Um templo religioso de matriz africana, em Campinas, tem sido alvo de ataques em série. Desde o começo do ano passado, foram dezenas de agressões com fezes de animais, bexigas com tinta e pedras. No mais recente, no último dia 26, os muros foram pichados com palavras ofensivas à religião. Os líderes do templo já registraram boletim de ocorrência e pedem providências das autoridades por medo de que os ataques possam ficar mais violentos no futuro.
O Templo de Umbanda Filhos da Fé existe há 10 anos e está instalado desde 2016 na Rua Artur Leite de Barros Júnior, na Vila Pompeia. Os ataques começaram em fevereiro de 2021.
“Colocavam sacolas com cocô e xixi de gato na porta. Antes, o barracão não tinha muro. Mas a situação foi se agravando. Entramos em contato com a imobiliários e conseguimos fazer o muro. Por conta disso, os ataques começaram a ficar mais espaçados, a cada um ou dois meses”, explica Beatriz Azevedo, dirigente do templo.
De acordo com a líder, foram várias ocorrências ao longo de 2021.
“Mas no fim do ano, de novembro para cá, isso começou a ficar cada vez mais presente, praticamente toda semana. Ele vem, começou jogado sacolas com cocô e xixi de gato por cima do muro, depois bexigas com tinta, começou a jogar pedras”, conta Beatriz.
O local ficou com vários vidros quebrados por conta dos ataques.
“Agora começou a pichar e escrever palavras de ofensas à nossa religião, coisas muito agressivas. Já fizemos boletim de ocorrência, mas está cada vez mais frequente. Faz uns dois ou três meses que colocamos câmera de segurança, mas nem isso está inibindo as ações. A gente está fazendo um apelo porque não sabe até que ponto ele pode chegar”, explica a dirigente.
Os muros foram pichados com linguagem ofensiva como “Zé Pilintra viado”, Echú Caveira, Tranca Rua, demônios mata criança”
Pelas imagens captadas pela câmera de segurança, o responsável pelos ataques é sempre a mesma pessoa.
“Pelas gravações a gente consegue identificar que é do sexo masculino, de meia idade, uma pessoa alta, magra. Mas pela câmera, como vem sempre de máscara ou vem com moletom, não dá para realmente saber quem é. Já chegou a parar com o carro”, diz Beatriz.
“A gente faz um apelo às autoridades até para que isso também não aconteça com outras casas. Que a gente consiga parar com isso”, finaliza.
A Secretaria de Segurança Pública (SSP) foi acionada, mas ainda não enviou posicionamento sobre os ataques ou investigação.
Os ataques a terreiros na região de Campinas têm sido cada vez mais frequentes. Conforme o Hora Campinas publicou em dezembro de 2021, em Sumaré, havia sido contabilizados três ataques em três meses.
O Terreiro Oxalá e Iemanjá, no Jardim Bela Vista foi o primeiro a sofrer ataque, em 11 de setembro. Depois de estourarem o portão, os criminosos arrancaram o relógio medidor de energia e jogaram em um terreno ao lado. Além disso, objetos sagrados foram quebrados e roupas de santo rasgadas.
O segundo alvo foi a casa espiritual Pai João da Guiné, no Jardim Picerno, em 7 de outubro. Diversas imagens de santos católicos foram depredadas, e os atabaques foram rasgados.
A terceira invasão ocorreu em novembro, no terreiro de uma mãe de santo que registrou o boletim de ocorrência, mas que não disponibilizou o registro, nem revela a data o local, por medo de novos ataques e ameaças. Nesse caso, os criminosos não conseguiram invadir a casa, por isso, vandalizaram a fachada e arrancaram o toldo.
Na ocasião, a SSP informou que o caso ocorrido em 7 de outubro é investigado pelo 2º DP de Sumaré. “A autoridade policial orientou a vítima quanto aos prazos para ofertar representação criminal e solicitou exames periciais”, afirmou.
O segundo caso, teve o boletim registrado pela internet indeferido, mas foi efetuado pessoalmente. “A unidade também investiga um furto de fios em um centro espírita ocorrido em 11 de setembro. Diligências prosseguem visando a identificação dos autores de ambos os delitos. Quanto ao BO registrado pela Delegacia Eletrônica, o mesmo foi indeferido por divergências nos dados”, ressaltou.
Associação de Religiosos
A Associação de Religiosos das Comunidades Tradicionais de Matriz africana de Campinas e região enviou nota em que condena o ataque sofrido pelo Terreiro de Umbanda Filhos da Fé. Diz o texto:
“Além das pedras atiradas, as ofensas expressadas na pichação no muro do Templo Religioso serem de total desrespeito aos nossos guias, entidades e encantados, como também, às pessoas da comunidade religiosa que têm a função de prestar a caridade; são ataques de ódio sistemáticos às nossas comunidades de Umbanda e Candomblé.
Esse ódio impede que o responsável por esse ataque conheça o trabalho de responsabilidade social que tem o Terreiro de Umbanda Filhos de Fé, onde desenvolvem através de campanhas de arrecadação de alimentos, roupas, remédios, ajudar e amparar os que mais precisam. Sabemos que não se trata de intolerância apenas. Estamos falando de um racismo religioso.
Nossa Solidariedade à Todos os Membros do Terreiro de Umbanda Filhos de Fé, compartilhado do nosso sentimento de indignação pela violência praticada contra o Terreiro.”