Esperança não é crença, mas concretude. A fé acredita, esperança é experiência. E ela não necessita de que mares se abram para existir. E não existe esperança vã. Ou ela é consequente ou não é esperança. Ela não se encontra no futuro, mas no presente. E, igual a Deus, ela é “Eu Sou”.
Enquanto fé se constrói, esperança está impregnada em nós desde que quando estávamos sendo tecidos no ventre da madre. Sem ela, a vida seria insuportável, seríamos como vida sem alma, corpo sem espírito. Se o alimento físico sustenta o corpo, a esperança provê o espírito.
O porvir só existe na esperança, assim como o viver somente se estabelece aonde ela está presente. Aonde ela se ausenta, a vida perece, se desconecta, desintegra-se, desvanece, torna-se vazia, despida de sentido, estado onde habitam dor, sofrimento, indiferença e palidez. Observe como são pálidos os olhos do desesperançado: o brilho inexiste, a mirada está mergulhada no tormento, não há cores, apenas sombras.
No rosto de quem cultiva a esperança, o brilho transparece, a alegria pulsa nos poros da pele e a cabeça se mantem erguida mesmo quando, eventualmente, alquebrado.
A aparência move o corpo quando nos contemplamos com olhos humanos. Vem de dentro o mal, não do que entra pela boca. “Feche os olhos para enxergar” a sua essência e a da (o) outra (o) e desvende o mundo que nascerá. “Abra os olhos para enxergar o que antes eles não queriam ver” e descortine um universo de possibilidades.
Contudo, não tente se enganar colocando os pés em dois barcos ao mesmo tempo. As ilusões são vaidade, se vão e se perdem, enquanto a esperança permanece e não se cansa e nos faz caminhar em brasa como quem possui asas nos pés e transforma obstáculos em aprendizados.
Ensina-nos, Senhor, a contar os dias, a esperar em Ti, a vislumbrar o véu que separa o espírito da matéria. Ensina-nos a ver. Ver é como viver sem sentir. Sentimentos, sim, são vãos, porque humanos. Nosso espírito alimenta-se do sopro da vida que está no Senhor.
Sopro concedido por Deus quando criou a mulher e o homem segundo à imagem e semelhança Dele. O espírito da mulher e do homem eram sem forma, escuro e vazio. E Deus se intrigou a meditar sobre a estranha criação.
Recolheu-se por três noites e três dias e, ao final do terceiro dia detectou o erro: percebeu que havia criado mulher e homem sem esperanças. E disse Deus: “Haja esperança”! E houve esperança.
João Nunes é jornalista, crítico de cinema e colunista do Hora Campinas