O Centro de Pesquisa e Análise Operacional (Coar), empresa de consultoria com sede em Chipre, acredita que em 2020 as autoridades de outros países apreenderam drogas sírias no valor de negociação de US$ 3,4 bilhões. Uma cifra que supera o valor do principal produto de exportação legal da Síria, o azeite: 122 milhões de dólares por ano. A droga está financiando o governo central, de acordo com Ian Larson, que recentemente escreveu um relatório sobre o assunto para o Coar. Também contribui com as ações do grupo jihadista Estado Islâmico.
O captagon já se tornou a droga mais utilizada no Golfo Pérsico. Também conhecida por capitão, pertence à família das anfetaminas. O governo de Damasco se financia com o uso de comprimidos entre os jovens. Para o presidente sírio, Bashar al Assad, essa droga se tornou uma dádiva, pelo menos no curto prazo. Seu país se tornou o principal fornecedor mundial de capitães.
Enquanto a economia oficial entra em colapso sob o peso da guerra, das sanções e do manejo predatório dos Assads, essa droga se tornou a principal commodity de exportação do país e fonte de divisas.
A Síria há muito está envolvida na produção de drogas. Na década de 1990, quando controlava o Líbano, o Vale do Beqa era a principal fonte de haxixe da região. Mas a produção em massa de drogas só começou após a eclosão da guerra civil em 2011. O estado forneceu aos seus soldados “coragem de capitão”, como era chamado o capitão. Combatentes xiitas do Afeganistão e do Líbano que vieram apoiar o regime sírio contribuíram com seus conhecimentos sobre a produção e o tráfico de drogas.
O Hezbollah, principal milícia xiita libanesa, e que forneceu apoio fundamental ao regime de Assad, adquiriu grandes extensões de terra na fronteira, na Síria, nas montanhas Qalamoun. Estendeu as safras de haxixe e desenvolveu um novo negócio de artesanato, produzindo pílulas de captagon. A Síria começou a exportá-los por volta de 2013, quando sua economia formal secou.
As fábricas de produtos químicos nas cidades de Aleppo e Homs foram convertidas para a produção de comprimidos. No Golfo Pérsico, a margem de lucro desse produto pode ser cinquenta vezes maior do que o custo de produção na Síria. Os traficantes escondem-no em rolos de papel, pisos de parquete e até romãs. Os príncipes sauditas usam aviões privados para importar as mercadorias.
Em 2020, a polícia italiana descobriu 84 milhões de comprimidos, no valor de mais de um bilhão de euros, em um único navio. Na época, a operação foi considerada o maior confisco de anfetaminas já realizado no mundo. Em maio, as autoridades da Malásia, alertadas por uma denúncia saudita, apreenderam 95 milhões de comprimidos. Benghazi, na Líbia, é considerado um porto importante, conectado por uma rota marítima regular com a Síria.
Os Assads insistem que não estão envolvidos. “Propaganda”, diz Shadi al Ahmad, um economista fiel ao regime que mora em Damasco, a capital do país. Diz-se que uma grande parte do comércio é controlada pela Quarta Divisão do Exército, comandada por Maher al Assad, o irmão mais novo do presidente. Outros amigos do regime administram operações nos portos mediterrâneos de Latakia e Tartus. Um traficante de drogas libanês, próximo ao Hezbollah e procurado pela Interpol, se gabava no Facebook de seus laços com os líderes de Assads e do Hezbollah.
É possível que o regime veja o capitão como uma ferramenta nas lutas de poder regionais e que use “as drogas como arma contra os países do Golfo”, diz o jornalista e pesquisador Malik al Abdeh, próximo à oposição síria. “A mensagem é: normalize os relacionamentos, ou destruiremos sua juventude.”