Os atos de violência contra crianças e adolescentes em Campinas registraram um expressivo aumento em 2024. De janeiro a maio, foram 1.291 denúncias relacionadas a agressões, segundo os dados do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania.
Esse número é 30% maior do que o notificado pelos órgãos de apoio, no mesmo período do ano passado. Os profissionais envolvidos diretamente com essas situações avaliam que a rede de proteção, como escolas, família e até a própria sociedade, tem atuado com mais veemência.
Segundo o balanço que consta no Painel de Dados da Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos, as faixas etárias mais afetadas são crianças de 0 a 9 anos.
Quando uma denúncia é feita, logo é tratada como uma suspeita e encaminhada para o Conselho Tutelar, Centro de Referência Especializado de Assistência Social (Creas) e outras organizações.
Uma ONG que atua em parceria com o município, o Centro Regional de Atenção aos Maus Tratos na Infância (CRAMI) de Campinas, também observou o aumento nos casos de violência, principalmente sexual, nos primeiros cinco meses desse ano.
De acordo com os registros da entidade, foram acolhidos 10 casos de violência sexual de janeiro a maio de 2024. No mesmo período do ano passado, foram três notificações. Além disso, Campinas testemunhou um aumento substancial nas denúncias de violência sexual em janeiro de 2024, com um total de 41 casos reportados, a maioria envolvendo crianças e adolescentes.
Para a psicóloga e coordenadora técnica do Crami, Cristiane Vidolin, esses dados destacam a urgência de uma resposta eficaz e coordenada por parte das autoridades e da sociedade, em geral para prevenir e combater a violência, especialmente contra os mais vulneráveis.
Pessoas próximas
“É alarmante observar que os agressores, na maioria dos casos, são pessoas próximas às vítimas, como membros da família, que têm a responsabilidade de cuidar delas”, avalia a psicóloga. “Apesar da mídia estar levando mais ao público essas informações, ainda assim acredito que exista uma subnotificação desses dados”, avalia. “O que mais atrapalha a denúncia do agressor doméstico é exatamente o vínculo com a vítima. Esse agressor tem uma responsabilidade com a vítima, tem um parentesco, então a criança e adolescente tem afeto, respeito, tem medo de sofrer algum tipo de retaliação”, explica Vidolin.
Traumas
As consequências desses atos são devastadoras na vida de uma criança e de um adolescente, e podem acarretar dificuldades no desenvolvimento emocional e psicossocial até a fase adulta.
Somente em 2024, o Conselho Tutelar de Campinas fez 2,2 mil atendimentos relacionados a agressão sexual. A procura pelo conselho de forma espontânea representou 661 casos. Em 627 deles o registro foi por meio de notificações. Cerca de mil casos tiveram intervenção de escolas e creches.
As vítimas de violências sexuais apresentam consequências físicas e psicológicas características, conforme a faixa etária. Em uma criança muito pequena, podem aparecer problemas relacionados ao sono, controle do esfíncter, um retrocesso no desenvolvimento, problemas na alimentação, dificuldade de interação e demonstração de receios de outros adultos.
Na fase escolar, conforme explica a psicóloga, pode haver a geração uma hipersexualidade que não corresponde à faixa etária.
“Na adolescência, também há alteração de comportamento, como a agressividade, muita exposição a situações de risco, promiscuidade, início do uso de substâncias, desinteresse acadêmico, em esportes. E na vida adulta, pode ocorrer desenvolvimento de transtornos mentais, de ansiedade, humor, depressão, abuso de substâncias”, relata.
Segundo Vidolin, o objetivo das intervenções é não somente atender as vítimas, mas também orientar e apoiar suas famílias, com o objetivo de romper o ciclo de violência. Já em casos de risco iminente, medidas de acolhimento são tomadas para garantir a segurança das vítimas e evitar uma tragédia, explicou.
“A gente primeiro deveria trabalhar mais com prevenção. Esse assunto precisa ser mais abordado nas escolas, famílias, centros de fortalecimento de vínculos, igrejas. É preciso salientar o quanto a violência sexual traz consequências danosas para toda a família”, finaliza.
Quem procurar
Em casos de urgência, quando há risco iminente à integridade e vida da criança, a Polícia Militar pode ser acionada por meio do telefone 190. Em outras situações, denúncias anônimas podem ser realizadas ao Disque-100 ou diretamente em uma unidade do Conselho Tutelar.











