A recente tendência da “chupeta para adultos” não pode ser reduzida a uma excentricidade. Ela revela uma dimensão sintomática da cultura contemporânea: a dificuldade de lidar com a ansiedade, a angústia e o estresse que marcam o cotidiano. O gesto de levar à boca um objeto infantil não é mero capricho, mas uma tentativa de encontrar, ainda que por instantes, uma sensação de segurança e acolhimento. Em termos psicanalíticos, trata-se de um retorno à oralidade, uma regressão a uma fase em que a sucção funcionava como fonte de prazer e calma.
O adulto, diante de um mundo que não oferece tempo para simbolizar, recorre a um mecanismo primitivo de apaziguamento.
Winnicott falaria de objeto transicional, aquele que ajuda o bebê a suportar a ausência da mãe. A chupeta, nesse caso, funciona como um pseudo-objeto transicional, fabricado e comercializado para adultos que buscam no silicone o que a vida não oferece em vínculos e cuidado. Lacan diria que esse gesto aponta para o objeto a, um resto de gozo que jamais satisfaz, mas que, repetidamente, promete um alívio. A filosofia também ilumina esse fenômeno. Kierkegaard chamou de vertigem da liberdade o sentimento que gera angústia. Heidegger identificou na angústia a abertura ao nada. Frente a essa experiência insuportável, a sociedade prefere tamponar. O mercado, atento, transforma a dor em oportunidade e vende um objeto que simboliza um colo artificial.
O risco, porém, não se limita à cena íntima. Vivemos em uma era em que modas se espalham com velocidade inédita. O tabaco foi, em seu início, um símbolo de status, uma moda elegante. O cigarro eletrônico e os pods descartáveis também surgiram como novidade divertida e “cool”, rapidamente normalizada pelo efeito manada.
O mesmo processo pode acontecer aqui. Influenciadores mostram sua chupeta como performance, e o gesto, antes constrangedor, torna-se compartilhável, exibível, validado pelo espetáculo. Guy Debord lembrava que na sociedade do espetáculo não vivemos experiências, mas imagens. A chupeta vira então um signo de pertencimento, uma senha de tribo, uma forma de dizer “sou parte do grupo que se cuida contra a ansiedade”.
A infantilização que emerge desse hábito é preocupante. Regredir, em si, pode ser uma defesa legítima em momentos de cansaço, mas quando a regressão é fixada, cristalizada em modinha, ela enfraquece a simbolização. A boca ocupada silencia a fala, e a palavra, que poderia elaborar a angústia, é substituída pelo objeto que apenas a suspende. Foucault diria que estamos diante de mais um dispositivo de captura do corpo e do desejo: um mecanismo que governa os afetos, oferecendo um alívio sem elaboração, um prazer imediato que mantém o sujeito preso à lógica do consumo.
Essa busca pelo alívio instantâneo é um pharmakon: remédio e veneno ao mesmo tempo. Ajuda momentaneamente, mas ao mesmo tempo mascara a falta de elaboração, reforça a dependência e enfraquece a capacidade de suportar o vazio. O problema não é a chupeta em si, mas a tendência de transformar o gesto regressivo em estilo de vida, em hábito social, em performance coletiva. Quando isso acontece, a possibilidade de amadurecimento é suspensa, e o sujeito fica preso em uma zona infantilizada, sem espaço para crescer simbolicamente.
Em conclusão, a chupeta para adultos revela mais sobre a sociedade do que sobre indivíduos isolados. Ela denuncia um tempo em que não sabemos lidar com a angústia e buscamos atalhos para silenciá-la.
O desafio ético é outro: não anestesiar o mal-estar, mas acolhê-lo, simbolizá-lo, enfrentá-lo. Cuidar de si não é recorrer ao objeto que infantiliza, mas criar práticas que possibilitem autonomia, maturidade e elaboração. Conversar, escrever, caminhar, respirar, eis recursos que não reduzem o sujeito à repetição oral, mas o convidam a transformar a angústia em criação. Se a chupeta é o sintoma, que possamos responder não com silêncio, mas com palavra, encontro e pensamento.
Thiago Pontes Thiago Pontes é Filósofo, Psicanalista e Neurolinguísta (PNL) – Instagram @institutopontes_oficial











