Tive o privilégio de jogar contra Isabel, nos bons tempos de Guarani, e depois, como jornalista esportiva, de também acompanhar sua carreira. Fui testemunha do que Isabel e sua geração fizeram pelo vôlei brasileiro. Ao lado de Vera Mossa e da levantadora Jaqueline, Isabel alçou o esporte a um nível nunca visto antes e transformou a vida de milhares de pessoas que, no rastro de suas conquistas, fizeram do vôlei um meio de vida e uma paixão do brasileiro.
A longevidade de um ídolo é construída à base de fatores como talento, carisma, atitudes e ações. Isabel reuniu todos os predicados e outros mais.
Ergueu a bola da ascensão do vôlei de quadra e depois foi buscar nas areias mais um cenário para o Brasil brilhar. Nunca escondeu suas convicções, remexeu temas espinhosos e jamais deixou de opinar. Polemizou, porque assim são os ícones – eles abrem caminho.
O início da profissionalização do vôlei brasileiro teve a marca de mulheres fortes, determinadas e destemidas. Ainda um novato no cenário mundial, o Brasil quase não investia no esporte. Os treinadores e dirigentes tateavam sobre os melhores treinamentos e táticas de jogo. Todos os atletas que se sobressaíram naquela década de 1980 o fizeram porque tinham talento e quase nenhum empurrão que mais tarde a ciência do esporte daria.
Isabel brilhou como jogadora e como mãe. Se manteve em quadra durante quatro gestações, uma delas em que exibia a barriga já de seis meses.
A situação, incomum para a época, polemizou. E daí? Esse era o jeito de Isabel confirmar que ser mãe e ao mesmo tempo jogadora de vôlei era possível. Expressar opiniões nunca foi problema para ela.
A primeira geração do vôlei feminino brasileiro reconhecida mundialmente não se consagrou só dentro das quadras. As jogadoras agiram fora delas para que outras atletas dessem continuidade à missão que delegaram a si mesmas: fazer do vôlei um esporte nacional. Missão dada, missão cumprida, mas não encerrada. Isabel prosseguiu atuante e sempre referência aos próximos atos que seriam realizados pelo vôlei brasileiro.
Quando o vôlei de praia ainda era um ilustre desconhecido, lá estava a atacante apresentando aos brasileiros o potencial da modalidade.
Se uma questão polêmica envolvia o vôlei, Isabel se apresentava para defender o que acreditava. Racismo, preconceito, política. Todos temas que tiveram a contribuição do pioneirismo de Isabel, conhecedora da responsabilidade social que carregava por ser referência.
Na última segunda-feira, Isabel foi indicada para participar do grupo de esporte do governo de transição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Não deu tempo de nos presentear com suas propostas e ideias que, com certeza, seriam vanguardistas, solidárias, orientadas para a maioria.
A geração anos 80 do vôlei brasileiro agradece por ter tido Isabel como guia. E o vôlei mundial também. Um ídolo eternizado pelo talento, como também pela postura e exemplo de que convicções existem para serem defendidas. Foi uma vida breve para um legado que continua a se perpetuar.
Laine Turati, ex-jogadora profissional de vôlei, é jornalista e editora de Conteúdo do Hora Campinas