Desde sempre fui filha única. Passei a vida ouvindo dos meus parentes o quanto eu era uma boa filha. Comportada, obediente, quieta, tranquila. Minha mãe dizia com orgulho que adorava que eu fosse assim.
Mas, com o tempo, percebi que talvez aquela filha perfeita que todos enxergavam não fosse realmente eu. Eu me encaixava nesse papel porque parecia o certo, porque ser o orgulho da minha mãe sempre foi uma espécie de obrigação silenciosa.
Por dentro, porém, sempre havia um nó. Um sentimento meio estranho de não saber quem eu era quando ninguém estava olhando, quando não tinha as expectativas de todos ao meu redor.
Eu tentava esconder minhas dúvidas, afogar o que sentia.
Só que, no fundo, tudo o que eu queria era poder ser simplesmente eu, sem precisar ser perfeita, sem medo de decepcionar. Mas como ser eu, se nem eu sabia direito quem era?
As pessoas costumam dizer que filhos únicos são sortudos. “Você é tão sortuda!”, dizem, como se a solidão fosse um prêmio. É verdade que não precisei dividir brinquedos, roupas ou atenção, mas… a que preço? Crescer sozinha é aprender cedo demais que o silêncio pode doer, e que dá sim para sentir falta daquilo que nunca teve.
Meus pais são separados, e desde pequena aprendi a me mover entre duas vidas, duas casas, duas rotinas, dois mundos diferentes. E em todos eles, a única que continuava comigo era eu mesma. Era minha própria companhia, minha própria amiga.
Sempre digo que gosto de ficar sozinha, mas a verdade é que isso nunca foi uma escolha, foi um hábito que aprendi sem querer. Falar sozinha, brincar sozinha, resolver sozinha aquilo que doía demais para compartilhar.
Em cada aniversário, quando as velas se apagavam, meu pedido era o mesmo. Quando via uma estrela cadente, um dente de leão, um trevo de quatro folhas… sempre o mesmo desejo: um irmão. Alguém com quem dividir o mundo, brigar, rir e crescer.
Dizem que o karma de quem é filho único é perceber, um dia, que ser sozinho já não é mais tão proveitoso assim. E eu percebi. Teria sido lindo ter alguém para dividir os silêncios e até as brigas bobas.
Mas, recentemente, algo aconteceu. Minha mãe vai ter um bebê, uma irmã que eu pedi por tantos anos finalmente está vindo. A vida, de alguma forma, ouviu aquele pedido que eu fiz mil vezes em silêncio.

E mesmo assim… algo dentro de mim ainda treme. Eu deveria estar apenas feliz e estou. Mas há também um medo escondido.
Medo de não saber ser irmã, de não estar pronta, de falhar.
Medo de não ser o exemplo que esperam de mim.
Medo de perceberem que não sou mais a mesma.
Medo de ser tarde demais para ser a irmã que sempre quis ser.
Talvez essa insegurança venha do fato de que por tanto tempo aprendi a viver sozinha, e agora preciso reaprender a viver acompanhada. E talvez isso seja bonito também.
Talvez crescer seja justamente isso: aprender a dividir o que antes era só nosso, o espaço, o silêncio, o amor e, principalmente, quem a gente é.

Luciana Agatha Melo Guimarães, 14 anos, nasceu em Belém do Pará e hoje vive em Campinas. Estudante do 9º ano e monitora da Academia Educar, gosta de transformar sentimentos em palavras. Sonha em cursar jornalismo, porque acredita que toda boa história pode tocar o mundo de alguém.











