O ambiente em que as crianças crescem hoje é hostil ao desenvolvimento humano, como aponta o psicólogo social americano Jonathan Haidt. O ponto principal de seu novo livro, A Geração Ansiosa, é que o uso de smartphones entre crianças e adolescentes está prejudicando suas habilidades sociais, alfabetização, saúde mental e capacidade de foco.
Muitos jovens estão sendo corroídos pelas telinhas e, como a maior parte do entretenimento instantâneo que os adolescentes consomem é produzido por outros adolescentes, eles ficam frequentemente isolados da soma total da sabedoria humana, da influência dos mais velhos e das ideias sobre como viver uma boa vida com significado e propósito. Isto é, cada vez mais crianças estão sujeitas a um mero entretenimento superficial gerando satisfação momentânea e ansiedades a longo prazo.
Depois de 35 anos trabalhando com adolescentes, pela Fundação Educar, posso afirmar que algo fundamental está mudando na infância e adolescência. Mesmo assim, não devemos aceitar esse quadro perigoso como causa perdida.
Mas se subestimamos as consequências desse experimento social recente, que é a inclusão de smartphones no dia a dia, podemos estar errando muito em não tomar a dianteira e lutar para que este quadro não seja perene.
Ao que tudo indica, a geração atual acabará crescendo, formando relacionamentos e tendo filhos, com uma formação de vida incompleta. Ao mesmo tempo, o número de jovens que busca maneiras de prolongar a adolescência, optando pela independência sem responsabilidade, só está crescendo.
Diante desse cenário, a pergunta que não quer calar é: o que devemos fazer?
Muitos pais podem se preocupar com o tempo interminável gasto por seus filhos na tela, talvez tentar banir de vez o acesso dos pequenos ao mundo digital. O verdadeiro desafio é encontrar um equilíbrio entre o tempo de tela e as atividades saudáveis, o problema é como fazer essa escolha.
Tendo em vista nossa própria condescendência com o nosso uso desses aparelhos, muitas vezes justificado outras não, somos forcados a adesão acrítica das crianças ao entretenimento de qualquer espécie. O desafio é enorme e exige muito mais de todos nós, dos mais velhos e dos mais jovens.
Nosso empenho em definir limites de tempo de tela no ambiente digital de hoje e oferecer estratégias práticas para estruturar rotinas com atividades de tela e não tela é o maior desafio que a humanidade enfrenta, no sentido que ele definirá os rumos das gerações futuras.
A única forma de educar de maneira profunda e duradoura é que os pais e avós deem bons exemplos a todo instante.
Quando chegamos em casa, devemos largar nossos dispositivos digitais e nos concentrar neles, nas crianças e jovens, realmente olhar para eles, ouvi-los, ficar em silêncio com eles, e nunca nos distrairmos com os nossos telefones, afinal seremos nós também a perder, não só esses momentos, mas nossas próprias habilidades cognitivas e sociais.
Ter um filho e cuidar dele, exige que você possa realmente apreciá-lo. Então, de certa forma, precisamos valorizar ainda mais esse tempo com eles sem qualquer coisa que nos roube a atenção.
Navegar pelo tempo de tela na vida das crianças e quais preocupações sobre o impacto delas em sua saúde mental, defendendo uma abordagem sutil que considere a prontidão e a compreensão individuais é o que tenho aprendido nestes 20 anos, não sempre só sobre smartphones, e também é a visão de muitos grupos de estudos de Harvard.
Acredito que temos sempre a chance, e a obrigação, de construir uma geração melhor que a nossa. Resta aprender o que fazer.
Luis Norberto Pascoal é empresário e presidente da Fundação Educar