Quando leio sobre a cantora e apresentadora Karol Conká, participante com o maior índice de rejeição ( 99,17%) da história do BBB (Big Brother Brasil), versão 2021, passa pela minha mente a figura de uma pessoa que era o oposto dela, a doce Cora Coralina, com “C” , esta sim empoderada com suas poesias e compotas (sempre foi doceira de profissão). Será que a Karol já ouviu falar em Cora? Nessa fase em que tanto se discute o empoderamento feminino, é preciso citar as muitas mulheres que vieram antes de nós para fortalecer o verbo empoderar. Não havia celular, zap, net, não havia sequer uma caneta Bic quando essas senhoras respeitáveis foram conquistando espaços que encontramos lapidados.
Uma dessas empoderadas veio do Rio para Campinas ainda na infância: Júlia Valentina da Silveira Lopes (1862-1934). Uma das primeiras romancistas do Brasil, Júlia vivia com o dinheiro de suas obras e ajudou a criar a Academia Brasileira de Letras (ABL), mas teve seu nome rejeitado na hora de assumir uma cadeira na instituição pelo simples fato de ser mulher. Sabe quem ocupou a vaga? O marido dela, Filinto de Almeida.
Naquela época as mulheres ainda integravam o chamado “segundo sexo”. Vida feliz era sinônimo de casamento e filhos, nada mais. Outra empoderada que fez história com uma simples pena de escrever foi Nísia Floresta, que em 1832 publicou Direito das Mulheres e Injustiças dos Homens, primeira obra a abordar o direito feminino ao estudo e ao trabalho digno. Narcísia também exerceu a função de jornalista, da mesma forma que a professora e abolicionista Maria Amélia de Queirós, uma das fundadoras da Ave Libertas, associação composta só de mulheres, que lutava contra a escravidão e combatia castigos.
Voltando a falar de Cora Coralina, pseudônimo de Anna Lins dos Guimarães Peixoto Bretas (Cidade de Goiás, 20 de agosto de 1889 — Goiânia, 10 de abril de 1985), uma das mais importantes escritoras do país, teve seu primeiro livro publicado em junho de 1965 (Poemas dos Becos de Goiás e Estórias Mais), quando já estava com quase 76 anos de idade, apesar de escrever seus versos desde a adolescência. Era uma mulher simples que fazia doces para vender. “Nunca escreverei uma palavra para lamentar a vida. Meu verso é água corrente, é tronco, é fronde, é folha, é semente, é vida!”, escreveu. Sou grata a ela, da mesma forma que sou a Maria Firmina dos Reis – autora de Úrsula -, primeira romancista negra brasileira, nascida no Maranhão em 1822.
Outra mulher simples e de muito valor que a arrogante Karol Conká deveria conhecer é Carolina Maria de Jesus. “Quando eu não tinha nada o que comer, em vez de xingar eu escrevia. Tem pessoas que, quando estão nervosas, xingam ou pensam na morte como solução. Eu escrevia o meu diário”, dizia Carolina. Ela é autora de Quarto de Despejo – Diário de uma favelada, publicado em 1960.
Portanto, meninas, gratidão a elas e a tantas outras empoderadas que fizeram a diferença na luta por igualdade e dignidade. Imaginem quanto tempo demorou para que conquistássemos o direito de votar, usar anticoncepcionais e ocupar cargos importantes nas empresas. Hoje esbarramos em muitas influenciadoras digitais que encontram tudo pronto e só se preocupam com looks e makes, assim fica fácil.
Em meados dos anos 70, quando fui estagiar em uma redação de jornal pela primeira vez, eram raras as mulheres que cobriam Polícia e Esporte. Fui escrever primeiramente no caderno feminino e na editoria de Cultura, para depois conhecer Cidades, Saúde, Educação, Política e outras áreas consideradas masculinas. Hoje podemos falar de sexo, prazer, empoderamento, de tudo e mais um pouco.
Vamos conjugar juntas o verbo empoderar?
Janete Trevisani é jornalista