O aumento da deficiência visual no mundo todo foi agravada durante a pandemia de Covid, quando muitos abandonaram tratamentos e deixaram de buscar ajuda em razão do temor do vírus. Isso explicaria o resultado de estudo publicado no The Lancet por um comitê de 74 pesquisadores de 25 países, que alerta para a perda de US$ 410,7 bilhões na produtividade mundial decorrentes deste problema de saúde.
De acordo com o oftalmologista Leôncio Queiroz Neto, do Instituto Penido Burnier, de Campinas, os olhos interferem em toda nossa saúde. “São eles que controlam a quantidade de luz que chega à glândula pineal onde são produzidos os hormônios que equilibram nosso metabolismo. Também permitem 85% de nossa interação com o meio ambiente” afirma. Por isso, salienta, a visão frequentemente é associada nas pesquisas à cognição, bem-estar emocional, psíquico e longevidade.
Para o especialista, o alto prejuízo causado pela deficiência visual está relacionado ao tamanho da população global com grande dificuldade de enxergar e sem nenhuma correção.
O último relatório da Organização Mundial da Saúde (OMS) sobre saúde ocular aponta que 1,1 bilhão das deficiências visuais estão relacionados à falta de óculos para corrigir erros de refração e presbiopia ou vista cansada que dificulta a visão de perto após os 40 anos.
Uma ação social promovida antes da pandemia pela ONG internacional, OneSight, em parceria com o hospital e a prefeitura municipal de Campinas, para distribuir 3 mil óculos a adultos, revela que 18% dos participantes engavetaram a receita de óculos prescrita em consultas realizadas pelo SUS por falta de dinheiro.
Cuidados na primeira infância
O médico ressalta que todos terão alguma doença ocular no decorrer da vida. Isso explicaria porque logo após o parto é indicado ao recém-nascido passar pelo teste do olhinho ou exame do reflexo vermelho para detectar doenças congênitas que respondem pela maior parte das perdas de visão na infância –retinopatia da prematuridade, catarata, glaucoma e câncer ou retinoblastoma que embora raro, recentemente comoveu o Brasil com o caso de Luana, filha dos jornalistas Leifer e Daiana.
“Importante alertar que em muitos bebês os olhos não dão sinais de alteração logo após o nascimento. Luana é uma prova disso” comenta. Por isso, é comum crianças que passaram pelo teste do olhinho na maternidade chegarem ao hospital com doença congênita nos olhos que não foi diagnosticada.
Para evitar complicações que podem levar à perda irreparável da visão, a recomendação do médico é repetir o exame a cada 3 meses até a idade de 3 anos quando deve ser realizado o primeiro exame oftalmológico.
Queiroz Neto ressalta que os problemas de visão mais frequentes em crianças são os erros de refração – miopia, hipermetropia e astigmatismo. A dificuldade de enxergar entre crianças é uma importante causa de desatenção na sala de aula e da queda no rendimento escolar. “Isso ficou comprovado por uma pesquisa realizada junto aos pais e professores de 36 mil crianças das escolas municipais que receberam consulta oftalmológica e óculos em uma ação social que coordenei no Instituto Penido Burnier”, aponta. A pesquisa mostra que após um ano de uso dos óculos, na opinião dos professores 50% dos estudantes tiveram melhora no rendimento escolar. Para os pais, 88% das crianças passaram a ter mais concentração e interesse pelo estudo.

Cresce incidência de miopia
O oftalmologista ressalta que de todos os erros de refração a miopia ou dificuldade de enxergar à distância é o que mais cresce, especialmente na infância. Uma evidência disso é o resultado de um levantamento do CBO (Conselho Brasileiro de Oftalmologia) com 295 oftalmologistas. Para 70% deles a miopia infantil aumentou durante a pandemia.
Uma das causas foi o excesso de celular e computador que causa um espasmo nos músculos ciliares. “Estudo que realizei com 360 crianças com idade entre 9 e 12 anos mostrou que ficavam até 6 horas/dia conectadas e apresentaram o dobro de miopia”. Outra causa foi a falta de exposição ao sol durante o confinamento.
A previsão da OMS é de que o estilo de vida atual eleve os atuais 2,6 bilhões de casos de miopia no mundo para 5 bilhões em 2050. Desses, a estimativa é de que a miopia acima de 6 graus vai atingir 1 bilhão e por isso aumentar o risco para esta parcela de descolamento de retina, catarata, glaucoma e degeneração macular, importantes causas de cegueira relacionadas à alta miopia, ressalta o especialista.