasil no enfrentamento das mudanças do clima.
O impasse é claro. A COP-30 pode ser de fato a última tentativa de busca de um acordo global de enfrentamento da emergência climática, o que só pode acontecer com a eliminação mais rápida possível dos combustíveis fósseis e avanço igualmente rápido no uso das energias renováveis, que o Brasil aliás lidera e pode dar saltos ainda maiores.
O governo brasileiro insistir na exploração de petróleo nas bordas do bioma sensível que é a Amazônia é um grave retrocesso. Vamos ver como evolui a situação, que pode definir como o atual governo entrará para a história em termos socioambientais.
José Pedro Martins é jornalista, escritor e consultor de comunicação. Com premiações nacionais e internacionais, é um dos profissionais especializados em meio ambiente mais prestigiados do País. E-mail: josepmartins21@gmail.com