Três décadas depois da implantação pioneira no País de um programa de renda mínima, Campinas volta a ter protagonismo por meio de uma política pública voltada a famílias carentes. Na manhã desta sexta-feira, o prefeito Dário Saadi (Repub) assinou projeto de lei que visa instituir o programa de Transferência de Renda Campinas.
Nos anos 90, a cidade ganhou notoriedade com um programa inédito no Brasil. Inspirado pelo então senador Eduardo Suplicy (PT), hoje deputado estadual eleito, o saudoso prefeito José Roberto Magalhães Teixeira (1937-1996) criou uma política municipal para garantir transferência de renda a famílias em situação de vulnerabilidade.
Na época, Campinas convivia com bolsões de miséria, resultado do crescimento populacional e da expansão urbana, sobretudo em áreas mais afastadas do Centro, notadamente no chamado eixo “Além da Anhanguera”. Havia fome evidente. A Pastoral da Criança, da Igreja Católica, inclusive, tinha forte atuação nas comunidades atendendo crianças com suplementos alimentares.
O programa Renda Mínima de Campinas constituiu-se, portanto, em importante apoio aos campineiros em situação de penúria.
Magalhães Teixeira sempre era lembrado por esse pioneirismo e sempre defendeu que pessoas em situação de pobreza ou pobreza extrema deveriam receber um complemento de renda para a sua dignidade. Numa época em que não havia Bolsa Família nem Auxílio Brasil.
Política pública permamente
É o que propõe agora o atual prefeito Dário Saadi, que trabalhou com “Grama”, apelido de Magalhães Teixeira, quando ainda era um jovem médico que havia acabado a residência no Hospital Municipal Dr. Mário Gatti, em urologia.
“É importante destacar que esse benefício, apresentado em forma de projeto de Lei, significa a criação de uma política pública que se consolida e torna-se política do município daqui em diante”, afirmou o prefeito Dário Saadi. A ação está no contexto da implantação de uma agenda compensatória para enfrentamento da situação de vulnerabilidade social no Município.
Para Vandecleya Moro, secretária municipal de Assistência Social, Pessoa com Deficiência e Direitos Humanos de Campinas, a iniciativa aprimora a estrutura de apoio às famílias vulneráveis.
Voltado a famílias em situação de extrema pobreza (cuja renda mensal é até R$ 105,00 per capita) e pobreza (cuja renda mensal é de R$ 105,01 a R$ 210,00 per capita), o programa Renda Campinas tem previsão, se aprovado pela Câmara de Vereadores, de atender até 25 mil famílias em 2023.
A previsão orçamentária proposta será de R$ 41 milhões. A intenção é fortalecer a renda de pessoas em situação de vulnerabilidade. O benefício irá substituir o Cartão Nutrir Emergencial Pandemia, que beneficia atualmente 19,5 mil famílias com o valor de 26 Unidades Fiscais Municipais (UFICs), que equivale a R$ 109,41.
Para receber o benefício, as famílias devem possuir renda per capita familiar de até R$ 210,00, residir em Campinas há pelo menos dois anos, estar inscritas no Cadastro Único com cadastro atualizado ou se cadastrar, se estiver dentro dos critérios. Serão priorizadas as famílias em atendimento nos Serviços do SUAS no município.
O programa terá três faixas de benefícios. Confira:
♦ Famílias chefiadas por mulheres com duas ou mais crianças de 0 a 6 anos de idade ou com pessoa idosa entre 60 e 65 anos (que ainda não recebem o Benefício de Prestação Continuada) receberão 45 UFICs (R$ 189,00).
♦ Famílias com três ou mais pessoas, com crianças de 0 a 6 anos de idade e/ou com pessoa idosa e/ou com pessoa com deficiência receberão 35 Unidades Fiscais Municipais (R$ 147,00)
♦ Famílias com pelo menos uma indicação de vulnerabilidade, independentemente do número de pessoas na composição familiar, receberão 30 Unidades Fiscais Municipais (R$ 126,00).
O programa Renda Campinas tem como propósito complementar a renda das famílias em situação de vulnerabilidade, fortalecendo outros programas e benefícios que elas também acessam, como por exemplo, : o Cartão Nutrir, os Benefícios Eventuais Municipais (BEM), o BPC e o Auxílio Brasil.
Se aprovado, o projeto terá 90 dias para ser regulamentado pelo Executivo Municipal.

Conceito na gestão de Magalhães
O Programa de Garantia de Renda Familiar Mínima foi, portanto, uma iniciativa inovadora e pioneira no campo das políticas públicas, conforme descreve estudo produzido pelo economista Arnaldo Machado de Sousa, ex-secretário de Governo da Prefeitura de Campinas, e Ana Maria Medeiros da Fonseca, pesquisadora do Núcleo de Estudos de Políticas Públicas da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
No trabalho sobre o Renda Mínima, os autores acentuam que nos anos 90 estava em debate no Congresso Nacional um modelo de apoio a família de baixa renda, que pudesse garantir a eles o direito a um complemento.
Num dos trechos do trabalho, Arnaldo e Ana Maria destacam que “a distribuição de recursos em dinheiro, visando reforçar a renda das famílias com crianças e adolescentes e comprometendo-as, sobretudo, com a manutenção de seus filhos na rede pública de ensino, revela alguns dos objetivos dos programas, como o de favorecer a escolaridade dessas crianças e adolescentes de modo a lhes garantir a possibilidade de se libertar, no futuro, das condições de pobreza; e de combater realisticamente o trabalho infantil, tornando dispensável a contribuição das crianças e adolescentes para a renda familiar”