Boas perguntas, problematizações, temas interessantes e provocações podem ser o tempero para a criação de experiências de aprendizagem importantes, previstas no currículo escolar.
Lançar mão da criatividade, fazendo os estudantes se debruçarem sobre problemas engajadores e desafiadores em vez de planejar aulas com explicações longas, maçantes e teóricas, e atividades que pedem que a turma simplesmente responda o que foi exposto anteriormente, é a proposta da Rede Brasileira de Aprendizagem Criativa (RBAC).
“A Aprendizagem Criativa eleva a importância da criatividade na sala de aula, em conjunto com o protagonismo estudantil, como meio para dar margem à exploração em projetos pessoalmente relevantes. Quando integrados ao currículo, eles resultam em maior engajamento dos estudantes e na potencialização da aprendizagem”, diz Verônica Gomes dos Santos, coordenadora da área de Adoção Sistêmica da RBAC.
O ideal, considerando a abordagem da aprendizagem criativa, é planejar a aula de modo a potencializar oportunidades de criação por parte dos alunos, tendo em vista como isso poderá contribuir com o processo de aprendizagem de temas previstos no currículo.
Depois de selecionado o que os alunos precisam aprender e sabendo quais são os interesses deles, o educador define quais são os temas, os problemas, as questões relacionadas às aprendizagens que considera essenciais e que podem ser exploradas nas aulas, e quais conteúdos precisam ser ensinados.
Por fim, o professor decide como desafiar a turma – pode ser apresentando uma linguagem de programação ou um determinado recurso físico, ou ainda deixar a escolha livre, sugerindo para que explorem seu potencial, pedindo que investiguem como solucionar ou minimizar um problema da comunidade local, construindo algo que possa ser compartilhado na sociedade e se relacione com a temática estudada…
Assim, ele faz a integração curricular: usa a criatividade dos alunos – e dele mesmo – para tornar a aprendizagem e o ensino de temas como leitura e escrita e geometria, mais interessantes e engajadores.
Scratch impulsiona aprendizagem da leitura e da escrita
Luciene Mára de Lima é professora de uma turma de 4º ano na rede municipal de Jaguariúna e faz parte do Programa Escolas Criativas, promovido pela RBAC. Ela apostou na integração curricular para, junto com a turma, superar problemas de alfabetização de alguns alunos.
Depois do período de fechamento das escolas provocado pela pandemia, ela recebeu muitos alunos de 4º ano que ainda não sabiam ler e escrever como é esperado para essa fase da escolaridade.
Antes mesmo de pensar em recorrer a atividades clássicas, como ditado, escrita em duplas e leitura coletiva, Luciene se propôs a escutar os alunos para conhecer as preferências deles sobre a escola. Descobriu que gostavam do parque, da merenda, dos amigos, de jogar e brincar. E as crianças disseram ser chato terem de ficar sentadas, escrevendo, lendo.
Conhecendo o perfil da turma, a professora então decidiu levar os estudantes para o laboratório de informática da escola para apresentar a eles o Scratch, uma linguagem de programação gratuita para criar animações, jogos e histórias interativas, por meio da programação em blocos. É possível acessá-lo de forma on-line ou offline, fazendo download para o computador ou tablet.
As crianças, como Luciene previa, adoraram o Scratch e logo quiseram começar a desbravar as possibilidades. Mas para tal, era preciso saber ler. Estava dado o desafio: aprender a ler para usar o Scratch, algo que a turma tanto queria. Para apoiar os alunos, a professora sugeriu que deixassem uma aba do Google para descobrir como se escrevem algumas palavras e pesquisar em vídeos como criar o que desejassem.
Com a supervisão e orientações da parte dela e trabalho colaborativo em pares e liberdade criativa da parte dos alunos, quem ainda não estava alfabetizado passou a ler e escrever com competência e autonomia no fim do primeiro semestre. Uma dessas crianças, que no início do ano letivo tinha pouco interesse em ir à escola, passou a dizer que não poderia faltar mais às aulas e se tornou monitor de Scratch da turma. “Inseri o Scratch em minhas aulas não para ensinar linguagem de programação, mas sim para desafiar os alunos a aprenderem muitas coisas, inclusive a ler e escrever”, conta a professora.