Temos visto e assistido com alguma preocupação as notícias relacionadas a introdução no Brasil de mais uma doença infecciosa de causa viral denominada “monkeypox”. Foi inicialmente chamada de “varíola dos macacos”, mas esta denominação deve ser evitada pois carrega a ideia de que os primatas não humanos são causa desta transmissão e disseminação da doença.
Assistimos o quanto isto foi ruim aos macacos quando do surto da febre amarela há alguns anos e quando vimos com tristeza alguns deles serem alvos de violência e morte. Infelizmente, os macacos também foram vítimas desta arbovirose silvestre.
A monkeypox é uma zoonose (doenças transmitidas por animais) endêmica na África Central e Ocidental e mais concentrada na República Democrática do Congo.
Embora tenha sido identificada por acaso primeiramente (década de 1950) em macacos de experimentação, os dados disponíveis no momento sugerem que a transmissão ocorre a partir de roedores infectados e que talvez estes roedores sejam os seus reservatórios naturais.
A transmissão desta doença de humanos para humanos já foi reportada em regiões da bacia do Congo na África Central. Esta transmissão parece ocorrer em cerca de 30% dos casos e durante o contato muito próximo com a pessoa infectada através, possivelmente, de fluidos corporais.
Pequenos focos de casos foram relatados desde os anos 2000 nos Estados Unidos da América e em viajantes de vários continentes que estiveram na África anteriormente ao diagnóstico. Entretanto, neste ano de 2022, o número de casos aumentou de maneira preocupante principalmente nos países não endêmicos europeus (com grande número na Inglaterra), mas também em países das Américas, incluindo o Brasil, e Oceania. Existem dois clones virais distintos de gravidades diversas: o clone da África Ocidental, menos grave e com taxas de mortalidade inferior a 1% e da África Central, mais grave, com taxas de letalidade de até 11% em crianças não vacinadas.
A monkeypox é uma zoonose evitável por vacinas. Como o vírus monkeypox é intimamente relacionado ao vírus que causa a varíola (smallpox), as vacinas utilizadas para a varíola também podem proteger contra a monkeypox.
Dados relatados da África, sugerem que a vacina contra a varíola é, pelo menos, 85% eficaz na prevenção da monkeypox, é claro, quando administrada antes da exposição. O Brasil é um país livre da varíola há várias décadas (desde 1973) e isto se deveu a utilização em massa da vacina. Em 1980, a utilização da vacina no Brasil cessou devida a erradicação da doença no mundo. Assim crianças nascidas a partir de 1980 no Brasil não foram imunizadas contra a varíola. O efeito protetor da vacina para varíola é longo, mas, provavelmente, neste momento, a maioria de nossa população deve estar susceptível à varíola.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) orienta que, independentemente do fornecimento da vacina, a vacinação em massa não é necessária nem recomendada para a monkeypox. A disseminação de pessoa para pessoa pode ser controlada pela descoberta e diagnóstico precoce dos casos, com o isolamento e o rastreamento de contatos.
Todas as decisões sobre imunização com vacinas contra Monkeypox devem ser baseadas em uma avaliação de riscos e de benefícios, caso a caso e por especialistas neste assunto. A profilaxia com vacinas antes da exposição ao vírus é recomendada apenas para profissionais de saúde com alto risco de exposição, pessoal de laboratório que trabalha com o vírus, pessoal de laboratório clínico que realiza testes de diagnóstico para varíola e membros da equipe de resposta, dentro do sistema de saúde.
Importante salientar que além de não ser necessária a vacinação em massa, a disponibilidade de vacinas no mundo é, no momento, muito pequena e os custos desta vacina, também neste momento, é muito alto, podendo chegar a U$100 por aplicação, sendo necessária duas aplicações por pessoa imunizada. Assim, as vacinas devem ser reservadas para situações em que sejam realmente necessárias.
Outro dado muito importante e que deve ser de conhecimento público, é que todos os casos, até o momento, tiveram boa evolução e têm sido acompanhados, rigorosamente, pelas vigilâncias epidemiológicas dos respectivos municípios com o apoio dos Estados e do Ministério da Saúde.
Importante reforçar as medidas de prevenção: 1- evitar o contato próximo e/ou íntimo com pessoas potencialmente, doentes; 2- evitar o contato com qualquer material tais como roupas de cama, toalhas, roupas pessoais etc. de pessoa doente e; 3- higienização constante das mãos com água e sabão bem como a utilização do álcool em gel.
É claro que estaremos, como profissionais e gestores de saúde, atentos a todos os movimentos epidemiológicos desta nova doença. Mas, diferentemente do que vivemos na pandemia do SarsCov2/Covid-19, não há motivo para pânico ou maiores preocupações por parte da população. As comunicações de risco sobre esta doença serão feitas regularmente. Caso haja alguma modificação destas orientações, a população, através dos meios seguros e corretos de comunicação, será informada.
Carmino Antonio De Souza é professor titular da Unicamp. Foi secretário de saúde do estado de São Paulo na década de 1990 (1993-1994) e da cidade de Campinas entre 2013 e 2020.