Nesta época de pandemia global que afetou praticamente todos os setores da economia e exigiu mudanças no estilo de vida de todas as pessoas, de diferentes camadas sociais, o negacionismo, o corte de verbas e baixo investimento em pesquisas e inovação cobraram um preço alto. Mais do que nunca ficou evidenciado o papel fundamental da ciência para o enfrentamento de intempéries e para a soberania nacional. Campinas é um polo de excelência tecnológica e científica, com reconhecimento nacional e internacional, e tem assumido papel de protagonismo no enfrentamento da Covid-19.
Os médicos, cientistas, pesquisadores e afins precisam ter o seu valor reconhecido pela sociedade e pelos governos, ainda mais no Município que tem alta vocação para o desenvolvimento tecnológico e científico, com várias instituições dedicadas a esses temas.
Em Campinas aconteceram e ainda acontecem diversas pesquisas ligadas ao vírus da Sars-CoV-2 e testes de vacina contra a doença, por exemplo. O Hospital PUC-Campinas participou dos testes da vacina da Janssen em voluntários. Já a Unicamp esteve envolvida nas pesquisas clínicas da Coronavac, do Instituto Butantan, em parceria com a farmacêutica chinesa Sinovac.
Desde o início da pandemia, a Unicamp criou uma força-tarefa para atuar nas seguintes frentes:
Frente Diagnóstico, para padronizar protocolos, produzir controles e auxiliar a implantação de teste nos laboratórios de patologia clínica do Hospital das Clínicas da Unicamp e outros laboratórios de diagnóstico em Campinas.
Frente de Pesquisa e Desenvolvimento: composta por um grupo de pesquisadores trabalhando no desenvolvimento e implementação de testes que possibilitem diagnóstico em larga escala para estas unidades de saúde.
Frente de Pesquisa Básica, para utilizar toda a capacidade de pesquisa e inovação instalada na Unicamp para buscarem descobertas científicas que nos coloquem mais próximos da compreensão da ação do vírus, do desenvolvimento da doença e da ação de fármacos com potencial de reverter o quadro da infecção.
Frente de Divulgação, para levar, em tempo real, os progressos científicos da Força tarefa à comunidade, como atuar junto à sociedade no fornecimento de informações confiáveis sobre a pandemia.
Frente de Captação de Recursos, que visa garantir a sustentabilidade da Força Tarefa e auxiliar na estruturação da capacidade do Hospital das Clínicas da Unicamp e outros laboratórios de diagnóstico em Campinas em lidar com esta pandemia.
Frente de Articulação, para conversas com representantes de instituições, sociedades e políticos para o engajamento conjunto frente a esta iniciativa.
Frente de Ensaios Clínicos, liderado por pesquisadores da Faculdade de Ciências Médicas, para coordenação dos ensaios clínicos voltados a Covid-19 na Unicamp.
Frente de Modelagem Epidemiológica, para atuar na construção de modelos para a previsão de possíveis cenários e análise de dados epidemiológicos que auxiliem na compreensão dos impactos da Covid-19 em nossa sociedade.
Pesquisas
Muitas pesquisas foram desenvolvidas na Unicamp ou em parceria com ela acerca da doença, como um método que permite visualizar o material genético do novo coronavírus dentro de células; o estudo de vigilância genômica, focada na dispersão do vírus no Brasil, sequenciamento genético; entre muitos outros, como um teste nacional para diagnosticar a doença.
Contudo, mesmo com os esforços voltados para o combate à pandemia, as pesquisas nas demais áreas continuaram, como a que investiga o papel do gene ERP29 no desenvolvimento do câncer de cabeça e pescoço.
Marcelo Knobel, ex-reitor que esteve à frente da Unicamp durante o primeiro ano da pandemia, destaca o papel da ciência nesse momento. “Sem dúvida, mais do que nunca hoje fica evidenciado o papel da ciência, tecnologia e inovação para o nosso futuro. Sem isso e sem educação de qualidade não temos condições de sermos um país soberano e de desenvolver produtos e serviços fundamentais para a nossa sobrevivência”, afirma.
“A Unicamp é fundamental na formação de pessoal, de empresas de base tecnológica. Tem papel preponderante e é importante para o País. Preocupa ver as verbas e os incentivos à ciência diminuindo”, avalia Marcelo Knobel, ex-reitor da Unicamp.
Ele destaca a necessidade de investimento. “O resultado não acontece de uma hora para outra. Só aparece se tiver investimento em infraestrutura ao longo dos anos e RH (recursos humanos) formado ao longo dos anos. Agora há um desmonte muito grande, falta de recursos para bolsas, equipamentos e pesquisas. Esse é um momento crítico que a sociedade deve reconhecer o valor da ciência e incentivar o financiamento”, destaca.
Ainda segundo Knobel, Campinas é muito importante nesse cenário. “Campinas tem papel fundamental, é a região do conhecimento, baseada no conhecimento, desde o início do século 20, com o Instituto Agronômico (IAC), a Pontifícia Universidade Católica (PUC), a Unicamp, Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM)/Sirius, outras universidades e institutos de pesquisa. Campinas sempre teve essa vocação para a ciência e tecnologia e só foi ampliando. É um ecossistema que foi montado”, avalia o ex-reitor.
Mas a gente precisa atuar como cientista e cidadão. Mostrar cada vez mais, de forma contundente, a importância da ciência e educação para o desenvolvimento”, afirma Marcelo Knobel.
Knobel acredita no futuro do Município e do Brasil. “Tenho a esperança de que a situação melhore com a mudança política que se desenha na próxima eleição. Mas a gente precisa atuar como cientista e cidadão. Mostrar cada vez mais, de forma contundente, a importância da ciência e educação para o desenvolvimento. Atuar na comunicação para esclarecer a população para que as tomadas de decisões sejam conscientes. É preciso investir em educação pública de qualidade. Nosso papel como educadores, pesquisadores e cientistas é promover o engajamento da sociedade nessas questões e isso independe de governo ou do que venha a acontecer. É preciso respeitar a ciência”, alerta.