De volta ao Brasil após quatro anos, o Foo Fighters é a principal atração deste sábado (9) no festival The Town, realizado desde a semana passada no Autódromo de Interlagos, em São Paulo. Diante de milhares de fãs, o show da banda liderada pelo vocalista e guitarrista Dave Grohl encerrará noite dedicada ao rock, que também contará com performance da cantora brasileira Pitty, além de apresentações das bandas americanas Garbage e Yeah Yeah Yeahs, como principais destaques. O evento, que vive a sua primeira edição, encerra-se neste domingo (10).
Esta será a sexta passagem do Foo Fighters pelo Brasil, mas a primeira desde a morte do baterista Taylor Hawkins, ocorrida em março do ano passado. Ele tinha 50 anos e morreu vítima de overdose, dentro do quarto de um hotel em Bogotá, na Colômbia, horas antes de uma apresentação na cidade, durante turnê pela América do Sul. Dois dias depois, a banda tocaria no festival Lollapalooza, em São Paulo, mas o show precisou ser cancelado.
Restabelecido um ano e meio depois da irreparável perda de Taylor Hawkins, o Foo Fighters retorna ao Brasil, agora com o baterista Josh Freese. Liderado pelo lendário Dave Grohl, o grupo também conta com outros quatro integrantes: os guitarristas Pat Smear e Chris Shiflett, o baixista Nate Mendel e o tecladista Rami Jaffee.
A última apresentação do Foo Fighters em palcos brasileiros aconteceu em setembro de 2019, como parte da programação do festival Rock in Rio. O primeiro show do grupo no país também aconteceu no famoso e icônico festival carioca, em janeiro de 2001. Antes disso, no entanto, alguns integrantes do grupo já haviam se apresentado no Brasil, porém como membros de outras bandas.
Em 1993, por exemplo, Dave Grohl tocou no festival Hollywood Rock, no estádio do Morumbi, em São Paulo, como baterista do Nirvana, uma das bandas mais importantes de todos os tempos – depois da morte de Kurt Cobain, em 1994, Dave Grohl fundaria o Foo Fighters.
Já em 1998, foi a vez de Chris Shiflett desembarcar no Brasil, acompanhado de uma banda californiana de hardcore chamada Lagwagon. Embora fosse integrante do No Use For a Name, outra banda da mesma vertente, Shiflett participava daquela turnê como substituto do guitarrista original do Lagwagon, Chris Flippin, que estava impossibilitado de viajar.
Na ocasião, além de realizar shows em grandes centros como São Paulo, Santos, Belo Horizonte e Curitiba, o Lagwagon também se apresentou na cidade de Campinas, algo bastante raro para a época. O show aconteceu no dia 25 de maio de 1998, no antigo Tribo Urbana, que funcionava na Rua das Hortências, número 44, no bairro Chácara Primavera.
“Eu fui um dos produtores desse show, ao lado do meu amigo Tiago Nicolas. A casa estava cheia, ainda mais para uma segunda-feira, com gente vinda de toda a RMC e além, mais um povo vindo da capital e até de Santos”, conta o músico e produtor cultural Daniel Pacetta Giometti, conhecido como Etê, que também é desenhista e produziu o cartaz do evento (veja acima).
“O show aconteceu numa segunda-feira, numa casa chamada Tribo Urbana, que concentrava toda uma cena underground (ou alternativa, como se dizia na época) aqui de Campinas na segunda metade dos anos 90, com shows semanais e uma programação majoritariamente autoral que incluía desde bandas locais até nomes de relevância internacional, como Agnostic Front, a mais emblemática das bandas de hardcore de Nova York, e Marky Ramone, baterista dos Ramones, além de importantes artistas brasileiros, como Ratos de Porão, Cólera e Dorsal Atlântica”, lista Daniel Pacetta Giometti, conhecido como Etê, antigo administrador do extinto Tribo Urbana.
“Foi uma das minhas primeiras experiências em produção local no que diz respeito a bandas internacionais. As anteriores foram com o Fugazi e o Agnostic Front. Vale lembrar que, na época, a vinda dessas bandas para Campinas era algo extremamente incomum, diria que até inimaginável para algumas pessoas”, contextualiza Etê.
“Nessa época, o Lagwagon era uma banda bem popular dentro desse cenário e também contava com integrantes do RKL (Rich Kids on LSD), outra banda clássica e primordial de toda a cena de hardcore californiana da metade dos anos 80 em diante”, aponta.
“Hospedamos a banda toda no apartamento de um amigo nosso onde já haviam alguns outros amigos hospedados justamente para o show, o que causou um certo estranhamento. Chris Shiflett chegou com o resto dos integrantes no ônibus da banda, bateu um rango e depois saiu com a molecada e a banda para comprar bolas de futebol”, lembra Etê.
“O equipamento de som da casa não era dos melhores e os banheiros certamente não eram os mais limpos da cidade, muito pelo contrário, mas foi uma festa um tanto quanto boa e animada, como ditavam as regras da era pré-popularização da internet. Nada de smartphones, no máximo câmeras analógicas, como a que gravou o show. No palco, a banda impressionava pela coesão instrumental e despejava um caminhão de preferidas do público banhado de cerveja e suor. Rolou até cover de ‘Brown Eyed Girl’, do Van Morrison”, lembra Daniel.
“Depois do show, os caras do Lagwagon perguntaram aonde poderiam comer e indicamos o Lanchão, então eles convidaram todo mundo para ir junto de carona no ônibus comer hambúrgueres e beber cerveja. A festa continuou por lá e depois eles voltaram para o apartamento Toluca 13, que fica no Residencial Cidades do México, no Taquaral, onde dormiram espalhados pelo chão da sala, da cozinha e do corredor, como todo bom moleque festeiro dos anos 90 faria. No dia seguinte, partiram para tocar em outra cidade, onde talvez devam ter dormido em um hotel”, acrescenta Etê.
Apenas um ano depois daquele show do Lagwagon em Campinas, Chris Shiflett passaria por um processo de audição e seria escolhido para se juntar ao Foo Fighters, em 1999. Hoje, aos 52 anos de idade, o guitarrista já dedicou quase metade de sua vida à banda, que veio a se tornar uma das mais veneradas do mundo do rock.
“É bem legal ver o Chris Shiflett tocando hoje numa banda que enche estádios, com um nível gigantesco de popularidade, e saber de onde ele veio. Aliás, acredito que o segredo da coesão dos Foo Fighters seja a origem no underground, tanto do Chris Shiflett quanto do Pat Smear, que veio dos Germs, banda seminal do punk de Los Angeles, e do próprio Dave Grohl, que antes do Nirvana tocava no Scream, que chegou a dividir o palco com o Ratos de Porão na primeira tour europeia dos brasileiros em 1989, numa ocupação gerida por punks anarquistas na Alemanha. É música de gente que chegou num patamar elevado no mercado musical depois de dormir, e muito, no chão da casa de gente que tinha acabado de conhecer “, destaca Etê.