Milhares de artigos de pesquisa, contribuindo com um vasto conjunto de conhecimento para a ciência são publicados todos os anos. No entanto, nosso papel na comunicação científica não se limita ao momento da publicação. Muitas editoras acadêmicas, conta com uma equipe de Ética em Publicações dedicada a abordar questões éticas e de integridade levantadas sobre o conteúdo e muitas das quais surgem após a publicação.
As editoras recebem uma ampla gama de consultas, que vão desde erros de relatórios corrigíveis até questões mais sérias, incluindo análise de dados, integridade de dados ou preocupações com relatórios, falhas no desenho de estudos, disputas de autoria e propriedade de dados, e questões altamente sensíveis envolvendo ética em pesquisa, ética em publicação e potencial má conduta. No total, são, em média, notificados sobre preocupações com ética ou integridade pós-publicação menos de 1% dos artigos de pesquisa publicados com poucas retratações (em torno de 0,13% dos artigos).
Todos os artigos de pesquisa científica são revisados por pares, mas a revisão por pares tem suas limitações. Um manuscrito é normalmente avaliado por duas a quatro pessoas durante a revisão por pares pré-publicação, enquanto após a publicação ele fica disponível para um público muito mais amplo, incluindo colaboradores, outros pesquisadores, aqueles que exploram ética e integridade na literatura de pesquisa e até mesmo a imprensa e o público em geral.
Como publicações de acesso aberto, os artigos são disponibilizados gratuitamente para todos lerem, e cada leitor vê o trabalho sob sua perspectiva única. Com muito mais olhos voltados para o conteúdo após a publicação, talvez não seja surpreendente que problemas possam vir à tona depois de terem passado despercebidos pela revisão por pares.
Além disso, alguns tipos de problemas (por exemplo, preocupações com a propriedade dos dados) não podem ser identificados apenas pelo conteúdo do artigo ou envolvem pessoas que normalmente não estariam envolvidas na revisão por pares. Não esperamos que esses tipos de preocupações sejam detectáveis antes da publicação. Embora as mídias sociais e os veículos de notícias frequentemente destaquem casos flagrantes e/ou aqueles envolvendo má conduta, muito do que a equipe de Ética em Publicações observa pode ter surgido devido a erros honestos.
É importante ressaltar que está além da competência do periódico ou da editora julgar com base na intenção ou culpa pessoal. Independentemente de quem foi o responsável, independentemente de os problemas terem surgido devido a erros honestos ou má conduta deliberada, e independentemente de quando os problemas são percebidos, os jornais científicos têm a responsabilidade de tomar as medidas necessárias para garantir a integridade e a confiabilidade de nossas publicações.
Cada caso de ética em publicações – mesmo para questões aparentemente simples – segue seu próprio caminho e envolve múltiplos colaboradores. Este é um trabalho muito exigente. Envolve um pouco de investigação, avaliação científica rigorosa e correspondência sensível com pesquisadores, instituições e leitores em todo o mundo. Também exige resiliência e tenacidade – e tempo.
Os editores de Ética em Publicações seguem as diretrizes do Comitê de Ética em Publicações (COPE) e são muito cuidadosos em respeitar todos os colaboradores, seguir o devido processo legal em cada caso e considerar cada decisão editorial. Os jornais frequentemente recebem perguntas sobre o motivo da demora para resolver problemas que foram apresentados ou que foram registrados no Pubpeer.
Muitos casos fazem parte do nosso backlog de casos de ética, que se desenvolveu antes de existirem uma equipe dedicada de Ética em Publicações. O tempo entre a notificação inicial e a resolução do caso também reflete a forma como o caso foi priorizado e o tempo necessário para que o jornal e colaboradores externos concluam as várias etapas do processo.
Assim, é importante que todos saibam da enorme responsabilidade que é julgar casos deste tipo. Não podemos sob qualquer pretexto causar um dano à história ou imagem de pesquisadores sem absoluta certeza do que realmente ocorreu.
Uma das coisas mais difíceis da vida é julgar e nos assuntos referentes à ética, mais difícil ainda. Importante é a absoluta honestidade no que se faz e a credibilidade da ciência depende visceralmente disto.
Carmino Antônio De Souza é professor titular da Unicamp. Foi secretário de saúde do estado de São Paulo na década de 1990 (1993-1994) e da cidade de Campinas entre 2013 e 2020. Secretário-executivo da secretaria extraordinária de ciência, pesquisa e desenvolvimento em saúde do governo do Estado de São Paulo em 2022, Presidente do Conselho de Curadores da Fundação Butantan, membro do Conselho Superior e vice-presidente da Fapesp, pesquisador responsável pelo CEPID CancerThera da Fapesp.











