Começou ontem e vai até o dia 1º de novembro na cidade de Cali, na Colômbia, a Décima Sexta reunião da Conferência das Partes da Convenção das Nações Unidas sobre Diversidade Biológica, a COP-16 da Biodiversidade. Mais uma vez, a COP da Biodiversidade recebe muito menor atenção da mídia e da comunidade mundial em geral do que as COPs do Clima, como a próxima COP-29 que acontece em Baku, no Azerbaijão, entre 11 e 22 de novembro.
Aliás, e como parênteses, o Azerbaijão é mais um país rico em combustíveis fósseis que sedia uma COP do Clima, o que é no mínimo estranho considerando que o grande desafio global atual é exatamente o da substituição dos fósseis por fontes energéticas renováveis.
Porque são os fósseis os responsáveis pelas mudanças climáticas que cada vez mais apavoram as populações de toda parte do planeta, por estarem na base dos eventos climáticos extremos como as enchentes no Rio Grande do Sul e recentes queimadas devastadoras em grande parte do território brasileiro.
Mas, voltando às COPs da Biodiversidade, como a atual na Colômbia, um dos chamados países megadiversos, ou seja, com grande quantidade e qualidade em recursos naturais vegetais e animais. O Brasil é com certeza o país mais megadiverso do mundo (em função da riqueza biológica existente na Amazônia, Pantanal, Caatinga, Mata Atlântica e demais biomas) e mais uma vez decepciona e não aproveitará a COP-16 para firmar uma liderança planetária em ações pela proteção da biodiversidade.
Ocorre que o Brasil não concluiu, até a realização da COP-16, sua Estratégia e Plano Nacional da Biodiversidade. Mas o Brasil não está só, pois apenas 35 países concluíram suas Estratégias e Planos Nacionais, incluindo alguns que passam por tragédias gigantescas, como o Estado da Palestina, ou outros que vivenciam há anos de crises sociais crônicas, como Cuba. A maioria dos países europeus já apresentou seus documentos, e na América Latina/Caribe apenas Colômbia, México, Cuba e Suriname já o fizeram.
Nesta segunda-feira, a delegação do Brasil divulgou o documento “Contribuições e avanços do Ministério do Meio Ambiente para o cumprimento das Metas de Kunming-Montreal”, relatando o que já foi feito até o momento pelo governo de Luiz Inácio Lula da Silva em proteção da biodiversidade e sinalizando o que deve ser incluído na Estratégia e Plano Nacional do país, a serem concluídos nos próximos meses.
O documento lembra que já houve por exemplo uma expressiva redução no desmatamento na Amazônia, “evitando o lançamento de 250 milhões de toneladas de CO2 na atmosfera e, com tais resultados, estamos promovendo a conservação e a restauração de nossas terras, águas e ecossistemas, criando oportunidades para um novo ciclo de prosperidade econômica que alie o combate às desigualdades sociais à necessária sustentabilidade ambiental e justiça climática”.
O documento também cita a seca extrema “que assola quase 60% do território nacional, criando uma ambiência propícia a ações criminosas causadoras de incêndios devastadores, afetando consideravelmente milhões de pessoas e resultando na perda de habitats, declínio de populações e desequilíbrios ecológicos”. Em suma, o documento do Ministério do Meio Ambiente elenca várias ações já realizadas ou previstas, para incrementar a proteção da biodiversidade no país. E admite que são robustos os desafios que o país enfrenta nesse sentido.
De qualquer modo, seria crucial que o Brasil tivesse concluído a sua Estratégia e Plano Nacional da Biodiversidade até a realização da COP-16. Essa medida confirmaria o país como uma liderança fundamental na proteção mundial da biodiversidade, em um momento em que o planeta passa pela aceleração da extinção da diversidade biológica. São milhares de espécies ameaçadas ou em risco de extinção, o que representa uma ameaça à própria vida na Terra. Nós e todos os seres vivos dependem da teia de relações criada ao longo de bilhões de anos no planeta, incluindo a conexão entre as espécies vegetais e animais e entre elas e os recursos como solo, água e ar.
A aceleração da extinção da biodiversidade está relacionada com os processos de desmatamento, que continuam em grande escala, mas também com as próprias mudanças climáticas.
O Pantanal brasileiro, por exemplo, um dos territórios com maior biodiversidade no mundo, ainda se recupera e mal das queimadas de 2020 e agora já enfrenta outra escalada de incêndios. São milhões de animais vertebrados ou invertebrados atingidos pelas queimadas no bioma, que ainda levará anos para ser totalmente recuperado, se outra tragédia climática não ocorrer em breve.
A COP-16 trata, portanto, de um tema central para o planeta e a humanidade. É uma pena que a atenção para o evento na Colômbia não seja a mesma que será verificada na COP-29 no Azerbaijão. E o Brasil deixa passar mais uma oportunidade, pois a consolidação de uma liderança global em biodiversidade é essencial inclusive porque o país sediará a COP-30 do Clima em 2025, em Belém.
E o evento na Amazônia, que tende a ser histórico, será ainda mais marcante se fizer a urgente e estratégica associação entre esses dois desafios planetários vitais, mudanças do clima e erosão rápida da diversidade biológica.
José Pedro Martins é jornalista, escritor e consultor de comunicação. Com premiações nacionais e internacionais, é um dos profissionais especializados em meio ambiente mais prestigiados do País. E-mail: josepmartins21@gmail.com