No dia a dia, somos bombardeados por uma sinfonia de sons: conversas no elevador, o latido de um cão, o riso de uma criança, a freada de um carro, a buzina de um motorista impaciente, trovões, sirenes, o toque do celular em reuniões e o canto da cigarra. A cacofonia varia conforme o ambiente, mas permanece a pergunta: ouvir é o mesmo que escutar?
A resposta é um sonoro não. Ouvir é um processo mecânico, ligado à nossa audição. Escutar, por outro lado, exige presença e atenção plena. E essa presença, infelizmente, anda em falta.
Quando um amigo nos convida para um café ou um colega nos chama para uma conversa, eles procuram mais do que palavras: buscam ser escutados.
A era dos celulares e das redes sociais tornou a escuta mais difícil. É comum vermos casais e amigos reunidos em restaurantes, mas ausentes uns para os outros, imersos em seus aparelhos. A interação, muitas vezes, se resume a tirar fotos para as redes sociais. Escolas que proibiram celulares notaram um aumento na interação entre crianças e jovens, que redescobriram o prazer dos jogos coletivos e das conversas despretensiosas. Um caminho promissor para as novas gerações.
A escuta se tornou tão rara que a Igreja Católica criou uma Pastoral da Escuta, dedicada a escutar atentamente as necessidades e desabafos das pessoas, buscando auxiliá-las.
O escritor e filósofo Rubem Alves certa vez escreveu que gostaria de propor um curso de “escutatória”, pois acreditava que ouvir é algo complexo e sutil. Ele também disse: “O que as pessoas mais desejam é alguém que as escute de maneira calma e tranquila. Em silêncio. Sem dar conselhos. Sem que digam: ‘Se eu fosse você’. A gente ama não é a pessoa que fala bonito. É uma pessoa que escuta bonito. A fala só é bonita quando nasce de uma longa e silenciosa escuta. É na escuta que o amor começa. E é na não-escuta que ele termina. Não aprendi isso nos livros. Aprendi prestando atenção.”
Mas há um termo ainda mais profundo que também é muito usado na medicina: “auscultar”. Derivado do latim auscultare, significa “ouvir com atenção”. Que tal se, além de ouvir e escutar, passássemos a auscultar o outro?
A auscultação nos convida a ir além das palavras, a compreender o que não é dito, mas sentir o que o outro sente. Significa praticar a empatia, manter a atenção plena, fazer perguntas abertas e evitar distrações. É construir pontes, resolver conflitos e fortalecer laços. É, na última análise, humanizar nossas relações.
Que possamos, então, redescobrir a arte de auscultar, conectar-nos verdadeiramente com o outro e construir um mundo onde a escuta seja uma base para a compreensão e a harmonia.
Luis Norberto Pascoal é empresário e presidente da Fundação Educar