Mais um ciclo de quimioterapia. Essa foi a prescrição médica indicada para a paciente Maria Regina, que já vivia bastante debilitada em função de um câncer metastático. Mas a não aceitação da família em seguir aquele direcionamento abriu uma nova perspectiva de enfrentamento da vida e da morte para Regina e entre as pessoas que a cercavam. O destino os levou a encontrar a ajuda de quem se dedica ao cuidado de gente. A rica experiência proveniente desse contexto originou um documentário, que tem gerado debate na comunidade médica.
Os últimos dias de vida de Maria Regina inspiraram o seu genro Thiago de Souza a produzir “Sete Manhãs”, a partir do grupo criativo “O que te assombra”, ao qual ele pertence. Trata-se de um registro a respeito do Cuidado Paliativo aplicado em experiência de campo por estudantes da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Unicamp.
Lançado no mês passado, o trabalho começou a ser pensado somente em 2018, quando Maria Regina e sua família descobriram a importância da prática, que enxerga o paciente com um outro olhar.
“Se minha sogra tivesse um atendimento convencional, muito provavelmente ela iria para o hospital, uma UTI e morreria sozinha e com sofrimento. Mas quando optamos pelo tratamento à base do Cuidado Paliativo, ela teve a oportunidade de resolver uma série de questões de ordem financeira, familiar, pessoal e morreu sem sofrimento, cercada pelas pessoas que ela amava”, conta Thiago, que fez questão de dividir a experiência.
“Quando comecei a pensar no documentário, coincidentemente a FMC estava introduzindo o Cuidado Paliativo como conteúdo obrigatório na grade curricular da graduação. Assim, conseguimos acompanhar a visita dos estagiários aos pacientes em seus domicílios, no Pronto-Socorro do Hospital de Clínicas, na enfermaria Geral de Adultos e na UTI Neonatal do CAISM (Centro Integral à Saúde da Mulher). Elas aconteceram em sete manhãs”, explica, justificando o nome do documentário.
Os depoimentos de profissionais da medicina no filme indicam uma forma de atendimento que valoriza a condição humana do paciente, seus familiares e enxerga a doença como parte do contexto de vida de uma pessoa que sofre. O médico infectologista e sanitarista Flávio Cesar de Sá acrescenta ainda em seu depoimento que o Cuidado Paliativo não se aplica somente a pacientes em estados terminais, mas também aqueles cuja expectativa de vida ainda é grande. Flávio Cesar de Sá morreu no ano passado, vítima de câncer, e foi tratado à base do método que defendia.

Para Thiago, o documentário sugere reflexão, debate e provocação. “A morte é vista como um tabu e um fenômeno pouco tratado e discutido no nosso país”, lamenta, desejando que seu trabalho possa ser o ponto de partida para uma mudança.
“Falar de nossas fragilidades é algo saudável e a morte virá para todos. A grande questão é como enfrentá-la. Fugir do debate não nos afastará da realidade.”
O trabalho já foi lançado no YouTube, redes sociais e tem despertado o interesse de associações médicas. Na quinta-feira (11), a apresentação aconteceu no SAD (Sistema de Assistência Domicilar), que contribuiu com a Unicamp durante as visitas dos estagiários.