Empresas de base tecnológica têm enfrentado grandes desafios nos últimos anos em função da escassez de mão de obra. Isso é sabido. Porém, além do inflacionamento, às vezes surreal das despesas com a contratação de desenvolvedores, do altíssimo turnover e da selvageria entre empresas por alguns recursos considerados “chave”, uma outra dimensão desse problema vem causando grande impacto na produtividade nacional.
Uma pesquisa realizada pela Associação Brasileira das Empresas de Tecnologia da Informação (Brasscom) projeta que, se o País continuar formando os 53 mil profissionais de TI que formou em 2021, enfrentará um déficit de cerca superior a 700 mil vagas até 2025.
A ampla gama de fascinantes novos modelos de negócios em diversos segmentos, agora com o sobrenome tech, traz, em si, um grande desafio sobre quem tirará as disruptivas ideias da apresentação institucional e as transformará em um sistema confiável e com usabilidade aceitável.
Para além disso, empresas tradicionais sentem, a cada dia, que necessitam oferecer aos seus clientes experiências cada vez mais digitais e, mais para além ainda, com a pandemia do Covid-19, empresas que se quer tinham a digitalização no seu roteiro de crescimento de curto prazo, tiveram que começar a se movimentar neste sentido, e o mercado de mão de obra especializada não estava preparado para tudo isso.
Regido pelo postulado econômico da oferta e da procura, empresas que querem contratar e reter profissionais de TI tiverem que “subir a régua” salarial, criar ambientes de trabalho que “emulem” a felicidade, flexibilizar os modelos de contratação e, acima de tudo, aceitar que o turnover é inevitável.
Ocorre que, toda vez que parte de uma equipe de desenvolvimento é substituída durante a execução de um projeto (e eles raramente se encerram!), os novos contratados para tocar o barco, chegam “zerados” em termos de requisitos, entendimento das regras de negócio, experiências nas interações com os usuários, entre outros atributos indispensáveis para se promover uma boa execução.
Mas o drama para esses projetos não acaba aí: as arquiteturas dos softwares em formação ou existentes não são observadas devidamente pelos novos entrantes ao time de projeto e, a cada troca significativa de membros dos squads, uma nova filosofia tende a ser implementada.
As consequências desses fatos não têm efeitos apenas de curto prazo como se pode esperar de problemas típicos de rotatividade do trabalhador. Os sistemas estão sendo construídos ou evoluídos à base de improvisos e remendos, com linhas de códigos desconectados de suas arquiteturas funcionais.
A reação em cadeia originada por esses espasmos de desenvolvimentos contingenciais para sanar problemas de curtíssimo prazo, é que, no segundo momento a essas soluções, outras interações e funcionalidades dependentes começam a apresentar anomalias, e o sistema, ou funcionalidades, passam a apresentar problemas, e assim sucessivamente.
A ineficiência gerada por essa sequência de eventos e retrabalhos faz com que, de modo geral, os sistemas não funcionem em sua plenitude.
O senso comum costuma relacionar o chamado Custo Brasil a fundamentos de infraestrutura que retiram valor e eficiência da força produtiva, gerando desperdícios e inviabilizando o desenvolvimento. Neste momento, contudo, estamos diante de uma atualização do conceito: as infraestruturas de software estão deixando escapar eficiência, estão demandando grande volume de retrabalhos e, mais uma vez, cada consumidor brasileiro tem que arcar com o ônus da ineficiência produtiva, agora no âmbito digital.
Eis a digitalização do Custo Brasil.
Ao mesmo tempo que se constata a evolução desse câncer para a nossa economia, vemos, do outro lado, uma massa de pessoas desempregadas ou com rendas baixíssimas e carentes de oportunidade. Apenas a educação será capaz de fazer a ponte entre esses dois extremos. Simultaneamente ao avanço deste grande mal, não há como negar: há uma excelente oportunidade aqui.
Empresas internacionais, pagando em dólar, têm levado uma parte da já escassa mão-de-obra nacional de TI, como consequência da nova era do trabalho remoto. Isso pode e deve agravar ainda mais essa já sensível situação. Todavia, tal fato indica que as possibilidades que se abrem para o País ao se formar bons profissionais em ramos diversos da Tecnologia da Informação, transcendem as fronteiras verde-amarelas e, com um tanto de gana, articulação e boa vontade, podem ajudar a virar o jogo de muitas famílias, e porque não, da economia por aqui.
Finalmente é bom lembrar: não há plano econômico ou subsídios que salvem um país improdutivo.
Sem produção eficaz e geração de riquezas, a conta pela ineficiência sempre será paga pelo cidadão, principalmente em forma de impostos e de inflação (o mais cruel de todos). Estamos diante de mais um enorme problema, e oportunidade igualmente grande. Há que se educar para crescer.
Elber Laranja é sócio-fundador da Antecipa Fácil. É formado em administração de empresas e pós graduado em gerenciamento de projetos pela Fundação Getúlio Vargas