Mais que adquirir conhecimentos práticos em português ou matemática, é na escola que adolescentes e jovens têm a oportunidade de moldar a sua visão crítica sobre o mundo para ajudar a compor a sociedade do futuro. Por isso, Viviane dos Santos Dias, docente de Ciências Humanas e Sociais no Ensino Médio Técnico do Senac Campinas, acredita que, diante das crescentes denúncias de crimes de racismo e injúria racial observadas no estado de São Paulo e em todo o país, a solução está, também, na educação.
Segundo dados divulgados pelo Ministério dos Direitos Humanos, apenas em 2021, 1.016 casos de injúria racial contra pretos e pardos foram denunciados à pasta. Os estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais lideram o ranking de denúncias. Como medida de combate a essa realidade, em 2003, a lei federal nº 10.639/03, que estabelece a obrigatoriedade do ensino de “história e cultura afro-brasileira” dentro das disciplinas que compõem a grade curricular dos ensinos fundamental e médio. O objetivo é oferecer aos estudantes uma visão mais abrangente e plural sobre a nossa história e sociedade, de forma a contribuir na construção de um país comprometido com a inclusão e a diversidade.
Viviane, que também é pesquisadora em discurso sobre raça e identidade racial no Brasil, defende que pensar a história brasileira sem considerar as narrativas das populações afro-diaspóricas e indígenas, é contar a história do Brasil pela metade. Ela ressalta que é importante que esse conteúdo seja trabalhado de forma contínua e não apenas em projetos e datas simbólicas.
“Essa cultura é viva em inúmeros momentos do seu dia, seja na música que está escutando no seu celular, no seu prato de comida, ou no seu penteado e roupa, até questões mais do macro, como as violências estruturais que também atravessam o povo preto não apenas em novembro, logo, suas reflexões sobre cultura afro-brasileira também precisam ser contínuas e permanentes”, explica Dias.
A docente dá aulas para o Ensino Médio Técnico do Senac Campinas, instituição que prevê conhecimentos sobre essas narrativas em seu plano de curso como forma de atuar na construção de uma sociedade antirracista. Ela conta que, quando apresentados a esses conhecimentos, os estudantes se mostram interessados e engajados, apesar do estranhamento inicial.
“Para os alunos e alunas pretos, pardos ou indígenas, sinto que esses temas são especialmente mais ouvidos e isso pode ser notado no engajamento em sala de aula e com as atividades entregues. Já notei várias conversas pós aula, grupos de estudantes discutindo racismo, por exemplo. Também já fui procurada fora de sala de aula por alunos e alunas que trouxeram questões sobre sua identidade racial e étnica”, compartilha.
É o caso de Vinícius Machado da Silva. O estudante do 3º ano afirma que, em sua jornada escolar, ainda não havia tido contato o suficiente com o tema, mas que as aulas o fizeram se perceber como um jovem negro no mundo.
“Nas aulas de Ciências Humanas e Sociais, eu percebi que não cresci por acaso rodeado de pessoas brancas, que minha trajetória está dentro de um fator histórico, e esse fator ajuda a entender não só o meu lugar como de outras pessoas brancas que eu convivo”, conta.
Para Viviane, esse entendimento é fundamental. Ela explica que o ensino antirracista é importante não só para entendermos que há escolhas feitas no passado que interferem diretamente nas nossas vidas até os dias de hoje, como também para avançarmos nas soluções para essas questões.
“Sonho com um futuro onde pessoas pretas cresçam conhecendo as coisas que conheci nestas aulas mais cedo, porque é importante se enxergar como preto. Esses conhecimentos ampliaram minha visão, me deram autoestima, me fizeram sonhar e querer que outras pessoas também se vejam assim”, conclui Vinicius.