A proposta do governo do estado de reduzir o patamar de investimento na educação ganhou mais críticas dos educadores após novo caso de violência em uma escola na capital paulista, nesta segunda-feira (23), que causou a morte de uma aluna. Segundo os especialistas, o corte de verbas pode levar o sistema educacional, que já sofre com demandas não atendidas, a um retrocesso ainda maior.
“Alterar percentuais, acenar com reduções, garante o que para a educação de São Paulo?”, questiona a professora Ângela Soligo, doutora em Psicologia, pesquisadora e docente da Faculdade de Educação da Unicamp.
O veto do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) no mês passado a um Projeto de Lei (PL) aprovado na Alesp (Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo), que previa a contratação de psicólogos e assistentes sociais na rede pública também foi lembrado pela docente.
O ataque com arma de fogo nesta segunda-feira, numa unidade do bairro de Sapopemba, reforça uma triste estatística no País: 37 pessoas morreram desde 2012 em ataques registrados em colégios, segundo o movimento Avaaz, que monitora a violência nas escolas.
PEC
No último 17, dois dias depois do Dia dos Professores, o governador Tarcísio de Freitas protocolou na Alesp (Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo) uma PEC (proposta de emenda constitucional) que propõe a possibilidade de reduzir de 30% para 25% a aplicação da receita em educação.
De acordo com a PEC, o diferencial relativo a 5% seria flexibilizado e poderia ser usado também na saúde, que hoje consome 12% da arrecadação.
A medida pode tirar até R$ 9,6 bilhões do ensino básico, levando-se em conta que o PLOA (Projeto de Lei Orçamentária Anual) previsto para 2024 é de R$ 193,23 bilhões. O governo garantiu que a proposta não estabelecerá cortes nas universidades.
A Constituição Paulista de 1989 determina que 30% dos recursos sejam investidos em educação. O valor é superior ao indicado pela Constituição Federal, que prevê investimento mínimo de 25%.
Justificativas
A docente Ângela Soligo, da Unicamp, lembra que a proposta do governo acontece no momento em que a Justiça proíbe a computação dos gastos com aposentadoria dentro dos 30%. Em São Paulo, já é histórico a utilização de recursos da educação na previdência.
“Desde 2011 foi instituído o SPPREV, que retira percentuais de nossos salários para prover as aposentadorias. E depois de aposentados, continuamos pagando o SPPREV, que vem descontado em nossos holerites”, diz.
A PEC é justificada pelo governo com base nas demandas da saúde. “Há uma tendência persistente de expansão dos gastos públicos com as ações e serviços de saúde no Estado, o que pode ser explicado em razão do aumento da expectativa de vida da população e dos avanços tecnológicos, com a incorporação de novos tratamentos e medicamentos, inclusive aqueles de custo elevado no âmbito do Sistema Único de Saúde – SUS”, aponta o texto encaminhado à Alesp.
Ângela, no entanto, resume uma realidade na educação que sugere ampliação de investimentos.
“Sofremos anos com reajustes ínfimos ou inexistentes. As escolas estaduais não atendem todas aos mesmos padrões estruturais necessários ao bom funcionamento – as periféricas são as menos assistidas. O desempenho do estado em avaliações nacionais é medíocre, principalmente quando consideramos que São Paulo é o estado mais rico da nação. As universidades públicas paulistas têm tido excelente desempenho, mas às custas de acúmulo de trabalho de docentes e funcionários, e apesar de perdas decorrentes das dificuldades de expansão do quadro docente.”
Violência
Outra medida do governo que provocou críticas de educadores foi o veto ao PL que autorizava a contratação de psicólogos e assistentes sociais para escolas da rede.
O texto procurava regulamentar no estado a lei federal 13.935/2019, que atribui responsabilidade ao poder público em assegurar atendimento psicológico e socioassistencial aos alunos da rede pública de educação. Em 2019, Jair Bolsonaro vetou o projeto que originou a referida lei, porém o Congresso Nacional derrubou a decisão do então presidente.
Tarcísio justificou seu veto argumentando que sua gestão já desenvolve um programa que emprega psicólogos e assistentes sociais para atender unidades em todas as regiões do estado.
A contratação de 550 profissionais foi anunciada em março, após a morte da professora Elisabete Tenreiro durante um ataque à Escola Estadual Thomazia Montoro, na Vila Sônia.
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