Com o avanço da pandemia do novo coronavírus e a manutenção das aulas em ambiente virtual, pais, professores e escolas precisam estar atentos para evitar o cyberbullying. Humilhações, perseguições e intimidações que acontecem de forma presencial podem migrar para o ambiente digital, com efeitos devastadores nas vítimas. Rico em conteúdo e em oportunidades de entretenimento, a internet oferece as suas armadilhas por conta do comportamento nocivo de adultos, jovens e também crianças.
Segundo Luciene Tognetta, professora doutora do Departamento de Psicologia da Educação da Unesp Araraquara e líder do Grupo de Estudos e Pesquisas em Educação Moral (Gepem), da Unesp e da Unicamp, há uma grande possibilidade de as pessoas que viviam o bullying presencial, hoje, passarem por situações de cyberbullying. “Existe na literatura, nas pesquisas, uma correspondência em ser alvo de bullying e continuar sendo alvo de bullying na vida virtual. Ser autor de bullying na vida real e, potencialmente, ser muito mais autor de cyberbullying ou de outros tipos de cyber agressão na vida virtual, em que a sensação de impunidade, de anonimato e a falta da representação da pessoa na frente, de vê-la, de ver os seus gestos, de ver os seus sentimentos, de saber como ela se sente, torna então a capacidade empática do sujeito diminuída”, explica.
De acordo com a profissional do Gepem, no mundo virtual existem muitas cyber agressões, que incluem o cyberbullying. “O cyberbullying é um tipo específico de cyber agressão que acontece entre pares. Porém, existem essas mesmas agressões, como zoar, caçoar, intimidar, ameaçar, postar nudes, provocar, cancelar. São todas cyber agressões, que podem ser feitas também por pessoas desconhecidas, que muitas vezes não fazem parte do convívio deste grupo social, da comunidade que o sujeito pertence, portanto, não são cyberbullying, mas são cyber agressões”, explica Luciene.
Luciene recomenda atenção aos sinais de sofrimento. “Quando a criança não quer mais ir pra escola, quando o adolescente se nega a ter contato com amigos, não quer frequentar festas, chora por qualquer motivo sente dores de cabeça, de barriga, frequentes, começa a ter explosões de raiva, se distancia das pessoas, são os sinais de que alguma coisa na relação entre pares não vai bem”, elenca.
A pesquisadora reforça que os efeitos da prática nas vítimas são robustos. “A pressão social é grande e ela se sente diminuída diante de seus pares e se sente incompetente, incapaz de se defender. Com vergonha de passar por aquela situação e não tem força suficiente para brecar os avanços dessa violência. Sua vida se torna um caos, ela pode desenvolver várias doenças psicossomáticas, como ansiedade, automutilação, pensamentos suicidas porque ela não vê outra saída senão se proteger dessa forma” explica.
Ela reforça que a escola era o único agente capaz de encaminhar os problemas de relacionamento, de aprendizagem de valores, de agressão doméstica, de como lidar com essas questões virtuais, que estão acontecendo agora. “Se não temos a escola presencialmente, não temos muitos meninos e meninas que têm acesso direto aos seus educadores”, aponta.
Os alvos
De acordo com Luciene, bullying é um tipo de violência, física ou psicológica. O agressor escolhe um alvo frágil para passar por situações constrangedoras. Então ele bate, xinga, inventa mentiras, rouba, sempre na presença de um público, sempre com alguém que saiba daquele tipo de menosprezo ao qual o outro foi submetido. “É uma ação violenta que tem um autor com a intenção de ferir, que se repete por várias vezes. Tem uma vítima frágil, que se vê com pouco valor e que não consegue se defender dos menosprezos, e é um tipo de violência característica da relação entre pares, ou seja, entre aluno e aluno, professor e professor, entre pai e mãe, nunca entre pai e filho ou professor e aluno. É na mesma hierarquia de poderes”, define.
Segundo ela, é um tipo de violência caracterizada pelo alto grau de crueldade. “Não é mais frequente do que outros problemas que acontecem na escola, porém, a crueldade do bullying é maior do que os problemas de indisciplina, palavrões, ou de incivilidades ou transgressões às regras”, finaliza.