A história contada sobre Campinas tem personagens peculiares, lugares que alimentam o espectro imaginário e lendas que despertam curiosidade. Em 250 anos, muitas foram as pessoas que passaram por essas campinas deixando marcas. Também foram muitos os acontecimentos que ajudaram a transformar o povoamento em município e depois em Metrópole. Personagens e personificações se misturam para compor o retrato multifacetário da Campinas de hoje.
Aldo Chioratto
Aldo Chioratto era escoteiro e foi incorporado pelas tropas paulistas como mensageiro. Morreu aos 9 anos, na manhã de 18 de setembro de 1932, na cidade de Campinas, durante um dos bombardeios comandado pelo major-aviador Eduardo Gomes, pelas Forças Armadas Brasileiras. Seu corpo foi sepultado no Cemitério da Saudade sem as devidas honras. Em julho de 1966, foi transladado para o Obelisco Mausoléu ao Soldado Constitucionalista de 32. Na lápide do pequeno soldado está escrito: “Escoteiro Aldo Chioratto – Paulista – Inocência, coragem e Civismo aqui repousam”.

Beco do Inferno
A Travessa de São Vicente de Paula tem apenas 60 metros de extensão e muitas histórias para contar. Localizada entre a Rua Luzitana e o Largo das Andorinhas, antigamente era ponto de prostituição em Campinas e, com o tempo, estórias sobre aparições macabras deram lugar à lenda e ao apelido de Beco do Inferno. Uma antiga comerciante, que diz ter visto uma cadeira do estabelecimento levitar, está entre os contos conhecidos do local.

Boi Falô
A Festa do Boi Falô, realizada todas as sextas-feiras santas no distrito de Barão Geraldo, mantém viva a lenda. Segundo narra a tradição, numa Sexta-feira Santa, um capataz da Fazenda Santa Genebra ordenou a um escravo que fosse buscar alguns bois no Capão do Boi. Ao chegar ao local para tocar os bois, um dos animais recusou-se a levantar, e ao ser açoitado, o boi disse: “Hoje não é dia de trabalhar! Hoje é Dia de Nosso Senhor Jesus Cristo”!”

Bob
Um simpático cão caramelo adotado por taxistas no Largo Santa Cruz ganhou o nome de Bob e virou símbolo dos cães comunitários. Em 2009, a pedido de alguns pedestres, a Secretaria de Saúde solicitou que o cão fosse removido da praça. O movimento pró-Bob conquistou os campineiros e o famoso caramelo ficou onde estava, alimentado e cuidado por muitos tutores. Bob viveu durante quase dez anos em paz no local e ganhou um bloco carnavalesco de pets com seu nome.

Bozó
Torcedor símbolo do Guarani, Bozó ficou conhecido em Campinas por andar com a camisa do Bugre pelo Centro. O apelido de José Carlos Roque de Oliveira surgiu pela semelhança com o personagem de Chico Anysio no programa City, humorístico liderado por Chico Anysio na TV Globo. O folclórico e querido bugrino, filho do saudoso sambista Juquinha, presidente da Escola Império do Samba, faleceu em 2017, aos 58 anos, de infarto.

Capela Nossa Senhora da Penha
Até a década de 1980, a antiga Capela Nossa Senhora do Fundão, atualmente chamada de Capela Nossa Senhora da Penha, era ponto de romaria em Campinas e da devoção de fiéis à espera de algum milagre. Conta a lenda que no terreno da capela foi sepultado um escravizado açoitado até a morte. Uma goiabeira nascida ao lado de seu túmulo precisou swer cortado e o tronco que restou da árvore começou a “chorar”. As “lágrimas”, que ganharam fama de curar tumores e ferimentos, secaram após um mês, mas a notícia dos milagres do templo na Rua Abolição já tinha se espalhado.

Chupa-cabra
Criatura que mistura homem e bicho – ou versão brasileira do lobisomem – o Chupa-cabra rondou o imaginário dos campineiros no final de década de 1990. Relatos se seguiram pelas áreas rurais da cidade sobre animais estranhamente mutilados durante a noite. Eram galinhas, patos e cabras eviscerados. A boataria sobre o lendário personagem deu o que falar, sobretudo no ano de 1997.

Cine Rink
Histórias sobrenaturais acompanham uma tragédia marcante de Campinas, o desabamento do teto do Cine Rink, que causou a morte de 25 pessoas no local e outras 15 posteriormente. Foram mais de 400 feridos. Inaugurado em 1878 como uma moderna casa de espetáculos, comportava 1,2 mil pessoas. O desabamento ocorreu durante uma matinê, no dia 16 de setembro de 1951. Histórias contam que pessoas que fotografaram o resgate descobriram apenas espectros quando foram revelar os filmes.
Conceição
Fanática pela Macaca e bastante querida pela torcida pontepretana, Conceição morreu em 2018, depois de uma trajetória marcante como apoiadora da Ponte Preta. São lendárias as histórias sobre ela, como a vez em que o então marido deu-lhe o ultimato para escolher entre ele e a Ponte (e ela respondeu que jamais se separaria da Ponte) ou de quando viajou no porta-malas de um carro até Bauru, nos anos de 1970, para não perder um confronto entre Ponte Preta e Noroeste.
Elesbão
A terrível trajetória de Elesbão – o escravizado que acabou morto por enforcamento em 1835, e depois decapitado –, acusado de matar um capitão, deu margem à crença de que até hoje ele é visto por almas mais sensíveis jurando inocência e clamando por justiça. Elesbão, então um adolescente, foi considerado o responsável pelo crime apesar de, até o momento da morte, ter jurado inocência. Ele foi levado da Praça Bento Quirino (onde ficava a cadeia) em um cortejo até o Largo Santa Cruz, onde a primeira forca de Campinas foi instalada.

Gilda
Geovina Ramos de Oliveira, mais conhecida como Gilda, foi uma figura excêntrica de Campinas do século passado. Também chamada de “Gilda, a louca”, intrigava os campineiros quanto ao seu passado e suas origens. A marca de Gilda era uma pele da raposa colocada sobre os ombros, fizesse frio ou calor. Diziam que a loucura de Gilda começou após ela trair o marido, um médico charmoso da cidade. Há também quem diga que a história de Gilda teve início após ela assistir ao filme “Nunca houve uma mulher como Gilda”, com Rita Hayworth, exibido em Campinas em 1947. Gilda faleceu aos 74 anos, no final da década de 1970.

Joana
Em 2022, Joana resolveu dar um rolê por Campinas que mobilizou a cidade. “Volta Joana” virou clamor dos campineiros. A fujona em questão era uma macaquinha-prego que abdicou da vida no Bosque dos Jequitibás e se aventurou pela Metrópole. Foram muitos os relatos de avistamento do animal pelo bairro Cambuí. Após 11 dias brincando de esconde-esconde com as equipes de resgate, Joana foi resgatada pelo Corpo de Bombeiros em uma agência bancária. Voltou para casa sã e salva.

Loira do banheiro
A loira do banheiro é uma das lendas urbanas mais conhecidas no Brasil. Campinas teve alguns “episódios” que resgatavam de tempos em tempos a narrativa da menina nova que aparecia vestida de branco com algodões ensanguentados no nariz. Para invocá-la, é preciso chamar três vezes por ela e apertar três vezes a descarga do banheiro. Há versões de que a lenda se baseia na morte de uma jovem em Guaratinguetá.

Mané Fala Ó
Nascido em 1931, Mané Fala Ó ganhou esse apelido pelo hábito de abordar as meninas com a frase: “menina, fala ó pra mim”. As desconhecidas que não o conheciam e tentavam fugir da abordagem eram perseguidas até responderem “ó”. Foi assim que João Lopes Camargo tornou-se figura conhecida e carismática do Centro de Campinas e da região da Vila Industrial. Era bem recebido nos estabelecimentos comerciais e, com o tempo, em vez de temor provocava simpatia. Mané morreu em 22 de dezembro de 2003, aos 72 anos de idade, vítima de atropelamento.

Maria Jandira
Maria Jandira dos Santos nasceu em Campinas em 1911, numa família tão rica quanto conservadora. Expulsa de casa ainda menor de idade por desafiar a moral católica da época, foi abrigada na pensão de Laudelina – a cafetina de um bordel localizado na Rua Visconde de Rio Branco. De beleza arrebatadora, Maria Jandira conheceu um rico construtor. Ele logo propôs casamento e Maria Jandira entregou-se ao amor. Porém, o rapaz desfez o noivado. A jovem trancou-se em seu quarto, arrumou-se com o vestido confeccionado para o casamento e ateou fogo em seu corpo. Morreu vestida de noiva, aos 23 anos. A única coisa que sobrou do incêndio foi um retrato seu, que hoje ornamenta o túmulo de número 298, na quadra 28 do Cemitério da Saudade. Virou intercessora das desilusões amorosas.

Menina fantasma da linha 253
Passeio famoso em Campinas, “O que te Assombra?” traz relatos de causos que o tempo não deixou esquecer. Um deles trata da menina fantasma na praça do Parque Via Norte, ponto final da linha de ônibus 253. Tudo começou com um motorista que diz ter visto o vulto de uma menina, às 23h50. Depois disso, outros relatos se seguiram, sempre em horários próximos à meia-noite. A história que dá base às aparições é de que uma mãe teria assassinado a própria filha, escondido o corpo dela e depois tirado a própria vida.

Mestre Tito
Não se sabe quando Mestre Tito nasceu e o falecimento é apontado para o dia 29 de janeiro de 1882. Segundo a biografa Regina Célia Lima Xavier, Tito comprou sua alforria em 1868 e assumiu o nome de Tito de Camargo Andrade – adotou o sobrenome de seus antigos senhores. Curandeiro conhecido e devoto de São Benedito, foi um dos responsáveis pela construção da Igreja em Campinas e pela fundação da irmandade de São Benedito. Ainda em vida pediu para ser enterrado no interior da Igreja, que não chegou a ver concluída, mas teve seu pedido negado pela Câmara de Vereadores.

Nelson Paviotti
O advogado Nelson Paviotti soube como poucos honrar o verde e amarelo do Brasil em ocasiões como copas do mundo e olimpíadas. Do carro às vestimentas, nem a casa onde morava, na Vila Proost de Souza, em Campinas, escapava de seu patriotismo. A bordo de seu Fusca que reproduzia a bandeira brasileira, Paviotti fazia sucesso pelas ruas de Campinas. O advogado contava que o verde e amarelo entrou de vez em sua vida em razão de uma graça recebida. No início da década de 1990, ele prometeu que se o Brasil fosse campeão da Copa – como aconteceu em 1994 – só usaria as cores da bandeira nacional.

O Politizador
O ex-vereador de Campinas Antonio Francisco dos Santos, mais conhecido como “O Politizador”, ganhou fama em Campinas por andar pelas ruas do Centro com um megafone. Fazia críticas aos governantes e à corrupção. Conseguiu ser eleito para a Câmara de Vereadores em 2009, com mais de 2 mil votos, pelo PMN. O início da fama foi com outro apelido, o de Tonhão da Rapadura, porque vendia o doce nas ruas enquanto tentava conscientizar politicamente seus clientes. O Politizador foi encontrado morto em sua casa, em 2020, aos 78 anos.
Tranca Rua das Almas
Tranca Ruas das Almas é o único lugar de devoção ao guardião erguido em um cemitério no Brasil. A entidade é considerada pelos adeptos como o “senhor dos caminhos, o orixá mensageiro e vencedor de demandas”. É no cemitério que viria sua grande força para atender aos pedidos de quem o evoca. Tranca Rua é um guardião, também responsável pela limpeza astral dos caminhos do mundo. O santuário existe no cemitério da Saudade há mais de 100 anos.
Toninho Escravo Milagreiro
Toninho era um escravizado pertencente ao Barão Geraldo de Resende, que obteve sua alforria em 1884. Os bons serviços prestados ao Barão teriam lhe dado o direito de ser enterrado ao lado do nobre. Muitos acreditam que Toninho seja milagreiro. Há quem o ligue ao surgimento da lenda do Boi Falô.
Três anjinhos
O cemitério da Saudade de Campinas tem sepulturas que simbolizam a devoção a partir de diferentes crenças, como a do Três Anjinhos. A história conta que seriam quatro crianças vítimas de um incêndio, mas que só três anjinhos decoram a lápide em virtude do machismo da época, já que a quarta criança seria uma menina, Vilma – os outros seriam Joãozinho, Sebastiãozinho e Toninho, todos milagreiros.

Túnel da Vila Industrial
Construído em 1918 como parte do projeto de instalação do Complexo Ferroviário, o túnel da Vila Industrial nasceu como um atalho entre o bairro e o Centro de Campinas. Com apenas 160 metros de cumprimento, o túnel liga a região central à Rua Lidgerwood, mas há tempos deixou de ser apenas uma passagem. Para muitos, a galeria abriga uma misteriosa aparição cuja forma se assemelha a de um homem sem rosto. O fantasma emite uma luminosidade intensa, que clareia toda a arcada de concreto da construção, quase cegando quem pretenda encará-lo.

Vado
Vado é pioneiro do teatro negro no Brasil. A peça “Navio Negreiro” foi apresentada mais de 12 mil vezes, o que garantiu ao ator o recorde no Guinness Book (Livro dos Recordes), por carreira mais longa como produtor teatral pela mesma produção. Ele já se apresentou em países das Américas, da Europa e África. A peça já foi encenada em inglês, francês, alemão, esperanto, espanhol e italiano. Na obra adaptada por ele e baseada no poema do autor baiano Castro Alves (1847-1871), Vado é precursor ao colocar os negros como heróis. Ele interpreta 16 personagens que retratam os sofrimentos dos africanos escravizados no Brasil, trazendo especialmente a força, a cultura, o legado e as conquistas dos afrodescendentes.

Viscondessa de Campinas
Maria Luzia de Sousa Aranha deu início a uma das linhagens dos barões e baronesas de Campinas, como o Marquês de Três Rios e Baronesa de Itapura. Em meados de 1800, a Viscondessa de Campinas representava a pouco usual força feminina daqueles tempos. Ela foi a segunda baronesa e primeira viscondessa de Campinas. No momento da sua morte, possuía 226 escravizados e terras que correspondiam a 1.515 alqueires (algo próximo de 36,6 quilômetros quadrados).
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