Os sinais estão por toda a parte e acelerando. Mais de 1300 peregrinos em sua jornada para Meca morreram em junho, em função de uma onda de calor que superou os 50 graus centígrados. No mesmo mês, dezenas de corpos apareceram em vários locais de Nova Delhi, na Índia, igualmente assolada por temperaturas extremas. O mesmo fenômeno foi responsável por várias mortes, inclusive de turistas, na Grécia. Na Argélia, também em junho, manifestações violentas foram registradas na cidade de Tiaret, em protesto contra o racionamento de água em meio ao calor escaldante.
No Brasil, como se sabe, no Pantanal mais de 400 mil hectares foram queimados em junho, de acordo com dados do Laboratório de Aplicações de Satélites Ambientais da Universidade Federal do Rio de Janeiro (LASA-UFRJ). As estimativas são de que, ao longo do mês, foram queimados 9,4 hectares por minuto. Em maio, em decisão inédita, a Agência Nacional de Águas já havia declarado a “situação crítica”, por escassez quantitativa de água, na bacia hidrográfica do rio Paraguai, onde está o Pantanal. Isso ao mesmo tempo em que o Rio Grande do Sul continuava sofrendo os impactos de enchentes históricas.
Estamos no meio de uma guerra climática e as vítimas são contabilizadas em todas as regiões do planeta, ora por secas extremas, ora por enchentes históricas, ora pelo aumento do nível do mar. Foi este o caso de 300 famílias da etnia Guna, que viviam em uma ilha e foram transferidas pelo governo do Panamá para o bairro de Isber Yala. Outros deslocamentos são previstos pelo governo panamenho, em decorrência da subida sistemática das águas do mar, atingindo ilhas do Caribe.
Mesmo em áreas bem mais ricas, o perigo é o mesmo. No Sul da Flórida, algumas regiões já registraram a elevação do nível do mar em 11 milímetros por ano, muito mais do que a média de 1,7 milímetro/ano na virada dos séculos 20/21.
Em Idaho, a escassez de água provocou uma forte disputa entre agricultores na bacia do rio Snake. Os embates têm sido provocados pelo uso excessivo de um aquífero subterrâneo que originalmente abastece o rio Snake. Muitos agricultores ficaram de repente sem a água que irriga campos de cevada, trigo e alfafa.
As causas dessa guerra sem fronteiras, sem prazo para terminar, são mais do que conhecidas. Em 2023, foi recorde o consumo mundial de combustíveis fósseis, o que neutralizou o fato de que no mesmo ano foi igualmente recorde a produção de energia de fontes renováveis.
Neste cenário nada alentador, o secretário-geral da ONU, António Guterres, não se cansa de fazer alertas e propor medidas duras, o que nunca é acatado. Desta vez, ele chegou a defender que propagandas de grandes grupos dos combustíveis fósseis sejam proibidas nos meios de comunicação, a exemplo do que já ocorreu com propagandas do cigarro há algum tempo.
Sim, porque os alertas, seja da ONU ou de cientistas, não têm resultado em nada concreto. Pelo contrário, a corrida por novas fontes de fósseis continua, e não é diferente no Brasil.
O que o planeta vivencia, neste momento, é mesmo uma guerra, o que ficou claro na recente reunião de cúpula da OTAN em Washington. No encontro, foi divulgado um relatório apontando os riscos à segurança global derivados das mudanças do clima. Foram igualmente divulgados números como a ação de 30 destacamentos militares internacionais em 2023, em resposta a emergências climáticas em 14 países.
Resta a ação da cidadania planetária, que seja intensificada para que leve a ações urgentes e eficazes. Protestos vêm ocorrendo, aqui e ali. Durante o tradicional encontro de celebração do solstício de verão, as milenares pedras de Stonehenge, na Inglaterra, foram pintadas de laranja, como um pedido dos manifestantes para o governo britânico acelerar as ações de enfrentamento às mudanças climáticas.
Algumas vitórias pontuais têm sido registradas. Caso das comunidades da Califórnia que, após muita luta, conseguiram barrar, ao menos por enquanto, novas perfurações de petróleo, a menos de 3.200 metros de clínicas, escolas, casas e outros locais considerados sensíveis.
Mas é preciso muito mais, para que legisladores, gestores e CEOs ouçam o clamor popular. Enquanto isso a natureza arde ou chora, na Amazônia, no Pantanal, na Arábia Saudita ou Pensacola. Que tenhamos olhos e ouvidos bem abertos e que não nos acomodemos.
José Pedro Martins é jornalista, escritor e consultor de comunicação. Com premiações nacionais e internacionais, é um dos profissionais especializados em meio ambiente mais prestigiados do País. E-mail: josepmartins21@gmail.com