A morte precoce do cantor Renato Russo, uma das figuras mais importantes e influentes da história do rock brasileiro, completa 25 anos nesta segunda-feira (11). Célebre vocalista da banda Legião Urbana, Renato deixou órfãos milhares de fãs no dia 11 de outubro de 1996, vítima de complicações da AIDS, aos 36 anos, no Rio de Janeiro.
Formada em Brasília, em 1982, a Legião Urbana despontou no cenário nacional em 1985, com o excepcional disco homônimo que contém as canções “Será”, “Ainda É Cedo” e “Geração Coca-Cola”. Em 1986, a banda lançou o cultuado álbum “Dois”, com os sucessos “Eduardo e Mônica” e “Tempo Perdido”. Logo depois, vieram os aclamados “Que País É Este”, em 1987, e “As Quatro Estações”, em 1989, que é o LP mais vendido da banda.
Ao longo do tempo, em meio a centenas de shows realizados ao redor do Brasil, a Legião Urbana se apresentou duas vezes em Campinas.
Na primeira passagem por Campinas, em 1986, o grupo tocou diante de cerca de cinco mil pessoas no então recém-inaugurado Ginásio da Unicamp. O espetáculo recebeu o nome de “Feliz Legião”, pois foi realizado em conjunto com a famosa peça de teatro “Feliz Ano Velho”, inspirada no livro de mesmo nome do escritor Marcelo Rubens Paiva.
Quatro anos depois, no auge da popularidade, a Legião Urbana se apresentou no estádio Brinco de Ouro para um público de mais de 10 mil espectadores. Este foi um dos maiores shows de rock que já ocorreram em Campinas. A performance aconteceu no dia 11 de outubro de 1990, exatamente seis anos antes da morte de Renato Russo.
Apesar do fim da Legião Urbana, a obra de Renato Russo permaneceu viva e vibrante graças ao tributo da banda Urbanoides, de Campinas, que coincidentemente já existia com esse nome desde o fim da década de 80, mas sem nenhuma relação direta com a banda de Brasília.
“Naquela época, procurávamos um nome que se identificasse com o som que a gente fazia, então um colega que frequentava os ensaios sugeriu que remetesse a um som bem urbano”, revela o guitarrista Ricardo Alvarez. “Tocamos em quase todos os lugares de Campinas e região. Éramos a banda mais proeminente da parca cena campineira da época”, aponta o músico.
“Quem viveu a noite no fim dos anos 90 até meados dos 2000, conheceu, ouviu ou assistiu aos Urbanoides, que foram sem dúvida a banda campineira com maior projeção até hoje”, atesta Ricardo Alvarez.
“Em 1997, após a morte de Renato Russo, os Urbanoides tornaram-se a primeira banda cover da Legião Urbana. Esse pioneirismo abriu muitas portas, pois passamos a ter muito destaque na mídia e fomos abraçados pelos fã-clubes de São Paulo. Daí em diante, passamos a fazer turnês por todo o Brasil, dividindo palco com artistas consagrados”, conta Alvarez.
“Participamos de um evento para cerca de 15 mil pessoas, em homenagem a Renato Russo, no Espaço Anchieta, em São Paulo, junto a diversos artistas e com a presença dos pais do Renato”, orgulha-se Ricardo Alvarez.
Os Urbanoides estavam destinados a carregar o legado da Legião Urbana e levá-lo até mesmo a terras estrangeiras onde a banda original jamais havia tocado. “Em 2003, gravamos um CD autoral com produção do Eduardo Araújo, da Jovem Guarda, e fizemos duas mini turnês pelos Estados Unidos. Fomos a banda campineira com mais projeção até hoje. Os Urbanoides terminaram oficialmente em 2008 e depois passei a tocar com a banda cover Faroeste Caboclo”, acrescenta.
Confira abaixo depoimento exclusivo do guitarrista Ricardo Alvarez, da banda cover Faroeste Caboclo, para o Hora Campinas:
Conheci a Legião Urbana no início dos anos 80, por meio de uma notinha em um jornal de música que dizia sobre uma iniciante banda de Brasília que tinha tido uma música gravada pelos então já conhecidos Paralamas do Sucesso. Algum tempo depois, assisti a uma apresentação da banda em São Paulo, quando ainda atuava como um trio: Renato Russo no vocal e baixo, Dado Villa-Lobos na guitarra e Marcelo Bonfá na bateria.
Lembro-me de ter percebido, apesar do som muito ruim, que ali havia alguma coisa diferente. Eu acompanhava e me interessava pelo rock brasileiro desde meados dos anos 70. À exceção de Raul Seixas e Rita Lee, os textos até então eram muito inocentes em sua grande maioria, voltados ao humor e trivialidades. Quando do primeiro disco da Legião, agora como um quarteto, com a incorporação do Renato Rocha no baixo, aquela sensação se concretizou. Era uma banda brasileira que se pautava em temas que angustiavam aquela geração de jovens, com muita sobriedade, letras inteligentes, profundas, cheias de inquietação e que se conectava a uma música de um frescor vanguardista naquele momento.
A cada novo disco, era nítido que a Legião, sob a liderança de Renato Russo, caminhava para ser a mais importante e influente banda daquela geração. Quando saiu o disco “As Quatro Estações”, ficou claro que o Renato já era sem dúvida o porta-voz da juventude daquela década, que até então era vista como alienada e colorida. Com a morte de Renato, em 11 de outubro de 1996, ficou um grande vácuo. Era o fim de uma era, que se consolida de vez com a morte de Cazuza, em 1990.
Em todas as bandas que toquei a partir de 1985, sempre havia músicas da Legião no repertório e muitos diziam que nosso vocalista, Renato Nascimento, era muito parecido com Renato Russo, tanto fisicamente como no jeito de cantar. Então, após a morte do Renato Russo, resolvemos fazer um show em homenagem ao nosso ídolo. Lembro que, na época, nenhuma casa queria receber uma banda que fosse tocar a noite toda músicas de um único artista, então nos deram uma quarta-feira, o dia de menor movimento. Para surpresa do contratante, mas não nossa, foi um grande sucesso. Na semana seguinte, estávamos na sexta-feira, sábado… Não fomos a primeira banda cover temática, acho que a primeira foi do U2, mas com certeza fomos a primeira Legião.
Por muitos anos, levamos o show Legião Cover por todo o Brasil. Nosso diferencial sempre foi o fato de sermos, antes de tudo, fãs de primeira hora. Nesse período, tivemos a oportunidade de tocar com Dado Villa Lobos, Marcelo Bonfá e Renato Rocha. Infelizmente, nunca pude conversar com Renato Russo. Estivemos com seus pais e sua irmã, mas faltou aquele que a meu ver deu maioridade à geração rock dos anos 80.
Há alguns anos, voltamos, Renato Nascimento e eu, agora com a banda Faroeste Caboclo. Para nossa surpresa, existia uma novíssima geração ávida por Legião e Renato Russo, muitos na faixa dos 16 e 17 anos, se identificando e mergulhando naquele universo que Renato Russo tão bem descrevia.
Antes de começar este depoimento, coloquei na “vitrola” o disco “Que país é este 1978/1987”. Rolou “Angra dos Reis”, “Química”, “Eu Sei”, “Conexão Amazônica”, “Mais do Mesmo”, “Faroeste Caboclo”, “Que país é este”… Temas tão atuais que parecem ter sido escritos propositalmente para estes estranhos dias que vivemos. Confesso que fiquei apavorado…