Em decisão histórica e unânime, o Conselho Universitário da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) revogou nesta terça-feira (28) o título de Doutor Honoris Causa concedido em 1973 ao ex- ministro da Educação do período da ditadura militar, coronel Jarbas Passarinho. Em 2014, a Unicamp havia tentado revogar o título, mas a proposta foi derrotada no Consu.
Ex-governador do Pará, ministro do Trabalho, da Educação, da Previdência Social e da Justiça, além de presidente do Senado Federal, Passarinho foi um dos principais símbolos do regime militar brasileiro.
“Manifesto aqui, a minha felicidade por termos recomposto a nossa vocação com a história democrática da Unicamp”, disse o reitor Antônio José de Almeida Meirelles ao final da sessão, realizada ao longo da manhã.
“Essa decisão mostra nosso compromisso com as causas civilizatórias”
“Essa decisão prova que podemos ter divergências, mas também mostra que temos o compromisso com a causa democrática; com a causa civilizatória, com a ciência e com o conhecimento”, acrescentou ele. “Isso faz parte do DNA e da história da Unicamp”, completou.
A professora Silvia Gatti – presidente da Associação dos Docentes da Unicamp (Adunicamp) – a entidade que fez o encaminhamento da proposta de revogação – chorou ao final da sessão.
“Estamos muito felizes pela universidade. Essa é a Unicamp que queremos”, disse ela, muito emocionada. “Conseguimos. Vamos em frente. Ainda há muito o que fazer pelo nosso País”, finalizou. A decisão pela revogação do título foi tomada pelos 74 membros do Conselho Universitário presentes ao encontro.
Em sua atuação como ministro de estado, Jarbas Passarinho foi signatário do Ato Institucional Número 5 – o AI-5 – editado em 13 de dezembro de 1968. Este foi o Ato mais duro do regime e concedeu amplos poderes ao Executivo para decretar Estado de Sítio e suspender os direitos políticos dos cidadãos por até dez anos.
O ato também permitiu ao presidente cassar mandatos políticos, suspender garantias constitucionais, demitir, dispensar, reformar ou transferir os servidores públicos. Por ocasião da assinatura do AI-5, Passarinho dirigiu uma frase ao então presidente Costa e Silva, que ficaria célebre.
“Sei que a Vossa Excelência repugna, como a mim e a todos os membros desse Conselho, enveredar pelo caminho da ditadura pura e simples, mas me parece que claramente é esta que está diante de nós. Às favas, senhor presidente, neste momento, todos os escrúpulos de consciência”, disse Passarinho.
O título
O título de Doutor Honoris Causa é concedido pela universidade a pessoas consideradas eminentes, que se destacaram em determinada área por sua virtude. Trata-se de um título concedido a apenas a pessoas que atingiram alto nível de reconhecimento profissional, segundo o entendimento do corpo docente da própria universidade.
A história mostrou, no entanto, que a atuação de Passarinho foi nefasta para a cultura e a educação brasileiras. Mostrou que, enquanto ministro, ele aposentou compulsoriamente pesquisadores e docentes, puniu estudantes, desmantelou o ensino público mediante a privatização de universidades e utilizou a Universidade como instrumento de perseguição.
Proposta de revogação foi assinada por 400 docentes e pesquisadores
A proposta de revogação do título levado ao Consu pela Adunicamp contava com um abaixo-assinado com 400 assinaturas – entre docentes e pesquisadores.
“A bibliografia histórico-política nos informa que Jarbas Passarinho apoiou decididamente o golpe de 1964, foi um convicto signatário do discricionário Ato Institucional 5 e destacado ideólogo da ditadura militar”, dizia o documento levado à votação
“Sob os ministérios em que atuou, teve elevada responsabilidade na aposentadoria compulsória de docentes e renomados pesquisadores de universidades públicas, em punição e prisão de estudantes e na destituição de dirigentes sindicais”, continua o documento.
“Desta forma, argumentamos que a permanência de um signatário do AI-5 entre o/as detentores desse título está em total desacordo com o projeto acadêmico de uma universidade que busca cultivar o pensamento crítico e a cultura democrática”, conclui.
Em abril deste ano, a UFRJ também revogou o título de Doutor Honoris Causa concedido a Passarinho nos anos 70 do século passado. Jarbas Passarinho morreu em 5 de junho de 2016, aos 96 anos, em Brasília, em decorrência de problemas de saúde atribuídos à idade avançada.