Fraco, magro e com problema de coordenação na mão esquerda. Apesar do perfil não ajudar, se tornar jogador de basquete era a meta daquele garoto nascido em Santa Rita do Sapucaí, no sul de Minas Gerais. Nos “rachas” nas quadras da Lagoa do Taquaral ou até mesmo nos treinos no Tênis Clube, sob o comando do técnico Mario Cecconi, sua limitação técnica era latente. No entanto, o mineiro criado em Campinas desafiou os obstáculos em nome de um sonho e conseguiu virar o jogo.
Hoje, com 44 anos, Felipe Ribeiro olha para trás e vê uma história de superação para deixar aos mais novos. Passou pelos principais times de basquete do Brasil, chegou à seleção brasileira, conquistou títulos e marcas importantes dentro e fora do país e é o único jogador da NBB, a Liga Nacional de Basquete, a ter a camisa aposentada.
Fora das quadras, ainda carrega vários sonhos. Um deles é o de criar um time de basquete masculino profissional na cidade onde deu os primeiros passos na modalidade. “Gosto de dizer que aprendi a jogar nas quadras do Taquaral. Ali foi minha casa.”
Felipe hoje se divide entre Campinas e Fortaleza, duas cidades emblemáticas em sua vida. Da primeira, não esconde mágoa, embora também carregue por ela um sentimento de nostalgia, afinal, é onde a sua paixão pelo basquete aflorou e seus pais moram. Da segunda, só leva gratidão, como não podia deixar de ser, pois na capital cearense jogou os últimos anos da carreira e se tornou ídolo.
De Campinas a Fortaleza uma trajetória marcada por frustações, apertos, superações e vitórias delineou uma história de vida inspiradora e aventureira. Depois de não encontrar espaço para jogar na cidade em que foi criado, Felipe decidiu “se lançar no mundo” quando fez 18 anos.
“Meu primeiro contrato foi com o time do Olaria, do Rio de Janeiro, ganhando R$ 150 por mês e morando embaixo da arquibancada junto com os garotos da base do futebol”, lembra.
Dispensado, voltou para Campinas, onde trabalhou numa empresa de telefonia celular e começou a fazer faculdade na Unip (Universidade Paulista).
“Mas não queria desistir do basquete e surgiu uma oportunidade de jogar na Paraíba. Fui para lá e depois joguei no Sport Clube Recife. Em Pernambuco, morava nos dormitórios do clube, junto com os funcionários.”
Com 22 anos, voltou para Campinas novamente. “Não tinha conseguido jogar em nenhum clube profissional e estava pronto para entrar no mercado de trabalho”, lembra, sem saber que sua história de sucesso no universo do basquete ainda estava para começar e da forma como ele não planejara.
Treinando no Espéria pelo time da Unip apenas para conseguir uma bolsa de estudo, Felipe se surpreendeu ao ser chamado pelo clube paulistano para disputar um campeonato.
“Eles precisavam de um jogador urgente, pois um que eles estavam esperando teve um imprevisto e não pôde se transferir para São Paulo”, conta o mineiro, que não desperdiçou a oportunidade. “Fui considerado a revelação do Campeonato Paulista. Foi a porta de entrada para a minha carreira deslanchar.”
Ao lembrar dessa trajetória, o ex-ala/pivô conta que nunca pensou em desistir do seu sonho, nem nos piores momentos. “Eu sabia que tinha muitas limitações e que não estava preparado. Mas havia uma força muito grande dentro de mim e tinha a convicção de que Deus estava me moldando”, relata o ex-atleta.
Disputado pelos principais clubes do país após se destacar pelo Espéria no Paulista, Felipe construiu uma carreira vitoriosa. E depois de passar por Bauru, Ribeirão Preto, Rio Claro, Franca, Paulistano, seleção brasileira e levantar títulos regionais, estaduais, nacionais e internacionais, o jogador aceitou o desafio de participar do projeto do primeiro time do Nordeste na NBB, em 2012. No Fortaleza Basquete Cearense deixou sua marca.
“Minha intenção era jogar por dois anos lá, mas acabei ficando. Foram dez anos”, conta ele, que se tornou o maior jogador do clube.
No ano passado, Felipe encerrou a carreira no UBS Foligno, da Itália, e, ao retornar ao Brasil, foi surpreendido com uma homenagem. No intervalo de uma partida do Fortaleza com o Flamengo no CFO (Centro de Formação Olímpica, onde o time da capital cearense manda seus jogos), ele foi chamado à quadra para uma cerimônia simbólica.
Pela primeira vez na NBB um jogador teve sua camisa aposentada. O número 33 da equipe cearense não poderá mais ser usado por nenhum atleta.
“Me senti extremamente honrado. Foi algo emocionante”, descreve Felipe, que entra para um seleto grupo: na história do basquete brasileiro apenas ele, Hélio Rubens, no Franca, e Wlamir Marques, no Corinthians, tiveram suas camisas aposentadas.
Atualmente, Felipe desenvolve muitas atividades. Tem uma escola de basquete em Fortaleza, onde também mantém uma escola de futebol filiada à La Liga, da Espanha. Já escreveu quatro livros infantis e criou o aplicativo basketfy, que indica onde há quadras de basquete para jogar.
Envolvido com vários projetos sociais, se define como um aventureiro.
“Quero levar o basquete para os lugares mais distantes”, afirma. Sobre Campinas, diz que já tem projeto para a formação de uma equipe profissional na cidade. “Estamos trabalhando para conseguir levantar patrocinadores e apoiadores. Temos colaboradores, mas falta encontrar um incentivo maior, seja do poder público ou de alguma empresa.”