Falar em autoridade docente na Educação Infantil pode parecer um contrassenso em tempos de discursos sobre liberdade e protagonismo infantil. Mas sejamos diretos: não há educação sem autoridade. A diferença é que, hoje, ela não se impõe pela força ou pelo medo — se constrói na relação, no olhar, na escuta e na consistência ética do professor.
Autoridade não é autoritarismo. Enquanto o autoritarismo se apoia no medo e na imposição, a autoridade se sustenta no respeito, na coerência e na competência pedagógica. O professor com autoridade não manda — conduz, organiza e inspira. Sua voz tem peso porque vem acompanhada de exemplo, escuta e saber. Essa autoridade legítima garante limites, segurança e um ambiente de confiança onde o conhecimento floresce.
A autoridade verdadeira nasce do saber e da coerência. A criança confia em quem demonstra domínio do que faz e diz. O professor que conduz as rotinas com segurança e trata todos com justiça transmite estabilidade emocional. Essa confiança é o terreno fértil do aprendizado: há regras, mas também respeito; há limites, mas também escuta. É nessa fronteira que a autoridade pedagógica se afirma.
Historicamente, a Educação Infantil foi marcada por uma visão assistencialista — a “tia” que cuida, a “mãezinha” que acolhe. Essa imagem afetiva, embora importante, reduziu o reconhecimento profissional do educador. A transição da “tia” para a professora — formada, reflexiva e consciente de seu papel social — é um movimento político. Exercer autoridade, nesse contexto, é também lutar pelo reconhecimento da docência como profissão, e não como extensão do cuidado doméstico.
Ser autoridade hoje exige uma postura crítica diante do sistema. O professor que apenas cumpre protocolos não exerce autoridade, apenas obedece. Autoridade é pensar com autonomia, sustentar escolhas pedagógicas com base em princípios, não em modismos. É dizer “não” quando a rotina escolar se transforma em depósito de atividades e reafirmar que brincar é forma legítima de aprender. É resistir a práticas que infantilizam o professor e reivindicar respeito às suas decisões pedagógicas.
Na sala de aula, essa autoridade aparece em gestos concretos: organizar o tempo e o espaço, dar sentido às regras, conduzir a roda sem gritos, propor escuta e oferecer escolhas possíveis. É garantir que todos participem, mesmo quem ainda não sabe como.
Ser autoridade é ser presença firme — não rígida —, porque a infância precisa de referência, não de permissividade. Do ponto de vista institucional, a autoridade docente depende também do reconhecimento da gestão e das famílias. Quando o trabalho pedagógico é desautorizado por discursos que reduzem o professor a “babá”, a escola perde legitimidade. É preciso reafirmar o lugar do educador como intelectual da infância, alguém que planeja, observa, documenta e intervém com intencionalidade pedagógica.
No mês do dia do professor, é importante lembrar: autoridade não é dom nem privilégio. É construção cotidiana, sustentada por saber, compromisso e coragem. Celebrar o professor é reconhecer que a educação infantil começa no chão da escola, mas se eleva na voz firme e serena de quem ensina a pensar o mundo desde o berço da linguagem.
E é nesse sentido que o Plano da Primeira Infância Campineira (PIC) cumpre papel fundamental ao valorizar o professor campineiro. O PIC reconhece sua centralidade nas políticas públicas para a infância, escuta suas práticas e transforma suas experiências em base para decisões coletivas.
Desde sua implantação, mais de 60 projetos intersetoriais foram implementados, envolvendo escolas, unidades de saúde, secretarias e organizações sociais. Entre eles, destacam-se o programa Caminhos do Brincar, que promove o uso de espaços públicos como territórios educativos, e as ações conjuntas de vacinação na primeira infância, que articulam saúde e educação como dimensões inseparáveis do cuidado.
No que se refere à formação de professores, o PIC incentiva diversos projetos de aprimoramento e troca de experiências, como o Diálogos da Primeira Infância, que promove encontros entre educadores, gestores e especialistas para discutir práticas pedagógicas, políticas públicas e os desafios contemporâneos da infância. Essas ações reafirmam o compromisso do plano com uma formação continuada viva e conectada à realidade das escolas.
Mais que um instrumento de gestão, o PIC fortalece o educador como protagonista da cidade que cuida e educa desde os primeiros anos de vida. Ao incentivar práticas como a criação de parques naturalizados, o acompanhamento de famílias e a documentação pedagógica, transforma valorização em ação concreta: reconhece o professor como essencial para o desenvolvimento integral das crianças e para a consolidação de uma educação pública ética e inovadora. Valorização verdadeira não é discurso — é colocar o professor no centro da cidade que educa.
Thiago Ferrari é Coordenador do Plano da Primeira Infância Campineira
Vanessa Crecci é Professora da Rede Municipal de Campinas e Doutora em Educação pela Unicamp

 
			 
					






















