A interdição de ao menos 16 leitos da Unidade de Terapia Intensiva (UTI) Neonatal da Maternidade de Campinas pela Prefeitura, em razão da falta de médicos, agrava um problema crônico na região, o da escassez de vagas pelo Sistema Único de Saúde (SUS) para recém-nascidos e prematuros que correm risco de vida. Atualmente 31 bebês estão na maternidade e 11 deles, informou a Prefeitura, deverão ser transferidos para o Hospital PUC-Campinas e o Caism da Unicamp. O problema é que as duas unidades não têm leitos livres e já lidavam com a sobrecarga mesmo quando os 39 leitos disponíveis na Maternidade estavam operação.
A interdição dos leitos ocorreu em 16 de fevereiro, e nesta quinta-feira (23) a medida foi publicada no Diário Oficial do município. Pela decisão, a Maternidade pode receber 20 bebês na UTI neonatal – apesar da capacidade para 36, o hospital chegava a atender até 40 recém-nascidos. O excedente precisa ser encaminhado a outros hospitais por meio da Central de Regulação do estado (Cross).
Seis dias antes do bloqueio, a Maternidade de Campinas informou à Prefeitura a respeito das mortes de dois bebês acometidos por diarreia. O laudo sobre a causa dos óbitos ainda não está pronto. A Maternidade informa que uma das mortes ocorreu em 6 de fevereiro e a outra, dia 9, e que desde então não houve mais registro de casos de diarreia.
Os óbitos não ocasionaram a interdição, porém, aceleraram o procedimento, segundo a diretora do Departamento de Vigilância em Saúde de Campinas (Devisa), Andréa von Zuben.
“O boqueio tem relação com a falta de profissionais médicos e de fisioterapeutas respiratórios, problema que já havia gerado vários autos de infração pela Vigilância. Como tomamos conhecimento do surto de gastroenterite, achamos ainda mais importante que houvesse a cobertura médica dos profissionais adequada ao número de bebês em atendimento”, confirma.
A Maternidade de Campinas realiza cerca de 750 partos por mês, dos quais 60% pelo SUS. Por meio de nota, informou que no momento da interdição, a Unidade estava trabalhando acima da capacidade e havia 39 pacientes internados na Unidade Neonatal. O hospital atribui a ausência de profissionais na equipe à escassez de oferta do mercado.
“A direção conta hoje em seu quadro clínico com pouco mais de 30 profissionais para uma escala de 240 plantões mensais. Também há a necessidade de mais quatro médicos com especialização em Neonatologia para plantões diários na escala de horizontalista”, informou. De acordo com a direção, além da indisponibilidade desses profissionais, existe o problema da complexidade do serviço, que tem a maior UTI Neonatal da Região Metropolitana de Campinas.
A Maternidade também se posicionou sobre as dos bebês: “Informamos que a situação de dimensionamento não impactou na ocorrência dos casos de diarreia enfrentado entre os dias 06 e 09/02/2023. Foram coletadas amostras e estamos aguardando resultados. Contudo, as providencias necessárias para a contenção da situação foram adotadas e não houve a ocorrência de nenhum outro caso desde o dia 09/02/2023”, traz a nota divulgada à imprensa.
Falta de vagas
O Devisa confirmou que nesta quinta-feira, 31 crianças continuam na UTI neonatal da Maternidade de Campinas, o que significa que 11 precisam ser transferidas por meio da Central de Regulação. O problema é que faltam vagas nos hospitais para onde esses bebês deveriam ser encaminhados, sobretudo porque eles atendem não só pacientes de Campinas, mas de toda a Região Metropolitana.
O Hospital PUC-Campinas comunicou que nesta quinta-feira (23) a UTI Neonatal disponibiliza 16 leitos conveniados com o SUS, mas está com 18 pacientes internados. Informou ainda que há quatro gestantes de alto risco na enfermaria SUS e uma no centro obstétrico e que não há vagas para demanda espontânea na região.
O Caism da Unicamp também atende atualmente mais do que sua capacidade. O hospital disponibiliza 14 leitos de UTI, mas possui 23 recém-nascidos internados.
Depoimento
Confira o depoimento do presidente da Maternidade de Campinas, Marcos Miele, sobre a escassez de profissionais e a transferência de recém-nascidos da UTI neonatal.