Estava lendo o impressionante livro “Democracia na Prática: por um Brasil Melhor”, escrito por um sensível General Carlos Alberto dos Santos Cruz, engenheiro e militar reformado, em uma dessas lojas de café franqueadas de um shopping, na cidade de Campinas, quando uma confusão entre jovens visivelmente alcoolizados se instaurou na frente do estabelecimento.
Cerca de dez jovens se envolveram em uma pancadaria generalizada até que dois seguranças conseguiram conter a confusão. A atendente da cafeteria que se chamava Rosália, uma sorridente nordestina de Fortaleza, ao ver jovens com os rostos ensanguentados, imediatamente ofereceu-lhes sacolas com gelo. Rosália não quis saber sobre o quê ou o porquê da confusão, ela simplesmente fez o que era necessário naquele momento. Os jovens inimigos sensibilizados pela atitude de Rosália, mostraram-se agradecidos e seguiram em direções opostas acudidos pelo altruísmo daquela mulher.
No livro, General Santos Cruz incisivamente crítica a polarização que vivemos nos últimos anos em nosso país. Destacando os danos do populismo irracional no qual continuamos imersos, seja em torno de A ou B, ou melhor dizendo, no nosso caso L ou B.
Observando a atitude de Rosália e as posições do General, fica claro que precisamos que brasileiros movidos por uma compaixão – característica de nosso sincrético cristianismo – tenham cada vez mais visibilidade, pois são eles que estão fazendo o que é necessário para além de posturas polarizadas.
Santos Cruz tem defendido que a melhor saída para o Brasil é a institucional, isto significa dizer que para além de posturas populistas, precisamos de pessoas competentes abertas ao diálogo com diferentes setores, atenta as mazelas sociais, ocupando espaços estratégicos nas mais diversas instituições. Para isso faz-se necessário que pessoas competentes estejam presentes nos mais diversos espaços. Mas o que é um sujeito competente em uma instituição pública?
Um sujeito competente possui habilidades, isto é, técnicas adequadas ao seu exercício profissional, bem como conhecimentos e um forte compromisso social com a posição que ocupa. Mas será que os concursos tão concorridos avaliam estas competências? Será que avaliam a deontologia, isto é, o compromisso ético de cada um com a posição pública que ocupa?
Até quando vamos tolerar que parte dos nossos juízes e promotores – muito bem remunerados em se tratando de Brasil – iniciem o expediente de trabalho após o almoço? Isto para dizer o mínimo das benesses de uma casta profissional praticamente intocável. Sabemos que a maioria da população cumpre uma jornada exaustiva de trabalho, como a nossa protagonista Rosália, agravada pelo ineficiente transporte público.
As injustiças sociais são muitas, no caso de juízes e promotores, o problema não são os salários, mas a falta de bom senso com o dinheiro público. Não são eles que adoram um mérito? Gabando-se dos concursos dificílimos pelos quais passaram? Por que não os remunerar com base no desempenho? Tenho certeza de que boa parte dos juízes e promotores, aqueles que são comprometidos e competentes, assumiriam o risco, topariam trocar a estabilidade pelo desafio de apresentar resultados.
Como o General destaca, a saída é institucional. Precisamos que pessoas competentes que lidem com a contradição assumam o risco e ocupem posições estratégicas. Deixando de lado campanhas populistas e visões polarizadas tão ineficientes nos últimos anos em torno de B ou L.
Deixemos nossas mãos livres para o trabalho que nos compete, ao invés, do vazio de símbolos de arminhas ou do L. Precisamos de mais Rosálias, pessoas que fazem o que é necessário com compaixão. Diga-se de passagem, é óbvio que Rosália precisa ter mais visibilidade e ser mais
bem remunerada.
Quanto ao Brasil? Talvez, a saída comece na conexão da postura de uma trabalhadora nordestina com as ideias democráticas de um general sulista. E os folgados? Não precisamos deles, tão pouco daqueles que não gostam do tão humano contraditório e que ocupam, ou querem tomar, os espaços públicos!
Abaixo sobretudo aos preguiçosos esnobes! Viva aos que estão fazendo o necessário!
Vanessa Crecci é professora da Rede Municipal de Campinas e Doutora em Educação











