A aprovação da chamada PEC da Blindagem pela Câmara dos Deputados na última terça-feira (16) representa a impenitência de boa parte da classe política brasileira. O texto propõe que deputados e senadores só poderão ser processados por crimes após autorização da própria Casa, em uma votação que deverá ser secreta, sem registro nominal.
A obviedade das razões da Proposta de Emenda Constitucional não passa desapercebido; ela deve emperrar o andamento de processos contra deputados e senadores em ações criminais e reduzir o equilíbrio dos Três Poderes na regulação de improbidades administrativas. A PEC da “Bandidagem” é a impunidade da corrupção e a porta aberta para o crime organizado avançar ainda mais sobre a política brasileira.
Não há qualquer benefício para a população na proposta. Ao contrário. Há, na realidade, uma afetação dos princípios da Administração Pública, como a Impessoalidade, a Moralidade, a Publicidade e até a Eficiência, considerando que a blindagem irá dificultar o trabalho do Poder Judiciário.
Como bem apontado por internautas do Hora Campinas, já há algum tempo o Congresso se comporta como um agente privado, trabalhando como protetor dos interesses pessoais em detrimento do interesse coletivo.
A hashtag #Congressoinimigodopovo não poderia ter sido melhor escolhida.
Diante do circo da PEC, muitos usuários do Instagram, que frequentam páginas de público notoriamente dividido, como G1 e UOL, se expressaram diretamente nos perfis de seus parlamentares, em descontentamento com a proposta, e argumentando ser um retrocesso, um subterfúgio para conduta criminosa e um arcabouço legal para minar a investigação de eventual presença criminosa na Casa Legislativa. A frase “Não é sobre direita ou esquerda, é sobre o povo” brilhou como nunca pelos comentários dos posts no Instagram.
Pela primeira vez em muito tempo, há um motivo para a direita e a esquerda se unirem: o combate à corrupção generalizada.
A pauta da corrupção sempre foi uma das principais bandeiras nos debates eleitorais, e seu poder de mobilização ainda é um dos mais fortes em termos de imagem política. Parlamentares se elegem desde muito antes da redemocratização com o discurso de combate à corrupção. Tanto direita quanto esquerda têm esse mantra em seus discursos eleitorais.
O alerta de usuários para a necessidade de parar de brigar por nomes, vestir camisas ou estimar pessoas públicas é uma brisa de ar fresco em meio ao culto à personalidade que inunda as redes sociais, e que distorce a visão da realidade da população.
Inevitavelmente, deputados dos dois lados tentaram construir narrativas para as suas bases, utilizando a quantidade de votos por partido para articular uma retórica contra a oposição. Não quer dizer que a disparidade não exista; ela é bem visível no placar da votação, e deve ser levada em conta, na minha opinião.
Mas lembre-se: a esquerda não vai desaparecer, nem a direita. A democracia é exatamente a conciliação de interesses, e iremos discordar na maior parte do tempo. O povo tem direito a autodeterminação e a classe política existe para representar suas vontades.
Quantas famílias a polarização política já não desintegrou? Quantas amizades não foram afetadas?
Todos nós continuaremos a brigar pelo que achamos que é o certo para o País, e esse momento de mudança de alvo no protesto popular, que se voltou para o Congresso, certamente será breve, mas devemos usar como um lembrete das oportunidades que dispomos.
Chegaremos mais longe discutindo como fazer um mundo melhor para todos, e não bancando o herói para a própria base. Usemos a PEC da Blindagem, que claramente visa um mundo pior para a maioria, como exemplo do que realmente importa. Que País desejamos para os 212 milhões de brasileiros?
Pedro Basso é graduado em Administração Pública pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), analista de mídia no Hora Campinas e músico.











