“Faz da tua casa uma festa! Ouve música, canta, dança…Faz da tua casa um templo! Reza, ora, medita, pede, agradece…Faz da tua casa uma escola! Lê, escreve, desenha, pinta, estuda, aprende, ensina… Faz da tua casa uma loja! Limpa, arruma, organiza, decora, muda de lugar, separa para doar… Faz da tua casa um restaurante! Cozinha, prova, cria, cultiva, planta…Enfim, faz da tua casa um local criativo de amor.”
Neneca Parreira
Empresto os versos de Neneca Parreira para lembrar que a casa de cada um de nós tem tudo o que é essencial e isso ficou mais evidente durante a pandemia. Acolhedora, a morada abraça quem a habita e ganha nuances diferentes nessa fase de isolamento social, tanto que passou a ser olhada de pertinho e com rigor por especialistas do setor. Eles já apontam tendências para as residências que vão surgir depois que o coronavírus for embora, e tomara que seja logo.
Cuidados que antes passavam despercebidos e que não faziam parte da rotina, como trocar o calçado usado para caminhar nas ruas por um par de chinelos ao abrir a porta de entrada da casa, começaram a fazer parte dessa nova realidade. E é muito provável que, com o passar do tempo, essas mudanças deixem de ser apenas comportamentais e comecem a se refletir em outras áreas, como na arquitetura e decoração, segundo informações da Simonetto Móveis Planejados.
A empresa saiu na frente e, nas redes sociais, destaca que, as casas modernas, com janelas e entradas de ar em todos os cômodos, como as que estamos acostumados a ver hoje, só se tornaram padrão depois de grandes epidemias, como as da gripe espanhola e da tuberculose. Antes disso, era muito comum a existência de quartos sem janelas. Quando foi constatado que esse tipo de local aumentava as chances de propagação de doenças, os cômodos passaram a ser proibidos.
Foi por volta do século 19 que as pessoas entenderam que a contaminação estava intrinsecamente associada a hábitos de higiene. Outras mudanças, como a instalação de azulejos para facilitar a limpeza da cozinha, começaram a ser levadas em conta.
Refletindo sobre o assunto, já podemos começar a nos questionar sobre quais serão as possíveis modificações que poderemos observar nas residências depois da Covid-19. A Simonetto indica possíveis tendências para o período pós-coronavírus, entre elas:
– Móvel para guardar sapatos nas entradas das casas. Muito comum na decoração de residências em países asiáticos, a presença de uma sapateira ou móvel para guardar os sapatos dos visitantes antes de entrarem em casa pode ser uma das tendências no pós-coronavirus. Além de higiênico, é uma forma de deixar as energias ruins fora do lar, segundo a tradição oriental.
– Outra tendência possível é a da instalação de lavabos, para facilitar a higienização das mãos logo quando as pessoas entrarem em casa.
– Mais entradas de sol e janelas. Como já foi comprovado, manter a casa arejada ajuda a evitar a proliferação de vírus e bactérias. Por isso, é muito importante que todos os cômodos tenham janelas ou entradas de ar.
– Cantinho das atividades físicas. Sempre em pauta, a importância dos exercícios físicos ficou ainda mais evidente com o coronavírus. Exercitar-se é superimportante para o condicionamento físico e a manutenção da imunidade. É por isso que separar um espaço especial para a prática deve se tornar recorrente nos projetos residenciais daqui para frente.
– Trabalhar em casa, que já era realidade para algumas pessoas, pegou outras desprevenidas e essas se viram obrigadas a criar um espaço de trabalho em casa de um dia para o outro. Momentos como esse em que vivemos mostram a importância de ter um local dedicado ao trabalho e estudo dentro de casa. É provável que as pessoas busquem cada vez mais projetos de home office, para otimizar o espaço e ter um local confortável e funcional.
De Campinas, a arquiteta Elaine Carvalho confirma as tendências e diz que “a pandemia fez e está fazendo todos repensarem a nossa relação com o lugar onde vivemos”.
Segundo ela, “passamos a dar muito valor ao lar e e acho que algumas mudanças vieram para ficar, sendo que as mais pedidas são uma espaço totalmente reservado ao home office, espaços de higienização, plantas dentro de casa e hortinhas, mesmo nos apartamentos”.
Há, de acordo com a profissional, uma grande preocupação com a incidência de luz natural nos lares, simplicidade nas escolhas de materiais, tudo com muita praticidade para o dia a dia, facilidade de organização e limpeza.
Muitas pessoas buscaram novos projetos durante a pandemia, “algumas procurando adaptar o home office, outras querendo melhorar a decoração”, como lembra Elaine. O escritório estava em home office, por isso a arquiteta e a sua equipe tocaram os projetos e orçamentos por meio de reuniões virtuais. Tudo em ritmo mais lento, mas deu certo.
Escolha onde vai ficar
“Esqueça a ideia de que sala é para receber, quarto é para dormir e escritório é para trabalhar. Pensar em cômodos a partir das atividades que são realizadas neles será uma tendência da arquitetura pós-pandemia. O quarto pode também receber um espaço para o home office, a varanda se transformar em um espaço fitness e o escritório ser também o seu cantinho para relaxar. Para isso, espere por móveis multifuncionais, portas deslizantes e iluminação versátil para atender todas estas demandas”.
As tendências são antecipadas pela Líder Interiores, que dá outra dica: “Além de um espaço para relaxar, os especialistas apostam no cultivo de temperos e até verduras e legumes em casa. Há também a incorporação do urban jungle, que deixa de ser uma tendência e passa a ser realidade. Então, prepare-se para escolher não só móveis e adornos para casa, mas também plantas”.
Espaços funcionais
Head de marketing da Yuca, empresa de tecnologia que tem como missão ajudar pessoas a viverem melhor em São Paulo, Ricardo Tenório destaca pontos importantes no pós-pandemia:
– Se antes o hall de entrada era pensado pra causar um impacto estético, agora os aparadores são usados para deixar o álcool gel ao alcance, enquanto cabides foram providenciados para pendurar as roupas.
– Engana-se quem pensa que o fato de concentrar várias atividades em casa fará com que as pessoas acumulem mais objetos. A tendência é justamente oposta: deve haver uma baixa nas compras de enfeites e outros artigos que não tenham uma utilidade prática, exatamente para facilitar a limpeza e a manutenção da residência.
– Outro ponto importante é que os tempos de pandemia mostram a incerteza e a tensão do mundo, um cenário em que as pessoas precisam repensar os seus padrões de consumo. As casas e os apartamentos terão menos objetos e elementos. No entanto, esses itens terão mais significado para os moradores, estarão ligados às suas histórias e vão refletir a sua personalidade.
– Andando na contramão ao crescimento da tecnologia, há uma busca por residências mais aconchegantes e que tragam uma sensação de acolhimento e conforto aos moradores. Isso se traduz nos materiais usados nos projetos internos, como linho e algodão.
– Nos banheiros, há uma provável preferência por revestimentos que facilitem a limpeza e tornem a rotina mais simples e prática. De quebra, sobra mais tempo para as demais atividades: estudo, trabalho, cuidados com a saúde, lazer e convivência com a família.
– As casas do futuro devem ser mais práticas, acolhedoras e confortáveis. Com isso, o morador não vai precisar perder horas na limpeza.
Já que comecei este texto de Neneca Parreira, encerro com Adélia Prado:
“Uma ocasião, meu pai pintou a casa toda de alaranjado brilhante. Por muito tempo moramos numa casa, como ele mesmo dizia, constantemente amanhecendo”.
Janete Trevisani é jornalista – [email protected]