O sábio adentrou o tribunal e sentou-se na cadeira de juiz. Todos o aguardavam, ao lado dele o réu acusado de um grave crime, do outro lado o acusador, ao fundo o escrivão. Ao iniciar a sessão, o acusador expôs os crimes gravíssimos do réu, construiu uma argumentação impecável, chegando racionalmente à seguinte conclusão: – O réu é culpado. O Sábio ouviu e respondeu: – Tem razão! O réu bradou: – Mas Senhor; vossa excelência nem sequer ouviu o meu lado! – Pois diga, a palavra é sua. O réu usou muito bem a palavra e desconstruiu cada uma das gravíssimas acusações, chegando emocionado à seguinte conclusão: – Eu sou inocente! O Sábio calmamente respondeu: – Tem razão! Nessa hora o escrivão que acompanhava a palavra de todos de perto, disse: – Com licença, vossa excelência, mas o acusador ter razão e o réu ter razão?! Assim não dá! E ao escrivão o Sábio respondeu: – Tem razão!
O que é ter razão? Eu propositalmente quis começar a coluna de hoje com esta parábola, pois achei-a oportuna para o momento em que vivemos. Esquerda, direita, vidas, economia, desemprego, negligência, lucros, eleições 2022.
Cada item exposto acima carrega em si interpretações e me pergunto: “- Thiago; será que existe uma regra ou um segredo para interpretar um fato?”. Creio que não haja um modo, um modelo a ser seguido, uma verdade, uma regra de interpretação e desconfie de quem a possua, e digo mais: desconfie de quem defenda cegamente, principalmente motivado por atributos emocionais, determinado ponto de vista. Já dizia minha saudosa vó: ‘Todo ponto de vista é a vista de um ponto’. Ando observando que construímos e habitamos numa sociedade ansiosa, não há mais quem tenha paciência pra nada que seja longo, que demande tempo, quer um exemplo? Vá até o story do seu amiguinho e veja se você prefere ler frases motivacionais curtas de uma ou duas linhas ou prefere por aqueles textos longos que se dividem em quatro ou cinco storys?! A resposta não é pra mim, mas sim pra ti.
Ansiedade custa caro, pode ser vista enquanto uma patologia em diversos graus de tratamento, desde meditação até o uso de fármacos, mas ansiedade aqui é prejudicial no sentido de não vasculhar os conteúdos de ambas as partes de modo prudente, checando se não é Fake News, se procede realmente de suas fontes, se não são recortes de conteúdos descontextualizados.
Tudo isso permite uma boa interpretação, o bom uso da faculdade da razão, intelectiva, cognitiva colocando-o na contramão da massa, que infelizmente é formada por pessoas conduzidas por poderosos tais como marionetes.
O que é ter razão em determinada situação? É vencer no grito? É ter mais pessoas defendendo seu ponto de vista? É apelar para argumentos emotivos? É apelar para ciência, economia, gatilhos mentais? Eu como professor de filosofia adoro a palavra “talvez”, ela pressupõe esse ceticismo inicial, essa prudência importante na hora de se apurar as argumentações e interpretações concebidas de um fato. Lhe peço encarecidamente que respire fundo antes de emitir qualquer tipo de juízo.
Não seja mais um, mais uma que brada, saiba dialogar, saiba expor e não impor seus argumentos; saiba defender sua causa sem colocar pessoas em risco, fuja da mídia sensacionalista, busque a verdade, talvez ela seja escorregadia e difícil de tê-la em mãos, mas se aproxime dela, não se deixe conduzir por quem tem poder ou oratória. Nem sempre é difícil escolher um lado da moeda, as vezes nem é preciso escolher, outrora faz-se necessário.
Nessa semana perdi duas pessoas extremamente próximas por conta do vírus, mas conheci famílias que estão prestes a serem despejadas por não terem dinheiro para custear o aluguel de onde moram, há quem não tenha um prato de arroz para dar aos filhos. Em ambos os lados estamos lidando com vidas, não se esqueça disso, em ambos os lados!
Seja num leito de UTI, seja numa mesa com três crianças passando fome… Repito: em ambos os casos estamos lidando com vida! A #FicaEmCasa tem razão. A #VemPraRua tem razão. Qual a sua razão partindo de suas interpretações e valores?
Thiago Pontes é filósofo e neurolinguísta (PNL)