Popular entre os jovens, os cigarros eletrônicos seguem como um desafio à fiscalização e à saúde pública em Campinas. Apesar de proibida a comercialização pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) desde 2009, dispositivos eletrônicos para fumar continuam circulando livremente.
A metrópole não tem uma legislação específica para o controle do uso desses dispositivos em espaços públicos. Já as informações sobre apreensões ou fiscalização em locais que comercializam os dispositivos também são insipientes.
Em resposta à crescente adesão, principalmente por jovens, a Secretaria de Saúde de Campinas tem intensificado ações educativas e ampliado o acesso ao tratamento gratuito por meio do Sistema Único de Saúde (SUS).
Desde o ano passado, o número de grupos de combate ao tabagismo cresceu 36,1%. Hoje, segundo a secretaria, são 49 grupos ativos nos Centros de Saúde, sendo cinco deles iniciados em 2024.
De acordo com a coordenadora da Assistência Farmacêutica, Vivian Cristina Matias de Oliveira Nunes, os dispositivos eletrônicos representam risco significativo, especialmente para quem nunca fumou cigarros comuns.
“Estudos recentes mostram que quem nunca fumou, mas usa cigarros eletrônicos, tem em média um risco 300% maior de começar a fumar e se tornar dependente da nicotina”, alerta Vivian.
Os grupos oferecem acompanhamento que varia de 12 semanas a um ano, com possibilidade de sessões virtuais. De acordo com a coordenadora, a taxa de sucesso é significativa: entre 50% e 60% dos participantes conseguem abandonar o cigarro.
Só em 2024, 1.211 pessoas deixaram o vício do cigarro comum em Campinas – aumento de 54,4% em relação a 2023, quando 784 pessoas foram atendidas com sucesso.
Os cigarros eletrônicos podem conter níveis de nicotina até seis vezes maiores do que os encontrados em quem fuma 20 cigarros convencionais por dia. A informação consta em pesquisa divulgada em novembro de 2024 pelo Instituto do Coração (InCor), da USP, em parceria com a Vigilância Sanitária do Estado de São Paulo e a FMUSP.
Segundo o Instituto Nacional de Câncer (INCA), nenhum modelo de cigarro eletrônico é considerado seguro. As substâncias presentes nesses produtos estão associadas ao desenvolvimento de câncer, doenças cardiovasculares e respiratórias.
Tabagismo e câncer
O tabagismo está relacionado a pelo menos 16 tipos de câncer, além de doenças cardíacas e pulmonares. Nos últimos seis anos, o número de brasileiros que utilizam cigarros eletrônicos saltou 600% e atingiu quase três milhões de usuários em 2024.
Tão importante quanto conscientizar sobre o vício é impedir que ele comece. Essa é a proposta da campanha “Viver sem Cigarro”, realizada pelo Centro de Oncologia Campinas junto a estudantes dos anos finais do Ensino Fundamental e do Ensino Médio.
“Nos programas contra o vício para adultos fumantes, o índice de sucesso é muito baixo. Por volta de 10% largam definitivamente o cigarro. Porém, quando esclarecemos os mais jovens sobre os males, as chances de sucesso se multiplicam. Impedir que as gerações futuras comecem a fumar se mostra como meio eficiente para combater o vício do cigarro”, explica o oncologista clínico do Centro de Oncologia Campinas, Fernando Medina.
Neste ano, a campanha será levada a pelo menos 11 instituições de ensino de Campinas.
O oncologista reforça que estudos científicos robustos demonstram que os cigarros eletrônicos não são inofensivos.
“Ao contrário, os vapores inalados contêm substâncias tóxicas e cancerígenas, incluindo nicotina, metais pesados e compostos orgânicos voláteis. A nicotina, altamente viciante, prejudica o desenvolvimento cerebral dos adolescentes e aumenta o risco de dependência de outras drogas”, salienta Medina.

Legislação
Há poucas semanas, a cidade de Limeira sancionou uma lei que proíbe oficialmente o uso do cigarro eletrônico nos lugares públicos, o que inclui praças, clubes, bares e restaurantes.
A lei garantirá fiscalização e aplicação das sanções por parte de órgãos responsáveis caso o descumprimento da lei, além de afixar em locais visíveis ao público um cartaz de conscientização sobre o risco do uso das substâncias contidas nos cigarros e a proibição da venda aos menores.
Em Campinas, no entanto a Secretaria Municipal de Justiça informou que não existe legislação local sobre o assunto.
Em 2019, o então vereador Paulo Galtério (PSB) apresentou um projeto de lei que propunha a proibição da comercialização, importação e publicidade de cigarros eletrônicos em Campinas. A proposta, no entanto, não prosperou, e desde então não há projeto semelhante em tramitação.
Fiscalização
Dados da Receita Federal mostram que de janeiro a março de 2024, foram apreendidas 1.028 unidades de cigarros eletrônicos contrabandeados na região de Campinas — número que triplica a soma de todas as apreensões feitas entre 2019 e 2023, quando foram confiscados 281 dispositivos.
A reportagem solicitou à Receita dados atualizados de 2025, mas o órgão informou que não seria possível fornecer os dados no momento.
Polícia Federal e Polícia Civil realizam constantes operações contra a comercialização desses produtos nocivos à saúde. Em Campinas, a última grande apreensão realizada pelos policiais foi de 932 cigarros eletrônicos e essências ilegais. O flagrante ocorreu na Vila Modesto Fernandes e um homem de 36 anos foi preso.
Em nota, a Guarda Municipal de Campinas informou que realizou diversas ações com o intuito de fiscalizar o cigarro eletrônico, mas não houve nenhum flagrante até o momento.











