Após 40 anos de luta para conseguir a casa própria, Paulo Roberto Dias, o Bigode, está perto de morar no que é seu. A nova localidade tem luz, água encanada, pavimentação e construções de tijolos. O cenário é bem diferente da área degradada onde atualmente reside com a família em um barraco de madeira. Por outro lado, Bigode reconhece que se acomodar dentro de casa, no novo lar, junto com a mulher e a filha de 14 anos, será um desafio.
A família de Bigode mora na ocupação Nelson Mandela e é uma das beneficiadas pelo plano emergencial da Prefeitura para atender os grupos que residem na localidade e estão com uma ação de despejo.
No total, serão 116 “casas-embrião” para abrigar um pouco mais de 100 famílias. O tamanho das moradias é que virou alvo de polêmica. Os 15 metros quadrados se dividem em um cômodo e um banheiro. E no meio das discussões entre as autoridades sobre o assunto, estão os futuros moradores.
Vulneráveis e com trajetórias marcadas pela necessidade extrema, muitos veem o novo empreendimento como o início de uma nova oportunidade de vida. No entanto, há também quem considere a impossibilidade de colocar sua família dentro de 15 metros quadrados. “Aqui sou eu, minha mulher e três crianças. Fica difícil”, diz Alexandro dos Santos Oliveira, um dos beneficiados.
As condições atuais de moradia na ocupação Nelson Mandela do Dic 5 são bastante precárias. Observados do lado de fora, as paredes dos barracos de madeira parecem prestes a tombar. Na área externa, crianças brincam perto do esgoto, que corre a céu aberto. Em dias de chuva, o transtorno toma conta.
“Esticamos uma lona para não molhar muito aqui dentro”, diz Simeia, esposa de Bigode. Sobre a nova moradia, a mulher não chega a repetir o discurso do presidente Lula e chamar o prefeito de Campinas de desumano. No entanto, considera que poderia ser melhor. Em temos de espaço físico, seu barraco é maior do que a futura casa.
“A Prefeitura poderia pelo menos oferecer o material para a gente aumentar e construir uma cozinha”, propõe Simeia, que além da menina de 14 anos, que mora com ela e o marido, tem outros cinco filhos na ocupação, cada um com suas próprias famílias.
Todos estavam entre os ocupantes despejados em uma área do Jardim Capivari em 2017, quando a polícia usou de violência contra mulheres, crianças e idosos.
“Foi terrível. Tinha mais polícia do que moradores naquele dia”, conta Bigode, de 69 anos, que é aposentado e faz bico como vigia à noite a cerca de 1km dali, justamente na área de 23 mil metros quadrados onde o novo empreendimento será entregue daqui quatro meses.
Na parte detrás do barraco de Bigode mora uma família que precisará ampliar a futura moradia para viver. Pelo projeto da Prefeitura, as “casas-embrião” poderão ganhar novos cômodos dentro do espaço de 90 metros quadrados em que estão construídas. O problema para Alexandro, de 31 anos, que reside com outras quatro pessoas, é conseguir dinheiro para bancar a reforma. Ele trabalha fazendo bico. Para ter direito a morar na atual estrutura, cada família está pagando R$ 160 por mês. São 300 parcelas.
Entre os filhos de Alexandro está a pequena Helena, de 5 anos, que tem hidrocefalia, se locomove em uma cadeira de rodas e se alimenta por sonda. Um dos irmãos de Helena tem têm 1 ano e 4 meses, e o outro, 14 anos. A reportagem do Hora Campinas também se deparou com famílias de até seis pessoas que serão abrigadas no novo espaço.
Erivânio Alves da Purificação, por outro lado, não reclama. Enquanto abre uma vala na construção do novo residencial onde vai morar, o baiano de 34 anos agradece. Morador na ocupação Mandela, conseguiu o trabal
ho na obra depois de um acordo com o engenheiro responsável.
“Cada um tem seu ponto de vista, mas para quem não tem nada, isso aqui está ótimo”, diz. “Melhor que morar debaixo do pontilhão.” Ele conta que veio da cidade de Itapicuru (BA) e tem 22 irmãos “espalhados por esse mundo”. Sobre o tamanho da moradia onde irá residir, diz que a polêmica foi criada por quem reclama demais. Na futura casa, Erivânio vai morar só ao lado da companheira. Eles estão juntos há quatro anos.