Em relação à matéria “É nós por nós…” que saiu no último domingo (13) na Folha de São Paulo, sobre o caso da cidadã Débora, bolsonarista moradora de Paulínia (cidade vizinha de Campinas ), causou-me perplexidade os comentários machistas de assinantes da Folha, supostamente de esquerda.
Débora se uniu a outros fanáticos que não aceitaram a vitória de Lula na última eleição para Presidente, quando invadiram o Palácio do Planalto, a Praça dos Três Poderes, o Congresso Nacional, o Senado Federal, o Supremo Tribunal Federal e promoveram devastadora depredação.
Ela foi condenada a 14 anos de prisão, e esteve dois anos presa, passando agora à prisão domiciliar. A jovem senhora é casada, adventista, tem dois filhos e é cabeleireira. Seu delito ficou conhecido por pichar a estátua da Justiça com batom.
Na matéria da Folha, o tribunal da Internet composto sobretudo por homens a condenou por abandonar marido e filhos em casa para se unir aos raivosos manifestantes de direita no 8/1/2023, a “dormir com estranhos” em acampamento, porque “saiu de casa sozinha e viajou para outro Estado”.
Débora está sendo duplamente condenada: pelos crimes que feriram a Constituição e pelos delitos morais, ou seja, não deveria ter saído de casa naquele dia, já que tem marido e filhos.
Ora, seus filhos não foram abandonados por mãe desnaturada, como dizem, pois eles ficaram sob os cuidados do pai dedicado. Ela não deveria ser julgada e criticada pelos atos morais, mas sim pelos crimes que cometeu sob bandeira política e ideológica.
Os “comentaristas” não deveriam julgá-la pela liberdade de se manifestar. Desde quando uma mulher casada e com filhos não pode se deslocar até Brasília para participar de uma manifestação política, sob qualquer espectro ideológico?
O patriarcado machista não pode fomentar julgamento e alimentar comentários que condenem a cabeleireira bolsonarista de Paulínia pela sua ação política, numa tentativa de desmoralizá-la por macular seu sagrado papel de mãe e esposa, que não deveria deixar o lar nem deixar de servir em passividade e submissão. Esse julgamento parece ser cristão e conservador demais. Quantos homens são julgados por deixarem os filhos em casa para ocuparem o espaço público? Quantos homens são julgados por nem assumirem os filhos, que ficam sem registro paterno na identidade?
Débora, a bolsonarista de Paulínia deve ser sentenciada pelos crimes políticos que envolveram um golpe de Estado em Brasília na última eleição para presidente.
Mas Débora, esposa, mãe, cabeleireira, mulher livre não deve ser afrontada por se manifestar politicamente (dentro dos limites legais), não deve ser julgada pelo seu direito de ir e vir, cujas ações não faz dela uma mãe negligente.
Não é no papel de mãe que Débora cometeu delitos. Tal justificativa conservadora e moralista não deveria ser apropriada por internautas simpatizantes da esquerda para destruir socialmente uma mulher que errou pela ação política, e não pelo lugar da maternidade, como se esse fosse o único lugar legítimo a ser ocupado por uma mulher brasileira.
Eliana Nunes da Silva, pedagoga, é doutora em Educação pela Unicamp











