A segunda morte em menos de três anos na Avenida Princesa d’Oeste, em Campinas, decorrente de uma inundação previsível em épocas de chuvas, como o Verão, é mais um capítulo de uma novela de incúria e atrasos. Há pelo menos duas décadas, gestores públicos, moradores das imediações e comerciantes debatem – e esperam – uma solução definitiva para as enchentes.
O tema é antigo, mas entrou de forma prioritária na agenda da Prefeitura após uma grande inundação ocorrida em 2003, que resultou na morte de seis pessoas, das quais uma no local, um sargento do Corpo de Bombeiros que ajudou no resgate de um frentista. As outras cinco mortes naquele ano (17 de fevereiro de 2003) ocorreram no Jardim Imperador (três membros de uma mesma família), no Jardim Tamoios (uma mulher foi sugada por uma tubulação de esgoto) e no Jardim Melina (um homem arrastado pela enchente).
A morte do sargento Doacir Assis, que teve uma parada cardiorrespiratória durante o resgate do frentista Frank Medeiros, ocorreu no hospital. O frentista havia sido arrastado pela forte correnteza e ficou ilhado numa lixeira, lutando pela sobrevivência. Os resgatistas fixeram uma operação delicada para salvá-lo. Ele foi içado com a ajuda de um helicóptero e aquela imagem correu o País e selou definitivamente a Princesa d’Oeste como um problema grave de solução urbana. Na época, o PT estava no comando da Prefeitura, com a prefeita Izalene Tiene, que havia substituído no cargo Antônio da Costa Santos (PT), assassinado em 10 de setembro de 2001, na Avenida Mackenzie.
Macrodrenagem
Uma intervenção que poderia resolver as enchentes numa das áreas mais valorizadas do Centro expandido, com um corredor comercial e residencial importante, seria uma obra de macrodrenagem na Princesa d’Oeste. Ao longo dos anos sucessivos a essa enchente de 2003, o governo Hélio de Oliveira Santos (PDT) investiu em obras de adequação viária e canalização do córrego, reduzindo o problema, mas não solucionando-o.
Além da Princesa d’Oeste, as avenidas Orosimbo Maia e Norte-Sul, que ganhou um piscinão na Administração Magalhães Teixeira/Edivaldo Orsi (PSDB), sempre foram pontos cruciais em época de chuvas.
Na gestão de Hélio, a Prefeitura informava que agia “de forma preventiva e efetiva em diversas regiões” para a prevenção de enchentes. As ações pontuais incluíam limpeza dos córregos, uma obra que também ficou conhecida como “piscinão” no final da Norte-Sul e a remoção de famílias moradoras em áreas de risco e encaminhadas para o Programa Minha Casa, Minha Vida. Era um momento de verbas federais mais robustas, e a proximidade de Hélio com o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) favoreceu a liberação de recursos.
Na ocasião, o governo Hélio garantiu ter investido R$ 23 milhões em obras concluídas entre 2006 e 2008, na Avenida Princesa D’Oeste/Vila Lemos, em obras de drenagem no Parque Jambeiro, contenção das margens do afluente do córrego do Friburgo, no bairro Vida Nova, contenção nas margens do córrego dos Patos (Avenida Tancredo Neves) e canalização do córrego do Asilo, entre outros.
Governo Jonas Donizette
O tema da Princesa d’Oeste voltou a ganhar força no governo de Jonas Donizette (PSB), com a definição de estudos técnicos de viabilidade e estimativa de custo da obra. Uma das notas emitidas pela gestão, porém, indicava a dificuldade de viabilização de recursos.
“Essas intervenções demandam grande investimento e a Administração Municipal tem tentado captar os recursos necessários junto aos governos estadual e federal, o que ainda não foi viabilizado em razão da forte crise econômica que atinge o Brasil há pelo menos cinco anos”, dizia trecho da nota.
Para amenizar os riscos de inundações em Campinas, o governo Jonas manteve a política de limpeza e manutenção dos córregos, inclusive do piscinão da Norte-Sul, no qual desemboca o córrego Serafim. O reservatório, que tem 90m², passou por desassoreamento em agosto de 2018, informava a Prefeitura na época. “A ação permitiu aumentar a capacidade de contenção de água de 130 mil para 270 mil litros, fundamental em períodos de chuva”, mencionava.
Outras tragédias
Não é a primeira vez que mortes ocorrem na Avenida Princesa d’Oeste em decorrência das chuvas. No dia 24 de janeiro de 2019, um motociclista de 41 anos morreu durante as fortes chuvas que atingiram Campinas. Ele caiu da moto, foi arrastado pela enxurrada, ficou preso debaixo das águas e se afogou, no Jardim Proença.
A morte aconteceu na Avenida Princesa D’Oeste, em frente à padaria Piracam. Populares que viram a moto passando sozinha acionaram o Corpo de Bombeiros. Socorristas ainda tentaram reanimar o homem.
No dia 17 de fevereiro de 2003 choveu 140mm em Campinas, um índice muito acima da média, superando todos os recordes históricos para o mês de fevereiro, desde que existe a medição pluviométrica local, há 120 anos. Na ocasião, seis pessoas morreram na cidade, das quais uma na Avenida Princesa d’Oeste. Naquele dia, vítimas chegaram a ser içadas por socorristas de helicóptero.
Resgate dramático
Os minutos que se seguiram à percepção de que a mulher estava debaixo do carro nesta sexta-feira (31) foram dramáticos. Vídeo exibido pelo programa Brasil Urgente, da Band, mostra um homem tentando socorrê-la. Mas não consegue removê-la, mesmo fazendo bastante força. Em seguida, várias pessoas se aproximam, provavelmente moradores de edifícios próximos. É possível ver também um motoboy, que parou para ajudar.
A enxurrada seguia com força. Um grupo começa a balançar o carro para retirar a vítima e só aí é possível retirá-la. Ela está desacordada. Imediatamente, socorristas do Samu e dos Bombeiros começam a tentar a reanimação cardiorrespiratória. A mulher é socorrida para um hospital, mas mesmo assim não resistiu.
Agora, o tema da Princesa d’Oeste está com o governo de Dário Saadi (Repub).