Ter a possibilidade de acompanhar presencialmente o dia a dia do clube do coração está entre os ideais de vários torcedores fanáticos. E no Guarani, no meio de milhares de apaixonados pelas cores alviverdes, um deles pode dizer que realiza esse sonho diariamente há 36 anos. Em 1989, Claudio da Silva trocou de lugar no Brinco de Ouro. Das arquibancadas, foi para o interior do estádio e transformou o reduto bugrino em sua segunda casa.
Como gandula e roupeiro do Guarani, Claudio da Silva, mais conhecido como Bolete, testemunhou em detalhes a história do Bugre pós vice-campeonato paulista de 1988, marcado pela final histórica contra o Corinthians. Esteve próximo de personagens, que conduziram o clube ao auge, como a equipe comandada por Amoroso e Luizão, semifinalista do Brasileirão de 1994, e ao fracasso, exemplificado pelos seguidos rebaixamentos nesse século.
Por ocasião do aniversário de 251 anos de Campinas, o Hora Campinas publica uma conversa com Bolete, mais do que um funcionário do Guarani, um personagem inspirador pela paixão e memória que carrega do centenário clube campineiro.

Da arquibancada para o interior do Brinco
Antes de se tornar funcionário do Guarani, Bolete era um assíduo frequentador dos treinos do time no Brinco de Ouro, costume que se fortaleceu quando foi mandado embora de seu primeiro emprego aos 17 anos. “Eu trabalhava numa banca do jogo do bicho e era um sábado, dia de jogo decisivo no Brinco entre Guarani e São Paulo. O dono da banca me disse: ‘o Guarani pode perder, mas você não pode perder o emprego’. Não ouvi os conselhos dele e fui para o jogo. Resultado: o Guarani ganhou do São Paulo e eu perdi o emprego”, conta entre risos.
Além do Guarani, outra paixão daquele jovem era o rádio. “Meu sonho era ser repórter, comentarista, jornalista”, diz.
E foi esse ideal que o levou a fazer amizade com Almeida Neto, conhecido como Bolinha, repórter esportivo da Rádio Central e presente diariamente no Brinco para a transmissão das novidades do clube aos ouvintes. A convivência entre ambos se fortaleceu e originou o apelido que acompanhou o jovem torcedor pelo restante da vida. “Na época, tinha aquela bala e chiclete bolete e, como eu andava muito com o Bolinha, o pessoal começou a falar: ‘lá vai o Bolinha e o Bolete’. Aí pegou.”
Foi também por meio da influência do parceiro radialista que as portas do Guarani se abriram. “Surgiu uma vaga no clube e ele me indicou”, conta o bugrino, por muitos anos gandula nos jogos do Bugre no Brinco. “Foi uma época incrível”, lembra. “Ficar pertinho de ídolos, jogadores que jamais eu imaginava ver de perto, foi uma satisfação enorme.” Já satisfação não era o sentimento que os adversários e a arbitragem carregavam quando o Guarani estava ganhando e Bolete era o gandula.
“Fui várias vezes expulso por retardar partidas”, conta.
Outra pessoa importante para Bolete no Guarani foi o ropeiro Zé Carlos, conhecido como Zé Bundão, seu professor. “Eu ia observando, vendo o jeito que o serviço era feito, e peguei o esquema.” Zé Bundão deixou o Guarani em 2002.

Muitas emoções
Bolete não se esquece do time do Guarani de 1989, ano em que ele começou a trabalhar no clube. Foi um período de transição, após o vice-campeonato paulista no ano anterior. “Tinha o Pereira, zagueiro do Bahia; Washington, centroavante do Fluminense; Pita, que estava retornando da França; Zenon, que tinha voltado ao clube; o ponta direita Tato, da Inter de Limeira; Airton, volante do Internacional; Cristóvão, meia que foi do Grêmio e estava no Exterior; Betão, lateral do Sport e o goleiro era João Leite”, detalha.

Apesar de ser integrado por nomes de peso, aquele time deixou a desejar dentro de campo. Performance diferente teve a equipe de 1994, comandada por Amoroso, para Bolete, a principal personalidade com a qual ele conviveu no clube.
“Amoroso é formidável. Me ajudou muito quando eu precisei e, dentro de campo, seu talento foi indiscutível. Por onde passou foi artilheiro. No Guarani, foram 44 jogos e 33 gols”, diz, orgulhoso.
Um jogo inesquecível, Bolete cita o empate por 3 a 3 entre Guarani e Palmeiras no Campeonato Paulista de 1997. Na beirada do campo, na condição de gandula, ele viu o goleiro bugrino Hiran se deslocar até a área do adversário em cobrança de escanteio e marcar, de cabeça, o gol de empate aos 46 do segundo tempo.

Já o momento de maior alegria foi a volta para a Série A1 do Campeonato Paulista em 2018. “Foi um alívio, pois o Guarani passava por anos terríveis, de muita tristeza e a situação do clube era difícil”, recorda.
O rebaixamento no ano passado para a Série C do Brasileiro é citado como o mais triste.
Por outro lado, ele elogia a atual estrutura do clube. “Nunca tivemos um departamento médico como o atual, sem contar que o gramado do estádio é um dos melhores do Brasil.”
Hoje, aos 52 anos, Bolete mora no Jardim Nova América, próximo ao Aeroporto de Viracopos, mesmo bairro em que residia quando começou a trabalhar no Brinco. E o costume de dormir no clube quando os jogos terminam tarde ainda faz parte da rotina de quem há mais de 35 anos faz do Guarani uma parte importante de sua vida.
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