O Natal está chegando e Madson vai ganhar algumas peças de roupas. Os brinquedos ficaram para trás e muitas limitações também. O garoto do interior da Bahia que mal tinha o que comer, mora em Vinhedo, completou 13 anos no último dia 10 e já é um adolescente, aluno em duas escolas de futebol, do sexto ano do ensino fundamental e de uma escola de reforço.
Quem conta tudo isso com orgulho é sua madrinha de adoção, que irá presenteá-lo com as roupas, mas que já o cobre de amor desde um encontro marcado pelo inexplicável.
Há quatro anos, durante uma atividade religiosa em um Centro Espírita de Vinhedo, a professora Ivete Maria Fischer Bezerra perguntou para Madson Ferreira Santos, então com 9 anos, o que estava escrito no conteúdo.
“Ele não soube ler”, lembra Ivete, hoje com 71 anos. “Então, perguntei quantos anos ele tinha e em que ano da escola estava. Ele respondeu que tinha 9 e estava no terceiro. Me inteirei da sua história e decidi alfabetizá-lo de forma particular. Acho que foi um chamado”. Começava ali um envolvimento que transformaria não só a vida de Madson, mas também a de sua família.
Todo sábado de manhã, aquela professora do ensino primário e também formada em psicologia ia até o cortiço em Vinhedo onde Madson morava com a mãe e o irmão mais velho para ensiná-lo a ler e escrever.
A determinação dele chamou a atenção da voluntária. “Uma das suas primeiras declarações para mim foi: ‘vou ser jogador de futebol profissional’. E era algo que ele repetia sempre. Ele não sabia nem ler e nem escrever, mas tinha a certeza do que queria ser.”
Um dos momentos mais chocantes para Ivete em suas visitas ao aluno foi saber por meio da mãe dele sobre a forma como as escolas na cidade de Boninal-BA, de onde a família veio, procediam ao final de cada ano. “A professora perguntava para os pais se eles queriam que passassem o aluno”, conta a professora, abismada. “É inacreditável.”
Além do analfabetismo, outro problema detectado pela professora em Madson foi a baixa autoestima. “Ele se achava muito ‘burro’, mas foi algo que consegui trabalhar”, conta a psicóloga. Os encontros seguiram até 2021 e neste ano Madson já consegue exercer um desempenho de acordo com sua idade, embora tenha um distúrbio de atenção. “Quando criança, ele foi detectado com TDAH (Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade) e é algo que precisará ser tratado”, diz Ivete.
Com relação ao futebol, a grande paixão do adolescente, a prática em Vinhedo começou em um campinho próximo ao local em que morava. Depois, com a ajuda de voluntários, entrou na Escola R9, do Ronaldo Fenômeno, de Vinhedo mesmo, como “bolsista”. E ele também pratica o esporte nas escolinhas da Prefeitura.
“A assistente social Sandra Poliati do Centro Paulo de Tarso teve um importante papel nesse desenvolvimento dele”, credita Ivete, lembrando também que a mãe de Madson hoje trabalha e que a família deixou o cortiço para morar de aluguel em uma casa no bairro Capela.
Ivete fala do carinho que sente por Madson, mas não se define como um anjo na vida do garoto. “Um anjo não, somente uma pessoa, talvez sensível, que percebeu o problema e resolveu fazer o que podia.”