Como em todo Brasil, os efeitos adversos gerados pela pandemia de coronavírus afetaram diretamente o comércio varejista de Campinas e região, que atravessou um difícil ano desde o anúncio do primeiro caso de Covid-19 no País. As perdas em termos econômicos já chegam a um acumulado de R$ 5,2 bilhões durante a pandemia. Com a adoção das medidas sanitárias e o aumento das restrições, os empresários do setor tiveram que buscar se adaptar a uma nova realidade, onde e-commerce, drive-thru e delivery são palavras que podem representar a sobrevivência do negócio. O Hora Campinas conversou com Camila Oliveira, gerente de Marketing e de Relacionamento da Associação Comercial e Industrial de Campinas (Acic), que analisou os números do setor e esboçou um panorama da preocupante situação. “Para enfrentar o novo cenário demandando pela pandemia, o comércio de Campinas precisou se reinventar”, ressalta a executiva. Confira a entrevista:
Hora Campinas – O comércio de Campinas fechou fevereiro com perdas de quase R$ 50 milhões. Com a adoção da atual Fase Emergencial a expectativa é de que esses prejuízos aumentem ainda mais?
Camila Oliveira – Nos 13 dias da Fase Vermelha, agora em março, o faturamento nominal do comércio ficou em R$ 312 milhões, uma queda de 50% em relação ao mesmo período de um mês normal, pré-pandemia, quando o faturamento seria de R$ 625 milhões, o equivalente a R$ 48 mil por dia. Com base nessa avaliação, a projeção para o mês de março deste ano, com as fases Vermelha e Emergencial, é de, aproximadamente, R$ 720 milhões, que representam 50% do verificado antes da pandemia (R$ 1,400 milhão). A avaliação mensal do comércio será fechada somente após o dia 31.
HC- E no período todo da pandemia, há um levantamento que indique o montante total que o comércio de Campinas e região perdeu em vendas/faturamento com o impacto do coronavírus?
Camila Oliveira – As reduções das vendas em Campinas em fevereiro (4,87%) e janeiro (3,90%) representam a perda de R$ 219,6 milhões apenas este ano. Somada à perda de R$ 5,048 bilhões no acumulado de janeiro a dezembro de 2020, o prejuízo do comércio varejista da região acumula R$ 5,268 bilhões durante a pandemia. O e-commerce expandiu 20% em fevereiro de 2021. O ticket médio das vendas on-line cresceu 20%, passando de R$ 136,20 para R$ 163,40. O faturamento do comércio varejista de Campinas foi de R$ 975,8 milhões em fevereiro de 2021, e representa uma redução de 4,87% (R$ 49,9 milhões) em relação ao mesmo mês de 2020, quando o comércio faturou R$ 1,025 milhão, e de 6,54%, quando comparado a janeiro deste. Na Região Metropolitana de Campinas (RMC) o percentual de queda no faturamento foi semelhante (-4,86%) na comparação entre fevereiro de 2020 (R$ 2,442 milhões) e 2021 (R$ 2,323 milhões). A inadimplência, entre janeiro e fevereiro de 2021, expandiu 34,49%, considerando o aumento de registros inseridos e a queda dos excluídos, conforme dados da Boa Vista (SCPC-ACIC). Na RMC, foram 54.885 carnês/boletos não pagos em fevereiro de 2021, correspondendo a R$ 39,5 milhões o total do endividamento.
HC – A Federação das Associações Comerciais de São Paulo divulgou um manifesto de apoio aos governantes e em favor da vacinação em larga escala. As entidades do setor do comércio entendem que a retomada econômica depende dessa medida?
Camila Oliveira – Sim, a Acici considera que a vacinação em massa, planejada e com a celeridade que o País precisa, é a única forma para a preservação da saúde, dos negócios e do emprego do brasileiro.
Hoje, a vida das pessoas, das empresas e do emprego depende da vacinação e também do comprometimento de toda população para com os protocolos sanitários.
Assim como outras associações comerciais e demais representantes da sociedade civil organizada, a Acic, no entanto, reitera a posição da Facesp de que é indispensável que o apoio das diferentes esferas do Poder Público, para a preservação das empresas e do emprego e, principalmente, para a subsistência da população menos favorecida, tais como a postergação de cobrança de impostos, o parcelamento de débitos e maior prazo para a sua quitação. É imprescindível um olhar, em especial para as MPEs, que respondem por 90% da geração de empregos no Brasil. Muitos dos pleitos da Facesp e das demais entidades representativas dos setores produtivos com vistas a abrandar os impactos econômicos da pandemia, em especial para as micro e pequenas empresas e microempreendedores individuais (MEI), foram acatadas, como, por exemplo, a prorrogação do prazo para pagamento dos tributos no âmbito do Simples Nacional (federais, estaduais e municipais), anunciada pelo Comitê Gestor do Simples Nacional (CGSN) no último dia 25 de março.
HC- Em termos de vagas de empregos formais, qual foi o impacto nas empresas do setor até aqui? Os donos de comércio têm conseguido manter seus funcionários apesar da severa crise?
Camila Oliveira – A Região Metropolitana de Campinas (RMC) registrou saldo positivo de 4.572 postos de trabalhos gerados em janeiro de 2021, resultante de 36.806 admissões e de 32.288 demissões no primeiro mês do ano. Esse é o levantamento mais recente divulgado pelo Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) e avaliado pelo Departamento de Economia da Acic.
No entanto, na análise dos últimos 12 meses, constata-se a eliminação, na região, de 3.283 vagas, considerando as 359.872 admissões e as 363.165 demissões.
Dos 20 municípios que integram a RMC, quatro apresentaram resultados negativos na avaliação da geração de empregos com carteira assinada: Engenheiro Coelho, Holambra, Jaguariúna e Santo Antônio de Posse. Em Campinas foram abertas, em janeiro de 2021, 1.430 vagas de trabalho com carteira assinada, resultante da diferença entre as 15.061 admissões e as 13.631 demissões. Na comparação dos últimos 12 meses, no entanto, a eliminação das vagas na cidade soma 5.702: foram 144.602 admissões contra 150.304 demissões. Os serviços, a indústria e o comércio foram os que mais contrataram, registrando 990 trabalhadores das 1.430 novas vagas no primeiro mês do ano. Vale lembrar que, em janeiro de 2021, não sofremos a influência da Fase Emergencial do Plano São Paulo de controle da Covid-19. Acreditamos em um grande impacto a partir dessa decretação das medidas mais restritivas.
HC- Com relação ao porte das empresas, é possível avaliar quais delas estão sofrendo mais o impacto da crise gerada pelo coronavírus? E quais setores estão enfrentando mais problemas?
Camila Oliveira – De maneira geral, os setores de Serviços, como turismo, eventos, esportes, estética, bares e restaurantes, entre outros, que exigem maior contato físico, foram os mais afetados. De acordo com a Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), entre março e agosto de 2020, 49,9 mil empresas de serviços turísticos fecharam as portas no Brasil. Em Campinas, na categoria “serviços”, os setores de turismo e transportes sofreram queda de 11,40% e os bares e restaurantes caíram 13,15% em fevereiro deste ano. Na categoria de “bens não duráveis” os postos de gasolina sofreram redução de 9,55% no mesmo mês, enquanto, na categoria “bens duráveis”, o setor de vestuário teve as vendas reduzidas em 7,20% no mesmo período.
HC- A pandemia completou um ano desde o relato do primeiro caso de Covid-19. Em termos de estratégia de negócio, o comércio da cidade está se adaptando (se estruturando) a essa nova realidade, buscando novos canais de vendas, como ampliação da participação do e-commerce, drive-thru e delivery? Qual a percepção da Acic em relação a essa realidade?
Camila Oliveira – Estamos percebendo um empenho intenso por parte dos empresários em adaptar os negócios por meio do crescimento do número de empresários que passaram a acompanhar mais assiduamente os nossos conteúdos para aprender ou se adaptar à nova realidade. O fato é que cada fechamento de negócios impacta significativamente nos resultados das empresas. Assim, mesmo aquelas que têm uma operação de vendas on-line implementada sofrem com a diminuição no faturamento. As lojas que ainda não têm ou estão implementando um processo de vendas a distância precisam enfrentar a queda na receita e, ao mesmo tempo, adaptar suas operações a uma nova realidade de comércio. Percebemos que esse é um grande desafio, especialmente para os pequenos negócios.
HC- Quais ações a Acic têm adotado para auxiliar as empresas neste momento?
Camila Oliveira – A Acic tem atuado em várias frentes para ajudar os empresários a vencer obstáculos. Com relação ao crédito, temos o AC Crédito, cujo objetivo é ajudar aquelas empresas que precisam do capital nesse momento. Trata-se de um crédito pré-aprovado que pode ser contratado on-line e o dinheiro já cai na conta rapidamente, sem burocracia. A Acic também está trabalhando intensamente para qualificar e preparar os empresários para as vendas on-line. Sabemos que, apesar do crescimento do e-commerce, em 2020, essa modalidade ainda representa cerca de 10% do total das vendas do comércio. No entanto, os negócios “híbridos” – físicos e digitais – constituem uma tendência sem volta. Em 2020, foram mais de 100 horas de conteúdo gratuito para preparar as empresas para venderem pelo digital. Do ponto de vista da transformação digital nas empresas, a Acic percebeu que muitas ainda não estavam no universo on-line. Então, a entidade contribuiu para que fizessem a sua transformação digital e as aproximou de tecnologias gratuitas para a gestão dos negócios, como a MarketUp, uma plataforma gratuita de ERP (sistema integrado de gestão empresarial) que permite toda a gestão do negócio na nuvem, fundamental para os momentos em que as empresas ficam fechadas. Além disso, a Loja Integrada foi mais uma parceria oferecida para digitalizar os negócios. As medidas sanitárias no varejo têm tido um papel de destaque. Desta forma, é preciso observar todos os pontos de contato do cliente, desde o momento em que ele entra na loja, até o pagamento, entrega, embalagens etc. Justamente por isso, a Acic implementou a Loja Mais segura, um protocolo digital que permite ao lojista fazer um check up do seu negócio e entender quais procedimentos precisa mudar no seu modo de atender para que as vendas na loja física aconteçam seguindo todos os protocolos de segurança e minimizando qualquer risco de contágio dentro do estabelecimento.
Para enfrentar o novo cenário demandando pelo distanciamento social, o comércio de Campinas precisou se reinventar e uma das soluções apresentadas pela Acic para ajudar o setor a continuar a vender, mesmo com as portas fechadas, foi o drive-thru.
A Associação solicitou à Prefeitura de Campinas, logo no início da fase restritiva, em 2020, a criação de pontos estratégicos na região central para que os lojistas daquela área também pudessem oferecer esta forma de venda e entrega no carro, além do delivery. As vagas, num total de oito, foram disponibilizadas novamente neste ano, quando da decretação da nova Fase Vermelha do Plano São Paulo, e vigoraram até o dia 24 de março, data em que a Prefeitura de Campinas decretou novas medidas restritivas. As ações da Acic seguem à medida que o mercado demanda novas soluções para os empreendedores. Em março deste ano a entidade lançou uma plataforma de conteúdos para proporcionar aos associados uma ampla e variada gama de assuntos, voltados à gestão, tendências, qualificação, técnicas de venda, legislação e outros. Tudo de maneira rápida e prática. E, ainda para o primeiro semestre deste ano, a Acic terá também uma solução para o aprimoramento da logística de entregas.
HC- Quais mudanças comportamentais do consumidor já podem ser identificadas como tendências?
Camila Oliveira – A partir das mudanças comportamentais do consumidor e, consequentemente do comércio, as vendas on-line serão o canal mais explorado no mundo, assim como o delivery e os meios de pagamento sem atrito. Estas são tendências que permanecerão em 2021 e no pós-pandemia. Como já dito, a preocupação com os protocolos de higiene também deverão permanecer e caberá ao comércio garanti-los em todos os pontos de contato do cliente, desde o momento em que ele entra na loja, até o pagamento, entrega, embalagens etc. Esse será um fator decisivo para que o cliente compre ou não em uma loja física.