Apaixonado por futebol desde a infância, Fernando Martinez escolheu o caminho contrário de diversos torcedores espalhados pelo Brasil. Ao invés de acompanhar de perto clubes que disputam a elite do futebol nacional, o jornalista decidiu desbravar o universo de diferentes equipes do Interior em divisões inferiores. Ao todo, em 45 anos de vida, já assistiu 3.250 partidas e conheceu 203 estádios somente no estado de São Paulo, entre 160 e 170 cidades.
“Desde quando eu era moleque, meu pai gostava muito de futebol e meu avô também gostava bastante. Meu pai era corintiano, mas não via só jogos do Corinthians, assistia tudo que tinha na TV. Nos anos 1980, passava a Segunda Divisão aos sábado à tarde na TV Cultura, então eu comecei a assistir com ele e achava muito legal os vários times do Interior. Eles faziam matérias, mostravam as cidades, falavam sobre o campeonato, contavam a história do time e eu adorava aquilo”, destaca Fernando
“Não demorou para eu começar a comprar o jornal Gazeta Esportiva, a revista Placar e curtir isso. Apesar de ser corintiano fanático na época, sempre gostei desses times menores e acompanhei com afinco no sentido de ver as tabelas de jogos, saber quem era campeão e também colecionava escudos. Eu adorava quando vinham escudos diferentes de times do interior”, relembra o jornalista, que também é pesquisador e um dos co-autores do livro “125 anos de história – A Enciclopédia do Futebol Paulista”.
Nascido na década de 70, Fernando começou a ir aos estádios no final da década de 80 e início de 90, mas não se animou tanto no início por conta da violência que já acontecia nas arquibancadas naquela época. Em 1996, o torcedor começou a acompanhar jogos de equipes do Interior e desde então a paixão só aumentou, inclusive esse foi o incentivo para criar o blog “Jogos Perdidos”, com o objetivo de contar histórias de partidas de equipes espalhadas pelo interior.
“Eu ia bastante no estádio nos anos 80 e 90, mas era uma época mais complicada de ver jogo porque tinha muita violência. Por volta de 1996, comecei a ver alguns jogos menores. Eu estudei no interior, em Bauru, e a gente tinha mais acesso porque as notícias que você tinha na cidade falava só de Noroeste (equipe local), Marília, XV de Jaú e eu estava sempre consumindo essas informações”, pontua.
“Eu não consegui terminar a faculdade e quando voltei para a Capital, uma das minhas terapias era ir em estádio. Isso foi em 1999 e daí pra frente, aumentei bastante a frequência de ir ao estádio. Depois, comecei o Jogos Perdidos com um grupo de amigos que a gente se conheceu nos estádios. Em 2004, eu já tinha um blog, uma banda, já colocava fotos de jogos no blog e comecei o Jogos Perdidos. Fizemos para consumo interno, mas no primeiro mês já tinham vários comentários e foi crescendo”, explica Fernando.
“Já fui em exatamente 3.250 jogos. É bastante, eu gosto muito e com o Jogos Perdidos dá para dar vida aos jogos, mostrar o estádio, camisas, contar histórias, mostrar como está o público e perpetuar a história desses times menores. No estado de São Paulo, eu já vi jogo em 203 estádios e conheci entre 160 e 170 cidades”, garante.
Entre tantas andanças pelo interior de São Paulo, Fernando guarda com carinho momentos que viveu em partidas decisivas de equipes de cidades pequenas. Ele também relembra os estádios mais charmosos que já conheceu, um inclusive em Santa Bárbara D’Oeste, e destaca que o mais importante são os momentos vividos antes e depois das partidas.
“Esses dias eu estava contando a história de quando fui ver o acesso do Guaçuano, em 2009 (em Mogi Guaçu). Eles subiram em um jogo com o Votuporanguense e foi sensacional. O estádio estava lotado, era um feriado, acho que 7 de setembro ou 15 de novembro, foi maravilhoso. De jogo pequeno, já fui em uma sexta-feira no estádio Santa Cruz, em Ribeirão Preto, ver Olé Brasil e Jaboticabal. Fiz um bate e volta, negócio muito doido. Tem muito jogo que a gente vai e vale muito pela história. O jogo é legal, mas o jogo é plano de fundo. O grande lance é tudo que acontece antes e depois da partida”, valoriza.
“Em relação aos estádios, eu gosto muito do que tem em Santa Bárbara D’Oeste (Estádio Antonio Lins Ribeiro Guimarães). Eu acho aquele estádio genial. Antigo, mas muito legal. Gosto muito do estádio da Francana (Estádio Municipal Doutor Lancha Filho) e o do Marília (Estádio Municipal Bento de Abreu). O de Marília eu não conhecia e fui na Copinha do ano passado. A torcida fica pertinho do campo, é alçapão e é muito legal”, completa o torcedor.
Mesmo acompanhando mais de 3 mil partidas de forma presencial, Fernando conta que ainda não conhece estádios de algumas regiões do estado de São Paulo, como o noroeste e o oeste paulista. Ele conta que havia planejado ir até cidades dessas regiões no início do ano passado, em uma viagem de cinco finais de semanas, mas a pandemia da Covid-19 atrapalhou os planos.
“No ano passado, eu e mais três amigos fizemos um planejamento de cinco finais de semana para viajar e conhecer todos os estádios da Segunda Divisão que eu ainda não conhecia. Iria para Araçatuba, Birigui, Tanabi, José Bonifácio, São José do Rio Preto, Votuporanga, mas aí veio a pandemia e quebrou a nossa ideia. Foi muito triste. Esse pedaço e também a região de Presidente Prudente eu nunca fui e conheceria ano passado. Em breve eu consigo ir. É uma região que eu nunca fui e morro de vontade de ir. Um dia rola”, projeta o torcedor.
Carinho especial pelo Mogiana
Apesar de ter nascido em São Paulo e viver atualmente na Capital, Fernando viveu momentos inesquecíveis em Campinas quando teve a oportunidade de conhecer o estádio Doutor Horácio Antônio da Costa, mais conhecido por Estádio Cerecamp, ou Campo do Mogiana, no bairro Botafogo. O jornalista foi ao estádio pela primeira vez em 2004, um mês antes do lançamento do blog Jogos Perdidos. Encantado pelo lugar, voltou mais de 20 vezes até 2010, quando acompanhou o último jogo no centro esportivo que foi desativado em 2011 por conta da estrutura antiga e precária.
“Nos primeiros anos de Jogos Perdidos, nós fizemos várias coberturas no estádio do Mogiana e sempre foi muito legal. Fui lá pela primeira vez um mês antes do blog nascer para assistir a partida entre Campinas e Assisense. Foi uma das primeiras vezes que o Campinas jogou lá. Fiz questão de ir porque era um estádio histórico e queria assistir um jogo ali o mais rápido possível, já que poderia não ter mais partidas no estádio”, ressalta Fernando, em entrevista à página Nos Trilhos da Memória.
“Felizmente assisti jogos lá de 2004 até 2010 e o estádio foi utilizado pela última vez na Copa São Paulo de 2011. Várias vezes viajava de São Paulo para Campinas de ônibus, descia na rodoviária antiga de Campinas e ia a pé. Era muito legal, um dos campos mais sensacionais do interior. O estádio era legal pela sua construção e também pela construção que tinha no fundo, da quadra de basquete e as casas que tinham ali. Era muito legal”, relembra entusiasmado.
Entre setembro de 2006 e agosto de 2007, Fernando trabalhou na Rede TV! em um programa que acompanhava partidas no interior de São Paulo. Em uma das gravações, o jornalista lembra ter vindo a Campinas cobrir a final da Segunda Divisão do Campeonato Paulista Sub-20, entre Campinas Futebol Clube e Lemense, no estádio do Mogiana. Ele relembra com carinho essa partida que o time campineiro saiu como campeão e lamenta o fato de o centro esportivo estar interditado há 10 anos.
“Lembro que neste dia não falamos só do jogo, mas também contamos toda a história do Mogiana, assim como já havíamos feito em 2005 no Jogos Perdidos. Tenho muitas saudades de assistir jogos no Cerecamp. Foram mais de 20 coberturas, quase 30 coberturas por lá. Também vi o acesso do Campinas para a Série A3 em 2008. É um estádio sensacional, infelizmente não é utilizado mais, e eu tenho fé que um dia ele será utilizado por alguém”, espera Fernando.
“O Red Bull tinha um projeto sensacional para revitalizar o local, sem mudar as características e utilizando todas as instalações, mas infelizmente por alguns problemas com o Governo do Estado eles não conseguiram e o resultado é esse atualmente. O estádio está lá abandonado, sem ninguém para utilizar, e é uma grande pena”, lamenta o pesquisador.